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Governo recua e passa custo de sacos transparentes nos supermercados para clientes

Os patrões da distribuição não queriam arcar com o custo de encontrar alternativas aos sacos usados para pão, frutas e legumes em supermercados. O Governo cedeu e vai fazer os clientes pagarem os sacos em vez de os proibir, como estava previsto.
Sacos plásticos. Foto de Paulete Matos.
Sacos plásticos. Foto de Paulete Matos.

Na quinta-feira, deveria entrar em vigor a proibição de utilização de sacos plásticos ultraleves nos supermercados, os sacos transparentes que são utilizados para pão, frutas e legumes. Mas o Governo recuou na decisão e volta a permiti-los, recaindo o custo sobre o consumidor.

A Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição, a associação patronal do setor, contestava a proibição que os obrigava a encontrar alternativas mais sustentáveis ecologicamente. O Governo, questionado pelo Jornal de Notícias, não esclarece detalhes da mudança de orientação, alegando estar “a ultimar o diploma que prevê a alteração desta norma” e dando conta que “no futuro, deverá ser privilegiada a utilização de sacos próprios não descartáveis ou alternativas reutilizáveis. A utilização de sacos muito leves ficará sujeita ao pagamento de uma contribuição à semelhança dos sacos de plástico leves”.

Os sacos de plástico leves, os sacos de compras “habituais”, começaram a ser cobrados em 10 cêntimos a partir de 2015, permitindo uma receita fiscal de 2,1 milhões de euros. Não se sabe ainda quanto passarão a custar os sacos de plástico ultraleves.

Um dos argumentos dos patrões da distribuição era a não existência de alternativas “no mercado”. À TSF, Francisco Ferreira, dirigente da Associação Ambientalista Zero, diz o contrário: “já existem alternativas no mercado que nos permitem não continuar a usar esses plásticos”.

Em comunicado, a Zero defende que as soluções reutilizáveis são as mais sustentáveis por travarem “a busca incessante por mais recursos naturais para alimentar a enorme quantidade de sacos e recipientes descartáveis que usamos diariamente”. Mas alerta que para isso é “importante garantir que as soluções reutilizáveis são, efetivamente, reutilizadas”. Sobre alternativas descartáveis diz não ser favorável à substituição de materiais como “primeira abordagem” porque “os materiais têm sempre de vir de algum lado”, o que causa “impactos ambientais brutais, ainda que em áreas ambientais diferentes”, porque “garantir a efetiva compostabilidade dos materiais não é fácil” e porque “em muitos casos” é “difícil distinguir entre um saco de plástico fóssil e um saco de plástico não fóssil o que pode levar à confusão do consumidor e a uma grande contaminação dos fluxos de reciclagem do plástico fóssil”. Acrescenta que o país não tem um sistema de recolha de bio-resíduos, o que faz com que o “o eventual potencial dos materiais compostáveis” não seja aproveitado “e acabará em aterro” e que conceitos como ser compostável ou biodegradável podem passar ao consumidor a mensagem errada, “podendo levar a algum relaxamento em termos da gestão do resíduo”.

Esta organização concorda com o pagamento de sacos e recipientes de uso único de todos os tipos, sem exceções, “garantindo igualdade de circunstâncias para todos os materiais” com foco na reutilização. Ainda assim, julga “lamentável” a mudança de decisão à última hora que acaba por passar aos operadores a mensagem “que vale a pena esperar e não se preparar atempadamente para o cumprimento da legislação, pois haverá derrogações e alterações em cima da hora”.

Tratado Mundial sobre o plástico em discussão em Paris

A alteração de política do governo português acontece curiosamente ao mesmo tempo que decorre em Paris a segunda de cinco rondas de negociação sobre um tratado mundial relativo ao plástico e que envolve 175 países, para além de organizações não governamentais da área do ambiente e também das empresas do setor.

Há perto de um ano, no Quénia, uma série de países tinham já assinado um acordo inicial que abria caminho para um tratado vinculativo em termos jurídicos, a ser implementado já em 2024, com o objetivo de cumprir a meta de acabar com a poluição do plástico.

Em Paris, Macron e outros responsáveis políticos enchem a sala de discursos sobre a proteção ambiental. Mas a questão será a capacidade de concretizar medidas. A produção mundial de plástico por ano é de 460 milhões de toneladas, o dobro de há 20 anos, e pode triplicar até 2060. São usados cinco biliões de sacos plásticos por ano, de acordo com a ONU, e 3,5 biliões deles acabam por ser deitados fora ou ficar em aterros.

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