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Futebol: o ópio do povo?

Apresentamos aqui os pontos de vista de Óscar Mascarenhas e de Nuno Domingos sobre o mais popular desporto de Portugal.
A crítica à presença exagerada do futebol nos media deve ser realizada a partir da vontade de conhecer o fenómeno, tanto do ponto de vista histórico, como a partir da sua inscrição social contemporânea.
A crítica à presença exagerada do futebol nos media deve ser realizada a partir da vontade de conhecer o fenómeno, tanto do ponto de vista histórico, como a partir da sua inscrição social contemporânea.

Os media são colonizados por notícias sobre futebol

Por Nuno Domingos

Progressivamente, o futebol foi ganhando um lugar destacado no espaço público e publicado português. Esta intensa presença deve ser criticada. A situação actual é o ponto mais agudo de um processo de colonização dos media por notícias sobre futebol. Não se trata apenas das notícias sobre as competições ou os relatos e transmissões das mesmas, mas toda a cobertura de um conjunto de acontecimentos que envolvem o próprio jogo, já para não falar do espaço de comentário que o futebol entretanto conquistou. A análise desta situação deve passar sobretudo por uma crítica à evolução do campo mediático em Portugal. O campo mediático, mais do que o futebol em si, constituirá o centro deste problema.

A crítica a esta presença exagerada do futebol deve ser realizada, no entanto, a partir da vontade de conhecer o fenómeno, tanto do ponto de vista histórico, como a partir da sua inscrição social contemporânea. Só assim se evitará uma critica precipitada que, à medida de outras críticas à cultura popular, parece por vezes responder apenas a determinados preconceitos de classe.


Escola de vadios

Na impossibilidade de poder escrever um texto especialmente destinado ao debate de hoje, recupero aqui algo que escrevi em março de 2000, mas que continua a refletir o essencial do meu pensamento sobre o tema. Por Óscar Mascarenhas.

A todos causou indignação ou, no mínimo, consternação, o que se passou na assim chamada assembleia geral de certo clube. Mas, curiosamente, a ninguém causou surpresa. Já vai sendo hábito, já está a transformar-se na nova (in)cultura do clubismo: nos momentos cruciais, as assembleias gerais de clubes têm a crescente tendência para deixarem de ser uma instância de debate e decisão democrática para se transformarem tão-somente em lugares mal frequentados. E com a maldição de serem sempre depois de jantar!...

Vamos agora a um ajuste de contas, isto é, saber quem é que deve ser responsabilizado pelo que se passou. Os verdadeiros culpados ultrapassam as fronteiras do clube e passeiam-se por zonas bem mais confortáveis e perfumadas, desfrutando a autocontemplação de um exercício irresponsável de se exibirem parlapatando diante de milhões, recorrendo a todas as desonestidades intelectuais, truques de rábula, grosserias de taberna e até ameaços de confronto físico. Refiro-me, como todos percebem – menos eles, felizes como andam à procura de cotão no umbigo –, aos supostos intelectuais, artistas, políticos e outras figuras de estrado que se alaparam nas televisões a discutir as minudências do coice em cuecas a que, quando jogado e aplaudido com gosto, se dá o nome de futebol.

O que fizeram os jagunços ocasionais da suposta assembleia do Benfica que não tivesse já sido ensinado por senhores de posição que, para mais, se gabam de fazer – segurem-se! – pedagogia na televisão?! Imagino que alguns desses cavalheiros, de tão contentes que estão consigo próprios, se sintam sinceramente predestinados para exprimir sábias opiniões sobre futebol. E até haverá alguns que cuidam ter uma atitude bem superior à mesquinha clubite dos outros. Haja uma alma caridosa que explique àqueles senhores que não, que não é isso o que realmente fazem.

Primeiro: ao contrário do que pensam, os seus sublimes pensamentos são apenas ouvidos pelos espectadores «da cor», que esperam, de alguém propagandeado como mais inteligente e capacitado, os argumentos e contra-argumentos que precisam de ter, no dia seguinte, no emprego ou no café. Em suma: procuram carregar de autoridade as baterias da conversa fiada.

Segundo: ao contrário do que julgam, todos esses debates (a começar na televisão de serviço público, onde até pugilato se ensaiou) acabam do mesmo modo, em grosserias e picardias e centram-se na discussão imbecil do que há de mais imbecil para discutir no futebol.

