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O Modelo Nórdico
Nós, escritores da Noruega e da Suécia estamos bem conscientes de que haverá um referendo na Escócia em 18 de Setembro de 2014 para votar contra ou a favor da independência.
Temos vindo a ficar surpreendidos com a campanha de medo que tem vindo a ser lançada pelos partidos políticos em Londres, visando manter a União.
Oferecemos o nosso apoio à causa da independência escocesa e gostaríamos de sublinhar que a separação da Noruega e da Suécia e consequente independência norueguesa em 1905 veio beneficiar e enriquecer a cultura política de ambos os países.
A separação não conduziu a um enfraquecimento da cooperação, mas à criação de um relacionamento de qualidade entre os nossos dois países, a todos os níveis.
Considerando isto, esperamos que votem pela independência.
Assinado por: Thorvald Steen, novelista, ensaísta e poeta; John Fosse, dramaturgo; Mustafa Can, novelista e jornalista; Jostein Gaarder, novelista; Anne B. Radge, novelista; Kjersti A. Skomsvold, novelista; Arne Ruste, poeta, ensaísta e novelista; Ingvild Burkey, poeta e editor; Paal Helge Haugen, novelista e autor para crianças; Frode Grytten, autor e jornalista; Tom Egeland, novelista; Bengt Berg, poeta; Torgeir Rebolledo Pedersen, escritor, arquiteto e compositor; Thor Sorheim, autor; Mette Karlsvik, autor e jornalista; Gro Dahle, poeta e autor para crianças; Knut Odergärd, poeta e escritor.
Este é um contributo comovente por parte dos mais talentosos e inteligentes dos nossos vizinhos nórdicos, que vem lembrar-nos que somos parte do mais vasto (e mais progressista) arquipélago do Norte. Este texto contextualiza o problema: “Porque devemos deixar cair a Anglo-America e aprender mais com os países do Norte?”. Por James Foley e Pete Ramand.
Na semana passada, um relatório da Oxfam [organização humanitária internacional] revelou que as cinco mais importantes famílias do Reino Unido possuem tanta riqueza quanto os mais pobres 20% dos britânicos juntos. Os números provam, se dúvidas ainda houvesse, que a “aberta” economia Britânica conduziu a uma sociedade “fechada”. Defender estas injustiças pode repugnar mesmo ao unionista mais zeloso, mas mesmo assim, perguntam, quais são as alternativas para a Escócia?
Os dirigentes do SNP planeiam, pelo menos até certo ponto, trocar o laissez-faire do capitalismo britânico pela social democracia nórdica. Apoiando-se em iniciativas como Nordic Horizons e Common Weal, sustentam que as políticas escandinavas diminuiriam as desigualdades e promoveriam um crescimento mais rápido, contrabalançando a iniciativa privada com uma segurança social sustentável. Assim dito, soa a apelativo. Tão apelativo, na verdade, que alguns apoiantes do Labour apontam para idênticos objetivos, embora o seu mecanismo de distribuição preferido seja uma maior devolução [transferência de poderes para o parlamento escocês].
A vantagem em defender a solução escandinava é evidente. A Noruega, a Suécia, a Dinamarca e a Finlândia têm níveis de vida mais altos do que o Reino Unido, maior produtividade, e menos acentuadas diferenças entre ricos e pobres. No seu influente livro, The Spirit Level, Richard Wilkinson e Kate Pickett argumentam que, com os baixos níveis de desigualdade nórdicos, a qualidade de vida da sociedade britânica melhoraria. Cresceria a confiança entre os cidadãos; os níveis de saúde mental subiriam; a esperança de vida aumentaria; e os números dos homicídios seriam reduzidos em pelo menos três-quartos.
Também sob o ponto de vista político os países do Norte são mais interessantes do que a Grã-Bretanha. Num estudo estatístico recente sobre as sociedades mais democráticas do mundo, eles ocupam cinco dos lugares cimeiros, enquanto o Reino Unido aparece em 19º. A ascensão do populismo de extrema-direita nas sociedades nórdicas é preocupante, no entanto os socialistas e os verdes dinamarqueses, suecos e os noruegueses gozam tradicionalmente de maior influência do que os seus congéneres britânicos.
