De 14 a 22 de junho decorreu pela primeira vez em Lisboa aquele que prometia ser o maior evento LGBTQIA+ da Europa. No entanto, com uma organização desde cedo envolta em polémicas, o evento sofreu um forte boicote por se ter tornado uma montra do pinkwashing de Israel.
O que deveria ter sido um momento de orgulho e luta pelos direitos LGBTQIA+ em Portugal foi apropriado por uma lógica capitalista e transformado num evento empresarial de patrocinadores voltado para o lucro. As marchas e ativistas políticas foram transformadas em marchas publicitárias e bancas turísticas, deixando o orgulho render-se ao negócio. O evento teve o custo de 1 milhão de euros e esperava receber cerca de 500 mil pessoas em Lisboa, estando mais focado em interesses comerciais, do que com as lutas das pessoas queer em Portugal.
As Associações LGBTQIA+ portuguesas ILGA Portugal, Rede Exaequo e a AMPLOS abandonaram a organização do evento, deixando esta a cargo da Variações (Associação de Comércio e Turismo LGBTI de Portugal).
Até ao ano passado, a associação Variações era presidida por Diogo Vieira da Silva, nomeado comissário municipal para o EuroPride. Uma escolha polémica devido ao facto de Diogo Vieira da Silva ter sido investigado por denuncias de corrupção, desvios de dinheiro, burla e abuso de confiança, reveladas pela “Prova dos Factos” da RTP. Vieira da Silva foi também chefe de imprensa da Embaixada de Israel em Lisboa e organizou a Israeli Pride Party no Finalmente Clube em 2023, que foi alvo de protestos e indignação. Vieira da Silva foi nomeado pelo executivo de Carlos Moedas, através de Diogo Moura, vereador da cultura e um dos membros fundadores da ALPI (Associação Lusa Portugueses por Israel), um grupo de lobby sionista.
O que é o pinkwashing de Israel? O Estado de Israel instrumentaliza e apropria-se dos direitos LGBTQIA+ para se mostrar como um país aberto e inclusivo à comunidade internacional, quando continua sistematicamente a violar os direitos humanos em Gaza e a cometer um genocídio na Palestina.
Mais de 60 organizações de luta pelos direitos LGBTQIA+, pelo direito à Habitação, pela Palestina, feministas, antirracistas e contra as alterações climáticas subscreveram o manifesto No Pride in Genocide, que denuncia a apropriação do discurso queer por parte de Israel.
Na programação do evento, Carlos Reis, ex-deputado à Assembleia da República pelo PSD, foi um dos oradores convidados no painel intitulado “Defending equality: military spending and LGBTQIA+ rights”. na “Conferência de Direitos Humanos do EuroPride 2025”. Em janeiro deste ano, Carlos Reis integrou uma comitiva de deputados da AD que viajou até Israel e aos Territórios Ocupados na Palestina a convite da ELNET, a maior organização de lobby pró-sionista da Europa. Carlos Reis foi também um dos responsáveis pela retirada de circulação do Guia “O Direito a Ser nas Escolas”, aprovado pela maioria de direita no parlamento.
A organização da Marcha pelos Direitos LGBTQIA+ em Lisboa rompeu com o EuroPride e realizou a sua marcha na Avenida da Liberdade a 7 de junho. Já o neonazi Mário Machado decidiu organizar no dia 10 de junho uma “Marcha do Orgulho Heterosexual”, no Porto, a que não pode comparecer por estar na cadeia.
Mais recentemente foi criado o movimento No Pride in Zionism, que organizou uma série de iniciativas em Lisboa sobre pinkwashing, o direito à habitação e o genocídio na Palestina durante a semana de EuroPride.
Nenhum evento LGBTQIA+ pode deixar-se apoderar por interesses económicos e deixar de parte o ativismo social dos direitos LGBTQIA+, e muito menos compactuar com violações de direitos humanos e genocídio.
Várias associações e movimentos LGBTQIA+ avisaram e criticaram a organização do EuroPride 2025 devido às suas incongruências e ligações à Embaixada de Israel e ao compactuar com o genocídio, porém não foram obtidas respostas.
Os movimentos LGBTI+ em Portugal têm sido claros na luta pelos “direitos humanos e contra todas as suas violações e opressões. A ocupação e o genocídio na Palestina não são exceção. O nosso orgulho são os direitos humanos”.