Terceiro: ao contrário do que se propõem, os debatentes funcionam como incitadores à violência, seja sobre os árbitros, seja sobre os dirigentes dos adversários, seja mesmo sobre os jogadores, transformados em objetos de apropriação e espiolhamento de intimidades pelo simples facto de serem empregados do clube.

A miséria maior do que estes intelectuais e notórios têm feito é reproduzir, como inevitável, o modelo ideológico e social que domina o futebol e que transforma os adeptos em vadios. Explico-me: uso aqui a palavra vadio, porque lumpen, do velho Marx, até poderia soar a coisa boa, mas é de lumpen que se trata, de gente que já não anseia por modelos sociais de igualdade e liberdade, mas pelo usufruto – nem que seja em sonho de momentos de dominação e exploração do outro. Os adeptos que, mal raia o dia, se colam às vedações dos estádios observando os atletas como cavalos em picadeiro reproduzem o mesmo raciocínio dos cartolas do grémio. A facilidade com que ali «despedem» jogadores e treinadores e os classificam como «chulos» ou «calões» em nada distingue esses adeptos dos donos do clube, com a diferença que aqueles não mandam nada. Mas sonham que. E isso é-lhes suficiente. Os intelectuais e notórios que têm ido às televisões não fazem outra coisa senão alimentar essa ilusão doentia.

Se o fascismo se tivesse lembrado de pôr estes intelectuais e notórios a discutir o coice em cuecas na televisão ainda hoje teríamos Câmara Corporativa.

Óscar Mascarenhas Jornalista 

(...)

Neste dossier:

Fórum Socialismo 2014

O Fórum Socialismo 2014 – Debates para a Alternativa reuniu 320 pessoas em Évora, entre os dias 29 e 31 de agosto, que participaram em cerca de 40 sessões plenárias, mesas redondas, painéis e conversas. 

Impõe-se que o processo de privatização dos transportes em Lisboa e no Porto seja imediatamente suspenso e que o Governo negoceie a transferência da gestão e propriedade. Foto de Michael Day

Privatizações dos transportes: é bom para quem?

O atual Governo tem prosseguido uma política de destruição dos transportes públicos.

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O que há de novo em Thomas Piketty?

É indisfarçável o incómodo dos economistas liberais com o Capital no Século XXI. Atribuiem à obra um fundamentalismo ideológico, esgravatam para desmentir a realidade dos dados, convidam-no a estudar as experiências soviéticas. Por Gonçalo Pessa.

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De que é a esquerda não pode abdicar?

A esquerda tem a obrigação de quebrar o “monopólio dos profissionais” políticos, em que a uns é dada a função de fazer a política e a outros é dada a possibilidade de os seguir ou apoiar. A esquerda deve ser capaz de envolver todos e todas, deve ser inclusiva, pedagógica. Basta lembrar os tempos do PREC, as canções do GAC ou os cadernos de educação popular, para perceber que uma verdadeira esquerda quer – autenticamente – que todos as pessoas se assumam como atores políticos. Por Inês Barbosa, Investigadora, do movimento de cidadãos de Braga.

Catarina Martins: “Nós já pagamos, só nos falta mandar”. Foto de Paulete Matos

Bloco contra a reprivatização do Novo Banco e pelo controlo público da banca

Catarina Martins afirma que o Estado “não pode limpar um banco sistémico e devolvê-lo, limpinho, a banqueiros privados que provaram não ter vocação para gerir bancos”. Considerando que esta intervenção deve ter retorno para os contribuintes, a coordenadora do Bloco defende o controlo público sobre todo o sistema bancário.  

Semedo: Bloco defende convergência, mas não uma mera alternância

O coordenador do Bloco de Esquerda afirmou na abertura do Fórum Socialismo 2014 que da disputa interna no PS não vai nascer uma alternativa de esquerda. João Semedo sublinhou que o Bloco defende “a convergência, o diálogo e a aproximação”, mas não está disponível “para dar o braço a quem faz da política uma simples rotação”.

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Francisco Louçã: Portugal precisa de união muito forte contra a austeridade

No Fórum Socialismo 2014, Francisco Louçã defendeu a necessidade de “uma união muito forte” em Portugal contra a austeridade, alertando que o país tem “20 anos de protetorado pela frente”, o que o torna numa “democracia pequenina”.

