Este sábado, centenas de pessoas de vários movimentos sociais manifestaram-se no recinto da Cimeira do Clima da ONU no Dubai. Apesar de todas as limitações, a causa palestiniana juntou-se mesmo à exigência do fim dos combustíveis feita ao pé do pavilhão onde está a OPEP, Organização dos Países Exportadores de Petróleo.
Nos Emirados Árabes Unidos as manifestações são proibidas por lei, por isso o protesto restringiu-se à Zona Azul da COP 28, isto é a área sob mandato da ONU cujo pessoal de segurança protegeu os manifestantes.
Para além disso, as organizações não governamentais que participaram na manifestação acusam responsáveis da ONU de pressionar para que na manifestação a causa palestiniana fosse deixada de lado. Asad Rehman, diretor executivo da War on Want, disse à agência EFE que o protesto demorou mais de uma semana a ser concretizado dado que foram “censurados e silenciados” sobre esta causa.
Ao Libération, Nicolas Haeringer, da 350.org, elenca várias limitações à liberdade de expressão. Em primeiro lugar, as que existem em todas as COP. Os manifestantes não se podiam manifestar durante os três primeiros dias, ou seja durante a parte da Cimeira que contava com os chefes de Estado, “é interdito mencionar o nome de um Estado em particular ou o de uma empresa”. Assim, explica, qualquer protesto “é-se obrigado a usar perífrases”.
Este ano, novas restrições foram impostas. As bandeiras de apoio a qualquer país foram banidas. É neste contexto que, para além dos tradicionais lenços palestinianos, surgiram as melancias que se puderam ver durante esta ação. Historicamente, o fruto tem sido utilizado para representar a bandeira palestiniana quando esta é proibida como acontece em Israel. O slogan “do rio até ao mar” foi igualmente banido.
Por exemplo, noutro evento, organizado pela Amnistia Internacional e pela Human Rights Watch, para protestar contra a detenção de um ativista do Egito e de dois dos Emirados Árabes Unidos, os manifestantes não foram autorizados a ter cartazes com os seus nomes, com a ordem a ser dada dez minutos antes da hora marcada.
Joey Shea, investigadora da HRW, contou à agência norte-americana AP que teve de evitar durante a intervenção que utilizar os nomes dos prisioneiros. “O absurdo do que aconteceu nesta ação de hoje diz muito”, declarou.
Os presos em questão são Mohamed al-Siddiq e Ahmed Mansoor que têm defendido a liberdade política e de imprensa no país. Mansoor teve o seu telefone vigiado com o spyware israelita Pegasus, foi preso em 2017 e condenado a dez anos de prisão. Outro é Alaa Abdel-Fattah, conhecido pela sua participação nos movimentos pró-democracia da Primavera Árabe em 2011, e que tem estado na prisão ao longo de grande parte da última década.
De acordo com a Amnistia Internacional pelo menos 64 cidadãos estão presos nos EAU devido às suas opiniões políticas, muitos há mais de uma década.
A HRW tinha alertado antes do início da COP do Dubai que todos os participantes estariam a ser vigiados ao longo da reunião, assim confirmou ao El Diario Zach Campbell, investigador sénior sobre vigilância desta organização. Já em abril, a mesma ONG tinha denunciado que os participantes de uma conferência internacional sobre saúde e clima, em Abu Dabi, a capital do país, tinham sido avisados pela organização para “não criticar o Islão, o Governo, empresas ou indivíduos” durante as intervenções.
Violações graves dos direitos laborais dos migrantes que fizeram a COP
Outra das dimensões que tem sido criticada é a exploração dos trabalhadores migrantes que construíram as instalações que estão a albergar a COP 28 no meio de deserto, perto de Dubai. Um relatório da ONG Equidem revelou que estiveram expostos a temperaturas muito altas e ao sistema de kafala, que constitui uma forma de exploração tradicional dos trabalhadores migrantes na região.
Este documento foi feito com base em testemunhos de centenas de trabalhadores recolhidos entre fevereiro e março. Contaram situação de violência no trabalho, discriminação, alojamento e pagamento de refeições inadequados, com sobrelotação dos locais onde dormem, entre outras.
Aí ainda se pode ler que “estas questões nascem da falta de poder democrático para os trabalhadores e refletem-se noutros âmbitos como a perseguição dos defensores dos direitos humanos, as restrições da liberdade de expressão, a aplicação de leis repressivas, o abuso do sistema de justiça criminal e os maus tratos das mulheres e da comunidad LGTBQI”.