Legislativas 2025

Bloco abriu campanha em Almada com eurodeputadas da esquerda europeia

04 de maio 2025 - 19:33

O combate à oligarquia, à extrema-direita e aos governos do centro que lhe abriram as portas dominou os discursos no primeiro comício do Bloco, com a presença de eurodeputadas do Podemos, França Insubmissa e Aliança de Esquerda finlandesa.

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Catarina Martins, Manon Aubry, Mariana Mortágua, Li Andersson e Irene Montero.
Catarina Martins, Manon Aubry, Mariana Mortágua, Li Andersson e Irene Montero este domingo em Almada.

Numa sala cheia na Incrível Almadense, o comício de abertura de campanha teve a participação de três eurodeputadas e dirigentes da esquerda espanhola, francesa e finlandesa. “As três forças que aqui estão representadas hoje são a frente da luta contra o fascismo nos seus países” e protagonizam o “combate à brutalidade do capitalismo” que quer dominar todos os aspetos das nossas vidas, afirmou Mariana Mortágua.

O combate à oligarquia deu o mote à intervenção da coordenadora do Bloco, a propósito da mudança política do outro lado do Atlântico, onde essa oligarquia “completou o seu assalto ao poder nos EUA”. Mas por todo o mundo o poder dos bilionários “está em quase todo o lado nas nossas vidas”, prosseguiu Mariana, apontando-os como “os donos das casas, dos hospitais, dos satélites, da energia, da informação e comunicação”.

Comício em Almada
Foto de Gabriela Carvalho.

Agora, “querem ser donos do que falta: querem abocanhar as nossas pensões, a educação e o que sobra do SNS. Chamam a isso uma motosserra”, a ferramenta com que os representantes políticos da direita querem entregar à oligarquia tudo o que foi construído no estado social em democracia.

Mas essa sede de domínio estende-se a outros aspetos da vida, continuou Mariana. Os oligarcas, bilionários ou superricos, “como lhes queiram chamar”, querem também “ser donos dos nossos sonhos e desejos”, tentando convencer cada pessoa de que também pode ser um milionário, desde que tenha “o mindset adequado”. E o passo seguinte é convencê-las que “devias baixar-me os impostos porque um dia podes ser como eu”. Ou seja, “vêm exigir a nossa solidariedade para ficarem com tudo o que é nosso: saúde, pensões casas, salário”.

“A boa notícia”, referiu Mariana, “é que em Portugal há 50 bilionários e nós somos milhões”. E no no dia 18 de maio, “o teu voto vale tanto como o voto de um oligarca”.

Mariana Mortágua
Mariana Mortágua Foto de Gabriela Carvalho

No seu discurso, Mariana Mortágua acusou também os grandes partidos de terem aberto as portas à extrema-direita com as suas políticas e de agora a usarem como ameaça em campanha para tentar convencer as pessoas a continuarem a votar “na mesma política que joga contra elas, contra o trabalho, contra o salário, que causa as desigualdades”

“Esses governos que compraram a agenda racista e xenófoba, que cederam nos princípios dos direitos humanos e que permitiram o genocídio do povo de Gaza, que permitiram destruir a fronteira da humanidade e destruir o direito internacional. De quem é que esses governos, de quem é que esses partidos e líderes políticos se podem queixar?”, interrogou.

“A força mais importante é a esperança”

A ex-ministra da Igualdade e eurodeputada do Podemos, Irene Montero, foi uma das convidadas internacionais para o comício. A atual eurodeputada espanhola sublinhou que “somos muitas, de muitas partes do mundo, que acham que é possível mudar as coisas”, e que “a força mais importante da esquerda é a esperança”.

“O sistema capitalista neoliberal que sustenta os privilégios dos donos do mundo está apoiado sobre os corpos das mulheres. Nenhuma economia do mundo sobreviveria uma semana se não houvessem mulheres a limpar, cuidar das crianças, fazer as compras, tomar conta de casas”, disse a eurodeputada.

Comício em Almada
Foto de Gabriela Carvalho

Irene Montero lembrou que o apagão elétrico da semana passada mostra que o problema de segurança da Europa é que “não podemos viver nas mãos das grandes empresas”. Por isso, “o feminismo diz: a vida antes dos negócios” e por isso mesmo, “dizer feminismo também é dizer Palestina livre”.

A segunda convidada a intervir foi Li Anderson, ex-ministra da Educação da Finlândia e eurodeputada da Aliança de Esquerda. A ex-líder do partido afirmou que “uma das mensagens mais importantes é que as forças de extrema-direita não são só ameaças contra a democracia, direitos das mulheres e dos imigrantes, mas também contra os direitos dos trabalhadores”.

“Gostam de se apresentar como vozes dos trabalhadores. E é por isso que é importante que tenhamos exemplos do que eles fazem quando têm poder. Infelizmente já temos estes exemplos. Na Finlândia, onde há uma coligação entre as direitas, nos Estados Unidos, e cada vez em mais países. O que é que fizeram sobre direitos dos trabalhadores?”. A resposta é sempre retirar direitos a quem trabalha.

