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Da antiglobalização ao governo de esquerda

A Coligação da Esquerda Radical surgiu em 2004 e resulta de um processo de diálogo iniciado em 2001 entre muitas correntes da esquerda grega, de inspiração socialista, eurocomunista, ecologista, maoísta e trotskista. Hoje a Syriza é composta por doze organizações e muitas personalidades independentes, entre elas algumas figuras que se afastaram do PASOK nos últimos anos.

Em 2001, o movimento alterglobal atingia um dos seus pontos mais altos, com centenas de milhares de europeus nas ruas de Génova contra os senhores do mundo que eram hóspedes de Berlusconi na cimeira do G8. A repressão policial demorou anos a ser condenada na justiça italiana, mas as cimeiras passaram a realizar-se ainda mais às escondidas.  A mobilização grega para esse protesto foi uma das primeiras tarefas do Espaço de Diálogo para a Unidade e Ação Comum da Esquerda, que agrupava várias correntes que já se tinham encontrado noutras lutas, como a oposição à intervenção militar no Kosovo, as privatizações ou a legislação antiterrorista que ameaçava as liberdades civis na Grécia. O "Espaço" foi também determinante para organizar o Fórum Social Grego em 2003.

A figura de referência do "Espaço" era Manolis Glezos, o conhecido resistente ao nazismo que em maio de 1941 subiu à Acrópole e tirou de lá a bandeira da suástica, no que ficou conhecido como o primeiro acto de resistência do povo de Atenas contra a ocupação da cidade no mês anterior. Glezos foi o candidato da aliança eleitoral promovida pelo "Espaço" em 2002 à super-autarquia de Atenas-Piraeus, obtendo 10,8% dos votos. Dez anos depois, voltou a aparecer ao lado de Alexis Tsipras no comício da Syriza em Atenas antes de encerrar a campanha eleitoral.

A coligação Syriza apresenta-se pela primeira vez a votos com programa eleitoral próprio nas legislativas de 2004 e consegue passar a barreira dos 3% para eleger seis deputados, todos pertencentes à corrente maioritária, o Synaspismos.  A coligação conseguiu sobreviver à tensão interna com a substituição da liderança do Synaspismos no fim desse ano e ganhou novo fôlego com a organização do Fórum Social Europeu em Atenas dois anos depois.

2006 foi também ano de eleições autárquicas, com um jovem de 32 anos a ser lançado para a disputa eleitoral em Atenas com o objetivo de abrir o movimento às novas gerações. Alexis Tsipras, líder estudantil nos anos 90 e responsável pelo sector juvenil do Synaspismos, repetiu o resultado de Glezos quatro anos antes e tornou a Syriza na terceira força política na capital grega.

As eleições seguintes (legislativas em 2007 e 2009 e europeias de 2009) vieram confirmar a coligação como uma força ascendente no panorama político nacional, ao mesmo tempo que registaram um alargamento das forças que compõem a coligação. Alexis Tsipras sucedeu a Alekos Alavanos na liderança do Synaspismos e tornou-se líder parlamentar após as eleições de 2009. No ano seguinte enfrentou uma cisão importante no seu partido, que retirou quatro dos treze deputados da coligação para formarem um novo partido, a Esquerda Democrática.

A luta persistente contra a austeridade do governo da troika e os efeitos desastrosos das políticas da crise impostas pela direita e pelo PASOK, bem como a atitude de abertura para a unidade da esquerda por um governo de alternativa aos diktats de Berlim e Bruxelas, tudo isso ajudou a catapultar a Syriza para a primeira linha da oposição na Grécia. Ao contrário do KKE, que se entricheirou na sua linha política nacionalista e cujas práticas sectárias no movimento dos trabalhadores e nas lutas populares não tem paralelo hoje na Europa, a Syriza conseguiu nos últimos anos alargar a sua base de apoio também entre os Indignados da Praça Syntagma e transmitir ao povo grego a esperança de que é mesmo possível derrotar a troika e evitar o colapso do país.

Actualmente, fazem parte da Syriza doze organizações. A corrente maioritária é o Synaspismos, uma antiga coligação entre comunistas que se transformou em partido na sequência da purga de 45% do Comité Central do PC grego após o fim da URSS. As outras organizações são a AKOA (Esquerda Comunista Ecológica e Renovadora, membro observador do Partido da Esquerda Europeia); DEA (Esquerda Internacionalista dos Trabalhadores, próxima da tendência trotskista internacional IST, fundada por Tony Cliff); DKKI (Movimento Democrático Social, corrente que saiu do PASOK em 1995); KOE (Organização Comunista da Grécia, de inspiração maoísta, integrou a Syriza em 2007); Kokkino (Vermelho, corrente de inspiração trotskista); Ecosocialistas da Grécia; Cidadãos Activos (corrente fundada pelo herói da Resistência Manolis Glezos); KEDA (Movimento pela Esquerda Unida na Ação, cisão do PC grego em 2000); Rizospastes (Radicais, cisão dos Cidadãos Activos, sublinham o patriotismo no discurso); Omada Roza (Grupo Rosa, esquerda radical); e APO (Grupo Político Anticapitalista, corrente de inspiração trotskista).

