Está aqui

Austeridade e euroceticismo dominam campanha

Com apenas dois dias a faltarem para as eleições, o jogo agora parece uma luta entre os dois maiores partidos que governaram o pais numa coligação entre 1998 e 2002. Uma coligação que mal conseguiu funcionar entre as lutas internas. Artigo de Mark Rendeiro, do citizenreporter.org.
Foto José Nuno Pereira

O governo holandês já se demitiu há 4 meses, mas só esta semana é que se realizam as eleições gerais. Uma eleição marcada pelo regresso dos partidos da esquerda, e um primeiro ministro que quer uma segunda tentativa para completar um mandato depois de não ter conseguido chegar a um acordo para adoptar o programa de austeridade.  

Durante o verão o grande tema de debate nos meios de comunicação nacionais tem sido a popularidade no Partido Socialista (SP) e o seu líder Emile Roemer. Depois de estar sempre atrás do Partido Trabalhista (PvdA) e dos vários partidos da direita, nos últimos quatro anos os socialistas têm tido bastante sucesso ao nível municipal e têm crescido a nível nacional. Com uma política que questiona austeridade e a liberalização do sectores de saúde e educação, muitos cidadãos têm mudado o apoio tradicional aos dois grandes partidos e querem dar mais poder ao SP, para acabar com os últimos 4 governos formados pelos liberais do VVD, os Cristãos Democratas (CDA), e o Partido Trabalhista (PvdA).

Desde das ultimas eleições em Julho de 2010, o partido liberal (VVD) governou com a ajuda de uma coligação incluindo o partido da extrema direita PVV como “parceiro silencioso”. Em Abril, dizendo que não estava de acordo com o programa de austeridade do primeiro ministro, o infame líder anti-Muçulmano Geert Wilders saiu da coligação. Sem qualquer outro partido para fazer uma nova coligação, o Primeiro Ministro Mark Rutte demitiu-se e novas eleições foram marcadas.

O facto de não conseguir governar um mandato completo já foi um problema do antigo Primeiro Ministro Jan Pieter Balkenende. Desde o governo de Wim Kok em 1998, nenhum governo Holandês tem conseguido manter uma coligação até o fim dum mandato.  

O final deste verão tem sido também marcado pelo surgimento dum candidato relativamente novo dos trabalhistas, Diederik Samsom. Físico nuclear, ex-ativista do Greenpeace, vegetariano, e frequente campeão de quiz shows e testes de QI, as primeiras sondagens de setembro revelam que mais pessoas gostariam de ver Samsom como primeiro ministro em vez de Rutte outra vez. O líder dos trabalhistas até já ultrapassou Roemer, uma grande estrela desta campanha eleitoral, e é visto como líder para o futuro da Holanda. Em resposta às sondagens nestes últimos dias da campanha, Mark Rutte diz que uma vitoria para o PvdA não seria só má para o partido dele, mas seria um ameaça para o pais inteiro.

O discurso de resistir aos cortes e à austeridade não é só um fenómeno que tem trazido votos aos socialistas.  Os candidatos na lista do poderoso PVV também partilham o objectivo de não seguir as reformas do antigo governo.  No caso no PVV, fala-se também de resistir às medidas que vêm da União Europeia, um euro-ceticceticismo que muitos Holandeses partilham. Este ano, Geert Wilders começou uma campanha para re-introduzir a moeda antiga da Holanda (o florim) para preparar a saída da moeda única.

As sondagens mostram que os temas mais valorizados por eleitores e partidos são economia, saúde, e educação. Nenhuma surpresa num pais onde o sistema de saúde foi parcialmente privatizado em 2006. O novo sistema obriga cada pessoa de comprar seguros de saúde de companhias privadas. O governo exige que cada companhia forneça no geral os mesmos benefícios e regula os aumentos dos custos. Agora vários partidos do centro-direita como o VVD querem ter mais concorrência e menos controlo por parte do governo. Uma política que muitas companhias também desejam.

Na área de educação, a luta continua entre o plano para parar os subsídios para estudantes, e adoptar um sistema de empréstimos para pagar os estudos universitários. Alguns partidos também querem introduzir multas a estudantes que recebem bolsas do estado mas não terminam os estudos dentro de um prazo “normal”.  O programa de oferecer empréstimos para estudantes em vez de subsídios ou bolsas já funciona em vários países Europeus e nos Estados Unidos.  

Uma dos temas menos falados pelos grandes partidos tem sido a questão dos coffeeshops e a lei que entra em vigor a nível nacional em janeiro de 2013. Uma lei que foi introduzida pelo partido do primeiro ministro, pretende mudar o sistema de venda e compra de canábis para que apenas residentes da Holanda possam entrar no coffeshop e comprar erva. Também põe um limite no numero de clientes por ano, e obriga o estabelecimento a ter uma lista de “sócios” (clientes) registados.  A lei já esta a funcionar na cidade de Maastricht e vários municípios no sul da Holanda, onde muitos coffeeshops já fecharam com falta de turistas e residentes da Holanda que não querem registar os seus nomes na lista oficial de “sócios”. Esta semana, o presidente da câmara de Maastricht, que foi um grande arquitecto deste plano, anunciou que a cidade está com problemas com a venda da droga na rua, devido ao fecho de muitos coffeeshops, e que quer acabar com a lei na cidade dele.

Com apenas dois dias a faltarem para as eleições, o jogo agora parece uma luta entre os dois maiores partidos que governaram o pais numa coligação entre 1998 e 2002. Uma coligação que mal conseguiu funcionar entre as lutas internas.  Hoje em dia a Holanda já não é o pais que era no fim dos anos 90. Mesmo que a taxa de desemprego e os problemas finançeiros não tenham sido tão graves aqui como em Portugal, Espanha, Irlanda, Itália, etc, o país esta com medo de perder a riqueza que conseguiu nas últimas décadas. Euroceticismo, intolerância com a imigração, e o programa de austeridade criou uma situação com muitos partidos, muitos deles com poder eleitoral, e pouco espírito de cooperação. 


Mark Fonseca Rendeiro é jornalista independente, Luso-Americano residente em Amesterdão desde 2002 e fundador do Citizenreporter.org.

Termos relacionados Internacional
(...)