Justiça espanhola desvenda operação policial ilegal contra o Podemos

02 de April 2019 - 17:43

Com a perda da maioria absoluta do PP em 2015, o Ministério do Interior espanhol pôs em marcha uma operação ilegal para desacreditar o Podemos, forjando provas e passando as notícias falsas a alguns órgãos de imprensa.

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Pablo Iglesias num encontro com militantes do Podemos este sábado em Pamplona. Foto Dani Gago/Podemos

Acossado pelos processos de corrupção, a perda da maioria absoluta e aumento do peso eleitoral do partido de Pablo Iglesias, o governo liderado por Mariano Rajoy usou a sua polícia política para fabricar uma investigação assente em mentiras contra o Podemos, quando este partido negociava com o PSOE no início de 2016 um eventual acordo de governo.

Durante essas semanas de negociações, após a perda da maioria absoluta do PP nas eleições de dezembro de 2015, alguns media espanhóis divulgaram notícias sobre essas “investigações” que acusavam o Podemos de obter financiamento ilegal vindo do Irão e da Venezuela, através de contas em paraísos fiscais em nome de Pablo Iglesias. As denúncias com base nesse relatório chamado PISA (Pablo Iglesias S.A.) foram todas arquivadas pela justiça espanhola, mas servem ainda hoje de argumento por parte dos políticos da direita espanhola e muitos comentadores do espaço mediático para atacarem o Podemos.

Na mesma altura em que a polícia política preparava o relatório PISA, foi roubado um telemóvel a uma assessora de Pablo Iglesias no Parlamento Europeu, e semanas depois algumas mensagens trocadas com o líder do Podemos começaram a aparecer nos media espanhóis. O conteúdo desse telefone foi encontrado na posse do comissário reformado José Manuel Vilarejo quando foi detido em novembro de 2017, juntamente com 40 terabytes de informações e conversas gravadas com boa parte da elite política de Espanha, que usaria como meio de chantagem.

“Uma rede criminosa que envolve polícias corruptos, meios de comunicação e grandes empresários”

Na passada sexta-feira, o diretor adjunto operacional da polícia espanhola, Eugenio Pino, apontado como o líder desta “polícia patriótica” para abater adversários do PP, foi chamado ao parlamento para responder sobre o caso. Por entre respostas evasivas, admitiu ter enviado agentes a Cuba e à Venezuela para investigar o Podemos. O cidadão venezuelano que aparece como denunciante do suposto financiamento ilegal, tendo entregue documentos que se provaram falsos, obteve uma autorização de residência em Espanha, justificada pelo nº 2 do ministro do Interior Fernández Dias por “motivos excecionais”.

Pablo Iglesias depôs na semana passada na Audiencia Nacional enquanto lesado no processo e afirmou à saída que as novas investigações dizem respeito a “uma rede criminosa que envolve polícias corruptos, meios de comunicação e grandes empresários”. Iglesias criticou ainda o silêncio dos grandes partidos sobre a atuação da polícia secreta e também dos media que divulgaram abundantemente a informação falsa, prejudicando o Podemos.

“Isto põe em causa a nossa democracia e é algo muito grave. Passou-se com a nossa formação política para evitar que governássemos, porque há poderes económicos que querem evitar que estejamos num governo para que paguem finalmente impostos e para que apertem um pouco mais o cinto”, afirmou Pablo Iglesias. Também o secretário de organização do Podemos, Pablo Echenique, exigiu um pedido de desculpas aos líderes do PP e dos Ciudadanos "por terem difundido lixo falso fabricado por criminosos". O partido aponta também responsabilidades ao PSOE por ter votado ao lado da direita para inviabilizar a chamada do ex-comissário Vilarejo a dar explicações aos deputados.

A atuação desta políca secreta às ordens do governo do PP terá começado em 2012, tendo como alvo políticos independentistas catalães. Mas também passou pela investigação a figuras do próprio Partido Popular, como o ex-tesoureiro Luís Bárcenas e a sua família, nos anos que se seguiram à revelação do escândalo da contabilidade paralela do partido liderado por Mariano Rajoy. A intenção era descobrir e fazer desaparecer eventuais documentos na posse do ex-tesoureiro que comprometessem a cúpula do PP.

O atual ministro do Interior do PSOE, Fernando Grande-Marlaska, afirmou esta segunda-feira que “foram adotadas medidas claras e contundentes” para acabar com o grupo ilegal da “polícia patriótica” que investigava sem ordem judicial e com rédea solta durante os governos do PP. Mas na verdade, Marlaska afastou apenas um dos implicados. Os restantes agentes acusados de formarem o grupo policial da guerra suja contra o Podemos já se reformaram, alguns deles distinguidos com medalhas pelos serviços prestados que significam um bónus de 15% na pensão de reforma, como é o caso de Eugenio Pino, o líder operacional desta polícia política, agora também acusado da prática de vários crimes.

Mas ao contrário dos polícias da desmantelada “polícia patriótica”, muitos diretores de informação e jornalistas que alimentaram horas de cobertura televisiva e inúmeras páginas de jornais com o “escândalo do financiamento ilegal do Podemos”, assente em informação falsa, continuam em funções e tentam agora passar despercebidos, não atribuindo o mesmo destaque ou sequer grande relevância ao que alguns já chamam de “Watergate contra o Podemos”.