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Mais movimento, precisa-se!

O Proibicionismo, ideologia opressiva do sistema.
A "guerra às drogas" contribuiu para criar um mercado negro global de tamanho macroeconómico que movimenta mais de 300 mil milhões de dólares anuais, segundo a UNODC. Nos países onde esta guerra foi mais violenta, apareceram máfias altamente organizadas e armadas, que matam milhares de inocentes por ano e puseram em causa e corromperam as instituições democráticas, como acontece hoje no México. Ele impede, desde logo, a criação de uma cultura dos limites, porque clandestiniza os consumos, censura a informação, esconde o problema, responde com a repressão.
Hoje em dia é cada vez mais claro na opinião jovem que os argumentos da proibição não fazem sentido e que a descriminalização é um mal menor hipócrita que também faz as suas vítimas. No caso português, o paradigma da descriminalização castiga os consumidores fazendo-os pagar uma multa ou encaminhando para o tratamento involuntário. Cria ainda a confusão entre traficantes e consumidores prevendo penas de prisão, principalmente para auto-cultivadores.
Avanços e recuos
No panorama mundial, os EUA, país pioneiro na implementação de políticas proibicionistas, têm hoje em dia provavelmente o movimento pró-legalização mais activo do planeta. Em 2010, 35% dos americanos vivem em Estados onde o consumo foi descriminalizado e 27% em Estados onde os médicos podem receitar marijuana medicinal. É um avanço importantíssimo do país de onde partiu a proibição mas também de onde surgiram os maiores movimentos sociais pela legalização.
Na Holanda, cujo caso é muitas vezes usado como prova de que a legalização traz benefícios, o estatuto especial da legalização sofreu ataques conservadores perigosos mas até hoje o bom senso prevaleceu.
Já a situação em Portugal, por exemplo no que se refere à cannabis, é extremamente hipócrita: o consumo foi descriminalizado em 2001, mas a perseguição policial aos consumidores mantém-se, e o risco de se ser tomado por traficante é muito grande, já que a quantidade pela qual se pode ser acusado de tráfico é mínima. Ou seja, consumir não é crime, mas comprar e vender ou simplesmente cultivar já o é, o que gera um enorme paradoxo. Todos conhecemos casos de jovens consumidores conscientes vítimas de certas brigadas policiais que, legitimadas pelo "combate à droga", actuam com violência, à margem da lei e normalmente de forma discriminatória: são os mais pobres e os jovens dos bairros quem mais frequentemente é interpelado e leva uns encontrões à custa da ganza que traz no bolso. É hoje o pretexto para grande parte do abuso policial que há em Portugal.
O papel da Marcha Global e a construção do movimento social
Em 2006, um grupo de jovens conscientes do paradoxo criado pela descriminalização do consumo decidiu juntar-se e discutir a criação da primeira Marcha Global da Marijuana (MGM) em Portugal. Inspirados por um movimento que, naquele ano, juntava perto de 200 cidades em todo o mundo, sabiam que não estavam sozinhos e avançaram sem medos.
A MGM de 2006 em Lisboa, com cerca de 200 pessoas, foi o embrião do movimento pela legalização em Portugal. No ano seguinte juntou-se o Porto, na altura com um núcleo bastante alargado de cidadãos portuenses e não só.
Entretanto juntaram-se Coimbra, Braga, com activistas que estiveram presentes nas Marchas do Porto e de Lisboa dos anos anteriores e que decidiram levar a luta para as suas cidades, mobilizando colegas de faculdade e de trabalho, artistas, desempregados, pessoas indignadas com a hipocrisia da lei.
Em 2011 juntou-se Leiria com uma Marcha bastante significativa e entusiasmante, contando com cerca de 200 pessoas, numa das cidades mais conservadoras no nível eleitoral. Uma mão cheia de activistas organizou reuniões ao longo de várias semanas para preparar aquela que seria a mais recente mobilização popular pela legalização da canábis.
O Futuro
O desafio actual das Marchas prende-se essencialmente com duas questões. A primeira é a solidificação da intervenção sobre a questão das drogas e da canábis em particular, criando estruturas relativamente mais formais de discussão e actuação permanente na sociedade. É urgente um movimento social forte que questione o quadro actual e que faça propostas concretas e fundamentadas no sentido da legalização da canábis.
A segunda é sobre o modelo das MGM e está relacionada com a primeira. Queremos continuar a organizar manifestações descentralizadas uma vez por ano ou queremos outro tipo de intervenção, outro tipo de protesto? A importância de envolver a comunidade científica na discussão do tema, conjuntamente com cidadãos conscientes da hipocrisia da descriminalização é, provavelmente, o factor fundamental para fazer crescer e solidificar o movimento.
Como em todas as causas, esta deve juntar todos e todas que se identifiquem com esta luta. Sejam de partidos de direita, de esquerda ou cidadãos indignados, o nosso desafio é construir um movimento crítico que fure o conformismo que se criou à volta da descriminalização. Porque ela é injusta, porque ela é insuficiente, porque a guerra as drogas continua e não funciona.
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