Numa declaração emitida na terça-feira, a Relatora Especial das Nações Unidas para a Tortura, Alice Jill Edwards, lembra que Julian Assange sofre de uma perturbação depressiva recorrente e de longa data” e que este “foi identificado como estando em risco de suicídio”.
“Nos Estados Unidos, enfrenta inúmeras acusações, incluindo algumas ao abrigo da Lei de Espionagem de 1917, por alegadamente ter distribuído ilegalmente documentos e outras informações diplomáticas através da WikiLeaks. Se for extraditado, poderá ser mantido em isolamento prolongado enquanto aguarda julgamento ou como prisioneiro. Se for condenado, pode ser condenado a uma pena de prisão até 175 anos", detalha Alice Jill Edwards.
De acordo com a Relatora Especial da ONU, “o risco de ser colocado em prisão solitária, apesar do seu estado mental precário, e de receber uma sentença potencialmente desproporcionada, levanta questões sobre a compatibilidade da extradição de Julian Assange com as obrigações do Reino Unido ao abrigo do direito internacional".
Alice Jill Edwards remete para o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, a Convenção das Nações Unidas contra a Tortura, e a Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
Desde a sua detenção, em 11 de abril de 2019, nas instalações da embaixada do Equador em Londres, Julian Assange está preso no estabelecimento de alta segurança de Belmarsh, perto de Londres. Mantido em regime de isolamento, tem sido sujeito a condições de detenção que têm sido denunciadas pelos defensores dos direitos humanos como sendo degradantes e desumanizantes, inclusive o antecessor de Alice Jill Edwards, Nils Melzer.
#UnitedKingdom: Serious questions to answer whether #JulianAssange extradition to USA would be compatible with his human rights.
UN Special Rapporteur on Torture urges UK government to halt imminent extradition of #JulianAssange. Read my statement: https://t.co/PFzPH4ZHue— Alice J Edwards UN Special Rapporteur Torture (@DrAliceJEdwards) February 6, 2024
Ainda assim, e conforme sublinha o Mediapart, este novo alerta sobre as potenciais consequências da extradição para a saúde de Julian Assange é mais contundente e premente do que os anteriores.
Último recurso de Assange ao abrigo da lei britânica
Nos próximos dias 20 e 21 de fevereiro, o Supremo Tribunal de Londres deverá apreciar o último recurso do jornalista australiano ao abrigo da lei britânica. Se o seu pedido for rejeitado, apenas o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH) poderá ser envolvido.
Os Estados Unidos deram “garantias” de que Assange não seria detido numa prisão de alta segurança e não seria colocado em isolamento. As autoridades americanas também abriram a porta a uma possível transferência de Julian Assange para a Austrália. Bem como se comprometeram a garantir que o jornalista receberia "tratamento clínico e psicológico adequado" ao seu estado de saúde. As promessas americanas levaram o Supremo Tribunal de Justiça de Londres a anular a sentença da primeira instância, que, em janeiro de 2021, deu razão a Assange.
Posteriormente, a defesa de Assange interpôs um novo recurso junto do Supremo Tribunal, que se recusou a apreciá-lo. Mais uma vez, os advogados do jornalista interpuseram um recurso contra a ordem de extradição, rejeitado por um juiz a 6 de junho de 2023.
O único objetivo do atual recurso é determinar se Julian Assange tem o direito de recorrer da decisão de 6 de junho de 2023. Se o recurso for aceite, terá de ser marcada uma nova audiência de recurso.
Se o pedido for rejeitado, os advogados do fundador do WikiLeaks terão esgotado todas as vias de recurso ao abrigo da lei britânica. A única opção que lhes resta é remeter o caso para o TEDH, alegando risco iminente de danos irreparáveis, como ameaças à vida ou maus-tratos de um cidadão, para que sejam tomadas "medidas provisórias" urgentes.
Alice Jill Edwards considera que “as garantias diplomáticas de tratamento humano por parte do governo dos EUA não são suficientes para garantir a proteção de Assange”. "Não são juridicamente vinculativas, têm um âmbito de aplicação limitado e a pessoa a quem se destinam a proteger pode não ter qualquer recurso se forem violadas", explica.
A Relatora Especial das Nações Unidas para a Tortura "apela ao Governo do Reino Unido para que reveja cuidadosamente a ordem de extradição de Assange, de forma a garantir o pleno cumprimento da proibição absoluta e não derrogável de repulsão para tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes, e para que tome todas as medidas necessárias para salvaguardar a saúde física e mental de Assange".