Li Anderson sublinha que a maior força da esquerda é “a solidariedade e a ação coletiva”, mas que a esquerda “ tem à frente os anos mais importantes da sua história, para combater estas forças autoritárias e para defender os direitos das mulheres, imigrantes e trabalhadores”.

As intervenções de eurodeputadas foram encerradas por Manon Aubry, eleita pela França Insubmissa e co-líder do grupo parlamentar da Esquerda no Parlamento Europeu. A dirigente do partido francês concordou que “temos um combate muito grande à frente”. E esse combate é também pela justiça fiscal: “tirar o dinheiro de alguns multimilionários, que têm dinheiro para armas e descidas de impostos, mas não para serviços públicos”.

“Dizemos em todas as línguas. Tax the rich, taxer les riches, taxar os ricos. É uma linguagem internacional, não importa de onde vimos”, afirmou a eurodeputada francesa. “Em França, quando começamos a campanha de taxar os ricos, fomos chamados de esquerdistas 'malucos'. Mas essa campanha de 'malucos', mesmo sem a ajuda dos media, provou que a única esquerda que se consegue levantar é uma esquerda que é muito clara. Seja sobre taxar os ricos ou sobre o genocídio em Gaza”.

Manon Aubry, como Li Anderson, frisou que a extrema-direita “gosta de se pintar como estando ao lado do povo, mas não estão, porque querem a mesma coisa que a direita tradicional”. E que a campanha que é preciso fazer, o que a França Insubmissa aprendeu, é que “temos de fazer campanha nós próprios porta-a-porta, pessoa a pessoa, trabalhador a trabalhador”.

Catarina Martins: "O bloco central não se distingue e não nos serve"

“Faz-me impressão haver o campeonato de quem é que propõe menos”. Catarina Martins, ex-coordenadora do Bloco de Esquerda e eurodeputada do partido, abriu assim o comício A esquerda europeia com o Bloco. “E quando alguém aparece, como o Bloco de Esquerda, que diz que tem de haver solução, por exemplo, para a habitação, aí todos veem problemas”.

Num pavilhão cheio até ao segundo andar, no Incrível Almadense, com várias centenas de pessoas, Catarina Martins disse que se alguém “chegasse aqui de paraquedas” e visse os debates televisivos “podia achar que o problema não é quem não tem casa, são os coitadinhos dos especuladores”.

Catarina Martins
Catarina Martins. Foto de Gabriela Carvalho

Face a essa realidade, a ex-coordenadora do Bloco de Esquerda considerou ser precisa “força de mudar”, pelas pessoas que em Portugal “trabalham tantas horas para salários tão baixos”. “Nesta campanha cabe tudo. O salário, o emprego, a casa, a educação. E cabe a nossa humanidade inteira, dos direitos dos imigrantes ao fim do genocídio na Palestina. É essa coragem de lutar por um país decente é o que me entusiasma na campanha do Bloco de Esquerda”, exclamou Catarina, interrompida por aplausos.

Em seguida, Catarina apontou baterias ao bloco central, que nesta campanha “não se distingue” e não serve o país. “O PS pede mais um voto para depois governar com os votos de PSD. PSD pede mais um voto para depois governar com os votos do PS. O bloco central não se distingue e não nos serve. O que nos serve é a força das soluções e essa é o Bloco de Esquerda”,

“No outro dia estive em Guimarães e uma senhora disse-me que queria enviar uma mensagem ao Bloco de Esquerda. Na altura, dei-lhe o meu e-mail. Mas só recebi a mensagem ontem à noite. Dizia: 'Trabalho desde os 14 anos, tenho 44 anos de carreira contributiva e querem que trabalhe até aos 65. Mas sei que o Bloco esteve lá a lutar por quem trabalha, e por isso quero desejar-vos a maior força”.

Depois de terminar, Catarina Martins trouxe ao palco Joana Mortágua, deputada e candidata por Setúbal. A dirigente bloquista frisou que “pertencemos orgulhosamente a uma esquerda que abriu espaço para o protagonismo das mulheres na política”.

“Há 51 anos, as mulheres não tinham direito ao voto universal em Portugal. 50 anos depois, podemos dizer que a política também é um lugar de mulheres livres”, sublinhou Joana Mortágua. Falando sobre as declarações de Pedro Nuno Santos, que no debate com o primeiro-ministro disse ser importante “cuidar das nossas mulheres”, Joana Mortágua afirmou que “nós não precisamos que cuidem do nosso lugar na família e na sociedade”, e que “estamos aqui para lutar com as mulheres, para mudar o seu papel na sociedade”.

A deputada lembrou que não há uma conquista feminista neste país que não tenha a marca do Bloco de Esquerda e que há “quem em Portugal, dizendo que defende os direitos das mulheres, exerce uma cumplicidade oportunista”. Essa é a tarefa da direita portuguesa que “toda unida no parlamento” está “unida numa guerra cultural contra a igualdade de género”.

Terminando a sua intervenção, Joana Mortágua deixou um recado a Luís Montenegro: “quem desvaloriza os números da violência doméstica porque lhe dá jeito, não serve para primeiro-ministro. Quem desvaloriza o maior problema de segurança pública que existe neste país - a maior fonte de criminalidade violenta - porque lhe dá mais jeito uma outra narrativa sobre criminalidade, não serve para liderar um governo neste país”.