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Dos Documentos do Pentágono aos dias de hoje
O The Washington Post já não pertence à família Graham. Em 2013, foi vendido ao multimilionário Jeff Bezos, conhecido por ser o fundador e dono da Amazon e ostentar hoje o título de o homem mais rico do planeta, com um património calculado em 120 mil milhões de dólares (em fevereiro deste ano), o que o torna também no homem mais rico jamais registado na história moderna.
Katharine Graham, interpretada por Meryl Streep no filme “The Post”, ficaria à frente da empresa até à sua morte, em 2001. Outra mulher, Katharine Weymouth, sobrinha do filho de Katharine Graham, ocupou os cargos de publisher e principal executiva da empresa até à venda ao milionário Bezos.
Mas foi no período em que a dupla formada por Graham e o editor executivo Ben Bradlee conduziu os destinos do jornal que este viveu o seu período de glória, consolidando-se como um dos principais media de referência nos Estados Unidos.
O Watergate, furo do Post
No caso dos Documentos do Pentágono, o Post tivera um papel apenas coadjuvante em relação ao New York Times. Já o Watergate, que acabaria por levar à renúncia do presidente Richard Nixon, foi exclusivo do Washington Post, e Bradlee, com o apoio de Kathatine Graham, mobilizaria todos os recursos do jornal para apoiar os repórteres Bob Woodward e Carl Bernstein na investigação que deslindou passo a passo o que estava por trás da invasão da sede do Comité Nacional do Partido Democrata, situado no edifício Watergate. Aliás, os “canalizadores” que invadiram o Watergate eram a mesma equipa montada por Nixon que já antes penetrara furtivamente no escritório do psiquiatra de Daniel Ellsberg.
A investigação jornalística do caso Watergate rendeu ao Post o prémio Pullitzer de Serviço Público em 1973, deu origem ao famoso filme “Os Homens do Presidente” e criou um enigma acerca da identidade da fonte de informação de Woodward e Bernstein, o “Garganta Funda”. Considerado o maior mistério não-revelado do jornalismo dos Estados Unidos, a identidade da fonte do Post era conhecida por apenas quatro pessoas: Woodward, Bernstein, o editor-executivo Bradlee e o próprio Garganta Funda. O segredo manter-se-ia protegido até que o próprio decidisse vir a público. Foi o que aconteceu em 2005, quando W. Mark Felt, que na altura do caso Watergate era o número dois do FBI, assumiu que tinha sido ele a fornecer as informações decisivas aos repórteres do Post.
Post contra o perdão a Snowden
Mas a tradicional – e obrigatória – postura de preservar e defender as fontes não foi mantida 44 anos depois, quando, depois de publicar reportagens baseadas nas fugas de informação de Edward Snowden, o Washington Post foi contrário, em editorial, à concessão de um perdão ao ex-administrador de sistemas da CIA e ex-contratado da NSA, pedindo explicitamente a Obama que não lhe desse o indulto que lhe permitiria voltar aos EUA livre de acusações. O perdão vinha sendo defendido por três dos quatro meios de informação que publicaram as revelações de Snowden – The Guardian, The New York Times e The Intercept – os quais, por terem aceitado e publicado o material disponibilizado pela fonte, implicitamente consideraram os documentos fornecidos por ele como sendo de interesse público.
Assim, o Post “conseguiu uma infeliz proeza na história dos media americanos, tornando-se o primeiro jornal a defender explicitamente a acusação criminal da sua própria fonte, após ter recebido dela a oportunidade de vencer e aceitar o Prémio Pulitzer por Serviço Público”, acusou Glenn Greenwald, o jornalista que primeiro falou com Snowden. Para o fundador do The Intercept, os editores do Post deram provas de desonestidade intelectual e de covardia.
Favorável à guerra do Iraque
Foi um momento triste para um jornal que chegou a ser chamado pelos conservadores, nos anos 70, como “o Pravda do Potomac”. O Post deixaria para trás as posições mais liberais (no sentido que dão a esse termo nos EUA), para assumir posturas de “falcão” durante a guerra do Iraque. Nos meses anteriores à invasão, o jornal publicou nada menos que 27 editoriais a favor da guerra. E entre agosto de 2002 e o início da invasão, em março de 2003, o Post publicou 140 artigos de primeira página apoiando os esforços da administração Bush para começar a guerra. Perante o desastre que se seguiu, o jornal foi lento a admitir as evidências. Em agosto de 2004, um editorial admitiu “não ter dado suficiente atenção às vozes que questionavam a guerra”, nomeadamente em relação à existência de armas de destruição maciça.
O “Amazon Washington Post”
Apesar disto, o Washington Post é abertamente considerado inimigo pelo presidente Trump, que o acusa – como aliás quase todos os media, à exceção da Fox News – de produzir notícias falsas contra a sua gestão. Com a venda a Bezos, Trump gosta de se referir ao jornal como o “Amazon Washington Post”. Bezos apoiou, tal como o Post, a candidatura de Hillary Clinton e tem uma postura particularmente crítica em relação aos que hoje ocupam a Casa Branca. De tal forma que o Post, ao fim de décadas, adotou um lema, inscrito no alto da sua primeira página: “Democracy dies in darkness” (A democracia morre na escuridão), inspirada numa entrevista dada por Bezos ao editor Martin Baron. Bezos, por sua vez, atribui-a a Bob Woodward. Seja quem for o autor, o lema pretende sublinhar que o papel da imprensa é iluminar os factos, impedir que as ações do ogverno permaneçam na escuridão.
Apesar de não ser demasiado evidente, ainda assim o lema parece melhor que o do New York Times, “All the news that's fit to print" (Todas as notícias que estão aptas para impressão), consideradas as sete palavras mais famosas do jornalismo dos EUA. Valha a verdade que o slogan do NYT foi criado em 1897.
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