Telegramas enviados pela embaixada dos EUA em Lisboa entre 2006 e 2009, revelados pela Wikileaks através do El País, afirmam que José Sócrates e Luís Amado terão dado "luz verde" à utilização da Base da Lajes pelos voos de repatriação de presos de Guantánamo. Num dos documentos, assinado pelo embaixador americano em Lisboa Alfred Hoffman, pode ler-se que "Sócrates aceitou permitir a repatriação caso a caso de combatentes inimigos desde Guantánamo através da base aérea das Lajes".
No documento, enviado dez dias antes de uma reunião entre o então presidente Bush e o primeiro-ministro português, também se afirma que se tratou de "uma decisão difícil", "devido às críticas constantes dos média portugueses e dos elementos esquerdistas do seu próprio partido à actuação do governo na controvérsia dos voos da CIA".
O embaixador dos Estados Unidos também refere a actuação da eurodeputada socialista Ana Gomes. Numa nota de Janeiro de 2007, relata uma reunião na embaixada com os deputados José Lello e Paulo Pisco, do PS. “Lello expressou uma clara aversão a Gomes, embora tenha dito que o PS não pensava em expulsá-la porque seria contraproducente para o partido”, escreve Alfred Hoffman.
O diplomata sublinha que Lello assegurou que os principais líderes do PS, incluindo o primeiro-ministro, “são claramente pró-americanos”, e minimizou a ala esquerda do partido, que qualificou de “alegristas”, numa referência a Manuel Alegre.
Bloco questiona o primeiro-ministro
Para o Bloco de Esquerda, os telegramas divulgados agora esclarecem definitivamente “a falsidade das declarações prestadas pelo primeiro-ministro José Sócrates ao parlamento no dia 30 de Novembro de 2008”.
Nesse dia, recorda o deputado Jorge Costa, que assina a pergunta enviada ainda na noite desta quarta ao governo, afirmava o primeiro-ministro: "Consultei todos os membros do governo com responsabilidades neste domínio e devo dizer que o Governo português nunca foi consultado sobre essa possibilidade nem nunca autorizou. Posso responder-lhe em nome deste Governo que nunca aconteceu termos sido consultados e termos autorizado. Estes dois actos nunca existiram! E digo mais: no Ministério dos Negócios Estrangeiros, não há registo algum que nos dê ideia de que tal tivesse acontecido no passado".
Além de confirmar a existência de uma decisão governamental autorizando os voos por espaço aéreo português, o telegrama inclui ainda dados novos, diz o Bloco, recordando que Luís Amado garantiu que nunca houve um pedido concreto das autoridades norte-americanas para a utilização do espaço aéreo português. “Ora, na notícia do El Pais é citado Jorge Roza de Oliveira, assessor diplomático do primeiro-ministro José Sócrates até 31 de Outubro de 2010, como tendo assumido em reunião com o embaixador norte-americano que alguns voos da CIA sobrevoaram Portugal, o que 'constitui o primeiro reconhecimento que nos fez até agora um funcionário do Governo português'”.
Para o deputado Jorge Costa, “estas informações colocam em causa as garantias apresentadas pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros no Parlamento e exigem novos esclarecimentos sobre esta matéria.”