Para além destas organizações e partidos, e principalmente durante este ano, o Syriza tem sido apoiada por pessoas com diferentes experiências de militância. Nesta campanha para as eleições de 6 de Maio, as mais fortes na polarização contra a troika, deram a cara pela coligação antigas figuras do PASOK como a ex-deputada e atleta olímpica Sofia Sakorafa - que acabou por ser a candidata mais votada – ou Alexis Mitropoulos, responsável pelo desenho das leis laborais nos anos 80. Também Stathis Kouvelakis, professor de Filosofia no King´s College em Londres e Despina Spanou, dirigente do sindicato da função publica Adedy, deram o seu apoio à Syriza nesta campanha.

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Neste dossier:

O que é a Syriza?

A derrota dos partidos da troika nas eleições de 6 de maio é fruto da resistência social que nos últimos anos tem marcado a vida política na Grécia. Nas urnas, o eleitorado recompensou as propostas socialistas da coligação Syriza e deram-lhe a responsabilidade de liderar a oposição à austeridade e à ruína do país.
Dossier organizado por Luís Branco.

Alex Tsipras: está a ser travada uma verdadeira “guerra entre o povo e o capitalismo”

Numa entrevista ao Guardian, Alex Tsipras defendeu que “a derrota é uma batalha não travada”, sendo que o povo grego está a “lutar para vencer". A derrota do capitalismo não será, para Tsipras, “apenas uma vitória para a Grécia, mas para toda a Europa".

Da antiglobalização ao governo de esquerda

A Coligação da Esquerda Radical surgiu em 2004 e resulta de um processo de diálogo iniciado em 2001 entre muitas correntes da esquerda grega, de inspiração socialista, eurocomunista, ecologista, maoísta e trotskista. Hoje a Syriza é composta por doze organizações e muitas personalidades independentes, entre elas algumas figuras que se afastaram do PASOK nos últimos anos.

"A saída do euro seria um desastre também para os credores estrangeiros"

Em entrevista ao esquerda.net, o responsável pela política europeia do maior partido da coligação Syriza explica a origem e a política do movimento que mudou o mapa político grego e é apontado como favorito às próximas eleições. Yiannis Bournous diz que "está em marcha uma campanha para aterrorizar os eleitores" e pede o apoio dos cidadãos europeus de esquerda ao programa alternativo que a Syriza apresenta.

"Como não nos podem expulsar do euro, tentam que nós nos vamos embora"

A deputada mais votada da Syriza nas últimas eleições foi a antiga atleta olímpica que rompeu com a bancada do PASOK quando votou contra o primeiro plano  da troika na Grécia. Nesta entrevista, Sofia Sakorafa defende uma auditoria à dívida e uma investigação política ao destino desse dinheiro. Por Gemma Saura, do La Vanguardia.

A saída da crise está à esquerda

Publicamos neste dossier o resumo dos compromissos programáticos apresentados pela Syriza ao eleitorado nas eleições do passado dia 6 de maio.

Quem é Alexis Tsipras?

Aos 37 anos, o engenheiro civil nascido poucos dias depois da queda da junta militar grega, em julho de 1974, diz estar preparado para  corresponder ao apoio popular e vir a liderar o primeiro governo de esquerda decidido a romper com a receita neoliberal que afundou o seu país.

Carta de Alexis Tsipras a Durão Barroso

Texto integral da mensagem de Alexis Tsipras ao presidente da Comissão Europeia, enviada após ter devolvido o mandato para a formação de governo, na qual chama a atenção para o facto de a solução para os actuais problemas globais estar ao nível europeu.

"As politicas de 'austeridade' exigem suprimir os laços sociais"

Nasos Iliopoulos é uma figura emblemática da Syriza. Secretário de juventude do Synaspismos, o maior partido entre os que compõem a coligação, tem menos de trinta anos, veste-se de forma casual, é eloquente e amistoso. Sentiu na pele os efeitos da repressão. Há um ano, foi brutalmente espancado pela polícia e hospitalizado com ferimentos múltiplos. Foi entrevistado em fevereiro por Alex Nunns, do Red Pepper.

Mensagem de solidariedade do Bloco de Esquerda

Na sequência do resultado eleitoral de 6 de maio, o Bloco de Esquerda enviou uma mensagem de solidariedade e de apoio à iniciativa da Syriza de tentar formar um governo de esquerda para romper com a troika e assim respeitar o mandato popular que deu larga maioria às forças opostas ao memorando que empurrou a Grécia para a catástrofe social e económica.