Enquanto se discutem os pequenos descuidos e os enormes abusos no processo de administração de vacinas em Portugal, a grande ilusão está na forma misteriosa como as empresas farmacêuticas driblam os acordos firmados.
A descrença na ciência não é só uma consequência da descrença na própria política, mas também duma ciência e de políticas científicas que cada vez mais foram cooptadas, organizadas e dirigidas por interesses económicos que priorizavam o lucro em detrimento do bem público.
Sim, há uma economia política da saúde global e a desigualdade é a sua marca definidora. A negligência é a extensão operativa dessa desigualdade. Doenças de primeira e doenças de segunda, doenças que mobilizam resposta e doenças negligenciadas.
O mais importante seria garantir que não existem acordos bilaterais entre os países mais ricos e as empresas responsáveis pelo desenvolvimento das mesmas.
Há duas formas de rejeição da vacina: a das teorias da conspiração da extrema-direita e a da reivindicação liberal contra o intervencionismo de políticas sanitárias públicas.
De mãos dadas com o novo normal, há esse velho normal da desigualdade. E é nesse velho normal que se está a disputar o que vai ser a vacina contra a Covid-19.