Wikileaks: Sócrates aprovou em segredo os "voos da CIA"

16 de dezembro 2010 - 3:21

Telegrama do embaixador dos EUA, citado pelo El País, afirma que o primeiro-ministro e o MNE autorizaram a utilização das Lajes para a repatriação de presos de Guantánamo. Bloco de Esquerda pede novas explicações.

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Luís Amado garantiu que nunca houve um pedido concreto dos EUA para a utilização do espaço aéreo português. Telegrama desmente-o

Telegramas enviados pela embaixada dos EUA em Lisboa entre 2006 e 2009, revelados pela Wikileaks através do El País, afirmam que José Sócrates e Luís Amado terão dado "luz verde" à utilização da Base da Lajes pelos voos de repatriação de presos de Guantánamo. Num dos documentos, assinado pelo embaixador americano em Lisboa Alfred Hoffman, pode ler-se que "Sócrates aceitou permitir a repatriação caso a caso de combatentes inimigos desde Guantánamo através da base aérea das Lajes".

No documento, enviado dez dias antes de uma reunião entre o então presidente Bush e o primeiro-ministro português, também se afirma que se tratou de "uma decisão difícil", "devido às críticas constantes dos média portugueses e dos elementos esquerdistas do seu próprio partido à actuação do governo na controvérsia dos voos da CIA".

O embaixador dos Estados Unidos também refere a actuação da eurodeputada socialista Ana Gomes. Numa nota de Janeiro de 2007, relata uma reunião na embaixada com os deputados José Lello e Paulo Pisco, do PS. “Lello expressou uma clara aversão a Gomes, embora tenha dito que o PS não pensava em expulsá-la porque seria contraproducente para o partido”, escreve Alfred Hoffman.

O diplomata sublinha que Lello assegurou que os principais líderes do PS, incluindo o primeiro-ministro, “são claramente pró-americanos”, e minimizou a ala esquerda do partido, que qualificou de “alegristas”, numa referência a Manuel Alegre.

Bloco questiona o primeiro-ministro

Para o Bloco de Esquerda, os telegramas divulgados agora esclarecem definitivamente “a falsidade das declarações prestadas pelo primeiro-ministro José Sócrates ao parlamento no dia 30 de Novembro de 2008”.

Nesse dia, recorda o deputado Jorge Costa, que assina a pergunta enviada ainda na noite desta quarta ao governo, afirmava o primeiro-ministro: "Consultei todos os membros do governo com responsabilidades neste domínio e devo dizer que o Governo português nunca foi consultado sobre essa possibilidade nem nunca autorizou. Posso responder-lhe em nome deste Governo que nunca aconteceu termos sido consultados e termos autorizado. Estes dois actos nunca existiram! E digo mais: no Ministério dos Negócios Estrangeiros, não há registo algum que nos dê ideia de que tal tivesse acontecido no passado".

Além de confirmar a existência de uma decisão governamental autorizando os voos por espaço aéreo português, o telegrama inclui ainda dados novos, diz o Bloco, recordando que Luís Amado garantiu que nunca houve um pedido concreto das autoridades norte-americanas para a utilização do espaço aéreo português. “Ora, na notícia do El Pais é citado Jorge Roza de Oliveira, assessor diplomático do primeiro-ministro José Sócrates até 31 de Outubro de 2010, como tendo assumido em reunião com o embaixador norte-americano que alguns voos da CIA sobrevoaram Portugal, o que 'constitui o primeiro reconhecimento que nos fez até agora um funcionário do Governo português'”.

Para o deputado Jorge Costa, “estas informações colocam em causa as garantias apresentadas pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros no Parlamento e exigem novos esclarecimentos sobre esta matéria.”