João Ferreira do Amaral foi entrevistado pelo Esquerda.net

“É benéfico para Portugal sair do euro”

O economista João Ferreira do Amaral defendeu no Fórum Socialismo 2014 que Portugal não tem sustentabilidade na zona euro, e que a saída seria fundamentalmente a forma de reforçar o crescimento económico e alterar a estrutura produtiva do país no sentido de uma melhor inserção na globalização.

Pedro Filipe Soares: BES foi alvo de gestão danosa pela família que o detinha e objeto de um saque.

BES: “Maioria governamental não pode ser força de bloqueio em comissão de inquérito”

Num debate no Fórum Socialismo 2014, Pedro Filipe Soares salientou também: “O Governo tinha prometido que nem um cêntimo dos contribuintes ficaria em risco. O que vemos agora é que não são cêntimos, são centenas de milhões que poderão estar em causa com esta solução”.

Marc Blyth

Austeridade: História de uma ideia perigosa

Apresentação de Mariana Mortágua sobre a história da austeridade com base no livro de Marc Blyth Austerity: "The History of a Dangerous Idea".

“Por uma Europa dos povos e dos direitos sociais, contra a que aniquila o Estado social”

No Fórum Socialismo 2014, Marisa Matias salientou que os casos da Grécia e de Espanha, dão “esperança” numa “Europa que volte a ser a Europa dos povos e dos direitos sociais. Miguel Urban, do partido espanhol Podemos, afirmou que “não democratizar a Europa” será “o pior” que se pode “fazer aos povos europeus e o melhor aliado” para a extrema-direita.

Apesar do seu louvor ao campo e às ‘alegrias do trabalho agrícola’, nem Salazar nem Cavaco Silva delinearam estratégias para desenvolver esta atividade e o mundo rural em Portugal.

‘Old Wine in New Bottles’?

O que (não) há de novo no horizonte (2020) para o desenvolvimento rural e a agricultura em Portugal. Por Elisabete Figueiredo.

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Futebol: o ópio do povo?

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A regressão social que vivemos, com o desmantelamento do Estado Social e com a redução de salários e de direitos, faz aparecer alternativas que fogem ao confronto com o capitalismo. Foto de Paulete Matos

Rendimento Básico Incondicional (1)

A mesa redonda sobre o Rendimento Básico Incondicional apresentou dois pontos de vista. Pra Adriano Campos e Ricardo Moreira, desistir da exigência do pleno emprego é anunciar a morte do direito ao trabalho.

As políticas redistributivas, além de se terem revelado ineficazes, têm também provocado nas pessoas uma atitude de desconfiança em relação ao Estado social. Foto de Paulete Matos

Rendimento Básico Incondicional (2)

A mesa redonda sobre o Rendimento Básico Incondicional apresentou dois pontos de vista. Neste artigo, Roberto Merrill examina a crítica ao RBI que considera a mais pertinente – a “objeção da exploração”.  

Trabalhos de casa

Trabalhos de casa: são uma seca? (1)

Na mesa redonda sobre os TPC apresentaram-se dois pontos de vista diferentes. Aqui, o texto “'Trabalhos de Casa' uma questão na ordem do dia ”, de Maria José Araújo.

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"Trabalhos de casa": são uma seca? (2)

Na mesa redonda sobre os TPC apresentaram-se dois pontos de vista diferentes. Aqui, o texto de Serafim Duarte.

Fotogaleria do Socialismo 2014

Acompanhe o olhar da fotógrafa Paulete Matos, que acompanhou o Fórum Socialismo 2014 - Debates da Alternativa.

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Porque é que é irrealista cumprir este Tratado? Os dados históricos revelam-nos que os saldos orçamentais estruturais, mesmo os dos países do centro da UE, muito raramente cumprem os requisitos estipulados no Tratado. Por Samuel Cardoso.

Neoliberalismo, fetichismo técnico-cientificista e ciência

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Os movimentos "open data" são um desenvolvimento recente e localizado de luta pelo acesso à informação pública, e têm vindo a obter frutos em vários países, incluindo a UE, incentivando os governos e agentes políticos a publicar livremente a informação pública. Por Ricardo Lafuente

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Nos últimos anos os movimentos trans (transexuais e transgénero) têm vindo a confluir numa reivindicação base muito concreta, mas nem por isso tão fácil de colocar em prática: o reconhecimento legal da identidade de género. Por Júlia Mendes Pereira

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Os drones estão a ajudar à criação de um estado de guerra permanente, banalizando o uso da força letal e erodindo os direitos humanos, facilitando a escalada da guerra.