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A Privatização tem sido um desastre

A nacionalização temporária do serviço principal da costa este devia ser outro prego no caixão da privatização dos caminhos-de-ferro, pois mostra uma vez mais que privatização é um mau negócio para os contribuintes.

O governo diz que planeia devolver o franchise o mais rápido possível ao uma empresa privada mas, em vez disso, deveria aproveitar a oportunidade para reter a linha em mãos públicas. Seguindo o fiasco da Railtrack que pôs a rede nacional de caminhos-de-ferro à beira do colapso em 2002, e o colapso da Metronet, encarregue de dois terços da errada parceria público-privada (PPP) na administração da linha de metro, esta é a altura certa para devolver a rede ferroviária nacional ao sector público. Se o governo deixou de lado as barreiras ideológicas do Tesouro (ministério encarregue das finanças no Reino Unido) e percebeu a mensagem, ser-lhes-ia extremamente benéfico assim como aos passageiros e aos contribuintes.

É uma vigarice completa que a National Express quebre o contrato deixando um défice no orçamento ferroviário nacional, forçando o Estado a suportar esse custo enquanto o serviço é outra vez franchisado - possivelmente a um valor inferior do que o contrato com a National Express. Todavia, continuam a insistir na manutenção da gestão de outros franchises não afectados. A National Express afirma que recebeu aconselhamento legal "claro e detalhado" de que não tem de devolver as linhas Londre-Essex and East Anglia. Portanto, quer fugir de um problema deixando-nos a nós resolver o problema enquanto continua a fazer lucros com outras linhas.

A tentativa da National Express de evitar quaisquer consequências para os seus outros franchinses por causa do abandono do serviço da Costa Este é apenas outro exemplo de como os privatizadores estão a tomar conta do sector público Como diz Lord Adonis "é simplesmente inaceitável aproveitar um contrato quando os tempos correm de feição e depois fugir dos mesmos quando os tempos correm mal."

Várias vezes vimos os a nacionalização das perdas e a privatização dos lucros. É também a demonstração de que privatização significa que o sector privado assume o risco assim como os lucros, é um conto de fadas. Na verdade, sempre que a privatização de um serviço público falha, o sector público assume os problemas. Esta cultura do sector privado depenar o contribuinte tem de terminar.

Parte do problema é que os funcionários públicos são os sacrificados nos contratos de privatização devido às astutas equipas legais das empresas privadas. Uma das justificações para a PPP do metro foi a de que não tinha sentido manter funcionários públicos que não eram rentáveis. Estes mesmos funcionários foram completamente desprezados pelo sector privado.

Mas o verdadeiro problema é que é inevitavelmente um desperdício que se administrem estes serviços através de linhas privatizadas. A natureza das empresas privadas é que uma parte significativa dos seus lucros têm de ser pagos em dividendos aos accionistas e depois reinvesti-los no serviço. Este dinheiro é desperdiçado. Uma empresa pública seria obrigada a investir as receitas no sistema de transportes.

Mais, a privatização é justificada com o argumento de que o sector público é, através uma rigorosa concorrência, mais eficiente e mais solícito às necessidades dos passageiros. Isto é ficção no caso de um monopólio natural como é o caso dos caminhos-de-ferro. Além de um breve período de concorrência entre aqueles que querem obter o contrato, não há concorrência diária nenhuma - ninguém vai construir uma linha de comboio e tirar passageiros ao franchise. Não sofrem pressão alguma da concorrência. Em circunstâncias como estas, é mais racional e faz muito mais sentido no que respeita ao investimento sustentável, que os serviços ferroviários pertençam ao sector público.

Nem é o caso de que a propriedade pública da rede ferroviária significa naturalmente uma gestão menos boa que a do sector privado. Há muitas empresas públicas que operam os transportes ferroviários por todo o mundo que fornecem serviços cujos transportes britânicos teriam inveja. A tarefa é construir uma gestão de qualidade para fazer os investimentos que vão de encontro às necessidades dos viajantes.

Não devia ser o serviço da Costa Este o único a ser nacionalizado e nem deveria ser temporário. Em última análise, a rede ferroviária seria mais racional se gerida pelo sector público.

Artigo publicado no jornal britânico Guardian a 2 de Julho de 2009

Sobre o/a autor(a)

Político britânico
(...)

Neste dossier:

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Documentário “Pare, escute, olhe”

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A grande venda

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