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Barcelona: O Bairro Gótico, paradigma da turistificação da cidade

O exemplo de Barcelona, que tem vindo a viver um verdadeiro boom turístico nos últimos anos, é seguido com muita atenção por cidades como Amesterdão, Berlim, Roma e Lisboa.
Com 1,6 milhões de habitantes, Barcelona recebe atualmente 30 milhões de turistas por ano, dos quais 15 milhões dormem na cidade, em hotéis e alojamentos turísticos, e outros 15 milhões nos seus arredores.
Nesta cidade catalã, o setor turístico gera 20 milhões de euros ao dia, o equivalente a 12% do seu PIB, ou 20% se contarmos com o impacto indireto, e, segundo dados da Segurança Social, emprega 90.000 pessoas.
Tal como assinala o El País , o crescimento pronunciado do turismo tem-se traduzido no aumento considerável do valor das rendas, na privatização de espaços públicos como o Park Güell, na destruição do tecido social e comercial do centro, em problemas de higiene, ruído, segurança, mobilidade e estacionamento.
O turismo é considerado o quarto problema mais grave da cidade, a seguir ao desemprego, à insegurança e a limpeza, segundo uma sondagem municipal.
Bairro Gótico: Gentrificação e desigualdades urbanas
O Bairro Gótico, um dos quatro bairros do centro histórico - a Ciutat Vella, é o paradigma da pressão que se faz sentir sobre a cidade e sobre os seus moradores, pelo que o processo de gentrificação nesta área tem vindo a ser alvo de estudo por parte de investigadores como Antonio López Gay e Agustín Cócola Gant.
Em outubro de 2015, existiam, em Barcelona, 14.539 apartamentos registados no Airbnb, o equivalente a 2,2% dos domicílios existentes. Contudo, estes alojamentos concentravam-se nas áreas centrais da cidade, sendo que na Ciutat Vella a proporção era de 9,6%. Já o Bairro Gótico contava com uma proporção de 16,8%, ou seja, 1 em cada 6 apartamentos estavam registados no Airbnb.
Mais de metade dos edifícios (52%) do Bairro Gótico albergam andares turísticos e as camas de apartamentos e hotéis já quase atingem o número total de moradores: a proporção entre camas hoteleiras e moradores na Ciutat Vella é de um lugar por cada 4,9 moradores, mas no Bairro Gótico é de uma cama por cada 1,6 moradores.
O aumento acentuado do turismo e o crescimento do alojamento local traduziram-se no aumento das rendas de 6% num só ano.
A gentrificação no Bairro Gótico é promovida de várias formas: 1.191 dos atuais alojamentos locais foram outrora destinados a residentes de longa duração. Em algumas situações, os inquilinos foram compensados economicamente para sair antes do termo do contrato. Noutros casos, o proprietário não renovou o contrato. Segundo Agustín Cócola Gant, o assédio e a degradação das habitações também têm sido usados para forçar os inquilinos a sair.
Os moradores são ainda excluídos do espaço devido ao facto de 16,8% dos apartamentos terem sido retirados do parque habitacional e reservados apenas ao alojamento turístico, o que levou ainda ao aumento dos valores das rendas.
Os problemas de convivência, nomeadamente no que respeita ao ruído, também são apontados como uma das causas da gentrificação.
Nos últimos 10 anos, 17,6% da população abandonou o bairro. Entre 2011 e 2015, o decréscimo da população foi de 8%.
Conforme assinalam Agustín Cócola Gant e Antonio López Gay, na última década, a composição do Bairro Gótico sofreu profundas transformações.
A faixa etária dos 25 aos 39 anos registou um forte aumento, representando atualmente 40% da população, o que é justificado pela chegada de estrangeiros, particularmente cidadãos europeus ocidentais, que representam mais de um terço da população nessa faixa etária. Os moradores nascidos em Barcelona na faixa etária 25-39 totalizam somente 17% da população. Há alguns anos atrás, a população acima de 65 anos era o maior grupo do bairro.
Por outro lado, apenas 8,5% da população tem menos de 15 anos, o que representa a menor proporção entre os 73 bairros da cidade. O Bairro Gótico tem ainda a maior proporção de adultos entre os 25 e os 59 anos para as crianças dos 0 aos 14 anos - 7,6 comparado, sendo a média da cidade de 4,1.
Os problemas no Bairro Gótico não passam apenas pela habitação: "O comércio e vida quotidiana também são afetados. Os moradores vão-se embora porque não têm os serviços de que necessitam. Com o turismo massivo, a farmácia passa a ser una gelataria e o talho uma loja de souvenirs", assinala o investigador Agustín Cócola Gant.
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