Contudo, o modelo nórdico não é objeto de um entusiasmo acrítico. Em anos recentes, a Suécia, em especial, afastou-se da social democracia em direcção a um fundamentalismo de mercado, começando com a privatização total ou parcial de 35 das 70 empresas estatais, a partir de 1990. O impacto desta venda pública ao preço da chuva não foi positivo. De acordo com a OCDE, nos últimos 25 anos, a Suécia experimentou o mais rápido crescimento em matéria de desigualdade do que qualquer outra sociedade desenvolvida. No último ano, Estocolmo assistiu a cinco noite de tumultos – um protesto contra o crescimento do desemprego, a injustiça social e a imigração. Hoje, a Suécia é um laboratório de medidas reformistas de mercado livre e um farol para fanáticos Con-Dem [Conservative-Liberal Democrat coalition, coligação no poder no Reino Unido].
Embora, comparadas com a Grã-Bretanha, a Noruega e a Dinamarca continuem a ser modelos de ética geopolítica, ambos os países ainda apresentam as suas falhas. Sucessivos governos dinamarqueses têm sido apoiantes entusiásticos da ocupação do Afeganistão pelas forças da NATO, e todos países nórdicos estão inquestionavelmente ao lado da América na guerra contra o terrorismo. A empresa petrolífera estatal norueguesa, Statoil, admirada por muitos nacionalistas escoceses, fez investimentos duvidosos, lesivos não só dos direitos humanos como para a preservação do ambiente.
Mas inúmeros exemplos apontam na direcção oposta.
Na Finlândia, é ilegal aumentar o valor das propinas ou penalizar crianças por inaptidão escolar. Até aos sete anos, os alunos não têm aulas no sentido habitual do termo, só fazem jogos, e dirigem-se aos professores pelo nome próprio. Além disso, como relata o The Guardian, “não há inspetores, não há exames até aos 18 anos, não há tabelas classificativas, não há negócios de aulas particulares, não há uniformes nas escolas”. Ideias como estas são condenadas pelo New Labour, e também não são atrativas para Michael Grove. E a Finlândia tem os mais altos níveis educacionais do mundo, são pioneiros na área da economia baseada no conhecimento, ocupando o terceiro lugar na competição global.
As lições para a Escócia são claras. Os países com níveis de taxação mais altos que o Reino Unido não têm de enfrentar um êxodo de ‘talentos’, proclamam os unionistas. Se gastarmos mais avisadamente em educação, acompanhando isso com um sistema de educação anti-elitista, conseguiremos ter – e manter – os nosso talentos. As pequenas economias não são menos seguras do que as grandes economias. Reino Unido, Itália e Espanha, todos sofreram as consequências de prolongadas crises, e os países pequenos que experimentaram a desregulação Anglo-Saxónica, como a Islândia e a Irlanda, foram menos severamente atingidos do que as economias do núcleo Norte. Apesar dos erros, os países escandinavos continuam a situar-se entre as mais sólidas economias do mundo e mantêm, apesar das reformas neo-liberais, um grau significativo de comunidade e de propriedade do governo.
O modelo nórdico é importante porque demonstra que a Escócia pode fazer melhor. Apoiado como está na indústria de serviços financeiros e na mão de obra barata, o capitalismo britânico é estruturalmente fraco. Uma Escócia independente não deve ambicionar simplesmente a imitar a social-democracia escandinava. Deve adoptar as suas melhores facetas – infraestruturas públicas e industriais fortes, baixos níveis de desigualdade, sistema educativo de primeira – e adaptá-las às necessidades específicas da Escócia. Então a Escócia poderá estabelecer as suas próprias prioridades.
James Foley e Pete Ramand integram a Radical Independence Campaign.
Publicado originalmente no site Bella Caledonia, a 25/03/2014. Traduzido por Isabel Gentil
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