De acordo com o ICIJ (Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação), a Câmara Empresarial, uma divisão especial do Tribunal de Recurso de Amesterdão, descobriu que 52,6 milhões de euros foram desviados da petrolífera Sonangol através de sociedades anónimas holandesas para beneficiar Isabel dos Santos.
A decisão do tribunal está em consonância com as conclusões do ICIJ e parceiros na investigação do Luanda Leaks, bem como valida um relatório contundente de um diretor, nomeado pelo tribunal, da Esperaza Holding BV, um veículo usado pela Sonangol para comprar ações da Galp.
Esse relatório assinala que a venda, em 2006, de 40% da Esperaza para a Exem Energy BV, uma empresa do marido de Isabel Santos, o empresário congolês Sindika Dokolo, já falecido, foi “um ato de corrupção” e deveria ser anulada.
Após o afastamento de José Eduardo dos Santos da presidência angolana, surgiu uma disputa entre a Sonangol e a Exem sobre a legalidade desta aquisição. Em 2021, essa disputa foi resolvida a favor da Sonangol por um tribunal do Instituto de Arbitragem da Holanda. Segundo o tribunal, a aquisição foi nula por ser “contrária à ordem e aos bons costumes públicos”.
Ainda em 2020, a pedido da Sonangol e outros, a Câmara Empresarial ordenou a investigação dos negócios de Esperaza a partir de 1 de janeiro de 2017. Em 15 de novembro de 2017, o recém-eleito presidente angolano João Lourenço demitiu Isabel dos Santos do cargo de presidente do conselho da Sonangol.
A investigação holandesa revela que Isabel dos Santos recorreu a atas falsas para canalizar os 52,6 milhões de euros da Esperaza Holding BV para a sua própria empresa, e que a empresária tentou ocultar essa transferência ilegal alterando as datas dos documentos por forma a provar que as decisões foram tomadas antes da sua demissão.
O tribunal refere que ficou estabelecido que “todas as pessoas que assinaram um ou mais documentos sabiam que estes eram retroativos”. E detalha que dois dos diretores da empresa deveriam ter percebido que Isabel dos Santos “estava a tentar, de forma ilegal, fazer um pagamento rápido de dividendos” mediante atas retroativas e forjadas.
Maarten Drop, advogado da Sonangol, considera que “a decisão da Câmara Empresarial é de grande importância para este caso de responsabilidade”,constituindo “um reforço importante na luta de Angola contra a corrupção de dos Santos”.
A condenação da Câmara Empresarial do Tribunal de Amesterdão afeta Mário Leite da Silva, antigo braço direito de Isabel dos Santos, e o seu administrador financeiro na Sonangol, Sarju Raikundalia.
Isabel dos Santos recorre da decisão
Isabel dos Santos, que vive atualmente no Dubai e é alvo de um mandado de captura internacional emitido pela Interpol, a pedido das autoridades angolanas, já anunciou que vai recorrer da decisão do tribunal.
Acresce que a empresária acusou a Câmara Empresarial de “falta de conhecimento do normal funcionamento” das empresas.
"O Tribunal baseou a sua decisão no facto de a ata dessa Assembleia Geral não ter sido assinada no mesmo dia em que a mesma ocorreu", avança Isabel dos Santos num comunicado enviado à agência Lusa.
Na missiva, a empresária alega que, "como é prática da gestão empresarial, comum e corrente em várias empresas, as atas são sempre redigidas após a realização das reuniões e as assinaturas das diferentes partes e pessoas envolvidas são recolhidas nos dias seguintes, constando na ata a data em que ocorreu a reunião".
Isabel dos Santos defende ainda que a Sonangol "alegou falsamente ao Tribunal da Holanda que os membros do Conselho de Administração da Sonangol, no dia 26 de setembro de 2017, se encontravam na tomada de posse do Presidente da República de Angola, João Lourenço, e que, por essa razão, estavam fora da empresa e não se reuniram nesse dia, pedindo assim ao Tribunal que considerasse como falsa a ata da reunião do Conselho de Administração de 26 de setembro de 2017".
“A verdade é que os membros do Conselho de Administração da Sonangol não foram convidados para a tomada de posse do Presidente João Lourenço no dia 26 de setembro de 2017, e nesse dia encontravam-se na Sonangol, na sede da empresa, reuniram-se e estiveram a trabalhar e a cumprir o seu dever, pela importância estratégica da empresa, bem como a garantir as suas operações", argumenta a empresária.