Comissão Europeia diz que vai mudar regras orçamentais. Mas fica tudo na mesma?

09 de novembro 2022 - 10:14

Tudo indica que as metas do défice e da dívida manter-se-ão e a principal alteração será a de flexibilizar o período de ajustamento para os países que não as cumpram, em troca da promessa de "reformas estruturais" que são sinónimo de cortes na despesa pública e nos direitos dos trabalhadores.

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Charles Michel, Ursula von der Leyen e António Costa esta segunda-feira na COP27, no Egito. Foto Dati Bend/Comissão Europeia.

A reforma das regras orçamentais europeias já está a ser discutida há vários anos. Antes da pandemia, a Comissão Europeia planeava avançar com uma proposta para alterar as regras inscritas no Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC), que vincula os países da União Europeia ao cumprimento de metas para o défice e a dívida pública. No entanto, a pandemia levou a Comissão a suspender estas metas, visto que nenhum país as conseguiria cumprir face ao choque económico provocado pelas medidas de confinamento.

Com o início da guerra na Ucrânia, decidiu-se que as regras continuariam suspensas em 2023. Entretanto, a Comissão prepara-se para apresentar esta semana a proposta de revisão das regras. O novo enquadramento pode passar a vigorar quando a suspensão do PEC terminar, em 2024, embora dependa da rapidez com que decorra um processo legislativo que se antevê longo e complicado.

Atualmente, as regras orçamentais definem um limite para a dívida pública (60% do PIB) e para o défice orçamental (3% do PIB). Além disso, as regras definem também que os países cuja dívida pública exceda este teto têm de se comprometer a reduzir o excesso de dívida em 1/20 por ano. Durante algum tempo, discutiu-se a possibilidade de deixar cair estes limites. No entanto, não parece ser esse o rumo adotado.

De acordo com fontes próximas da Comissão, as metas manter-se-ão e a principal alteração será a de flexibilizar o período de ajustamento para os países que não as cumpram. No entanto, esta flexibilização tem de ser justificada pelo compromisso dos países com “reformas estruturais” - um termo que, nas últimas décadas, tem sido utilizado para abarcar medidas de desregulação laboral ou de cortes da despesa pública.

Além disso, os países em consolidação orçamental serão sujeitos a tetos anuais para a despesa pública primária (isto é, excluindo o pagamento de juros da dívida). O incumprimento destes limites levará a sanções, que serão aplicadas “de forma mais automática”.

Propostas deixam quase tudo na mesma

As alterações que deverão ser apresentadas são semelhantes às que foram propostas há pouco mais de um ano no Parlamento Europeu. Na altura, o eurodeputado do Bloco presente na Comissão de Assuntos Económicos, José Gusmão, criticou o “raciocínio subjacente a esta proposta: a ideia de que os problemas de endividamento de um país se resolvem com restrições cegas às despesas do Estado.”

Para José Gusmão, “uma regra [de limitação da despesa] desta natureza limitaria consideravelmente o espaço dos governos para definir planos de investimento ou promoção de rendimentos”, sobretudo em períodos de recessão económica e aumento do desemprego, o que se traduziria num regresso à lógica da austeridade para combater as crises, apesar do seu fracasso na última década.

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