Meloni ataca festas "rave" e permite marchas fascistas

01 de novembro 2022 - 21:03

A nova primeira-ministra neofascista de Itália aproveitou as notícias sobre uma “rave” para mostrar mão dura. Mas a oposição lembra que, ao mesmo tempo, permitiu uma marcha fascista que é ilegal e nomeou para vice-ministro das Infraestruturas um deputado fotografado com uma braçadeira nazi.

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Bignami fardado e com a braçadeira nazi.
Bignami fardado e com a braçadeira nazi.

No início desta semana, uma das notícias mais badaladas na comunicação social italiana foi a da prisão dos 14 organizadores de uma “rave” ilegal de Halloween em Modena e da apreensão de material no valor de 150.000 euros. Cerca de 4.000 pessoas ter-se-iam juntado no local e o barulho fez os residentes queixar-se às autoridades.

A recém-empossada primeira-ministra pós-fascista do país, Georgia Meloni, aproveitou o embalo mediático para anunciar na segunda-feira que o seu governo “não vai fechar os olhos à violação das leis”, irá apertar as regras contra as festas que não tenham licenciamento e criar um novo crime de “invasão para reuniões perigosas”, ou seja organização de “raves”, que terá penas de prisão entre três a seis anos. Para além disso, a partir de agora, qualquer festa com mais de 50 pessoas passará a ter de ser licenciada.

Contudo, o governo não foi tão contundente quanto à marcha que juntou milhares de fascistas no mesmo fim de semana em Predappio, a cidade natal de Benito Mussolini, para marcar o centenário da marcha sobre Roma que permitiu ao ditador fascista tomar o poder. Cerca de duas mil pessoas terão estado presentes, fazendo a saudação nazi-fascista e gritando palavras de ordem fascistas. De acordo com a lei italiana, as manifestações de apoio ao fascismo estão proibidas.

Sandra Zampa, senadora do maior partido da oposição, o Partido Democrático, criticou o facto do governo “não ter nada a dizer” sobre os fascistas “marcharem calma e alegremente” no centro da cidade, considerando vergonhoso que tenha sido permitido um evento de “nostálgicos de um regime que escreveu uma das mais vergonhosas páginas na história de Itália”. E questionou se “não se arrependiam pela violação da legislação que proíbe a reconstituição do partido fascista e a apologia ao regime”.

Entretanto, outro caso veio à baila que colocou em causa a tentativa de limpeza de imagem do seu partido, os Irmãos de Itália. Limpeza que a primeira-ministra procura fazer e na qual tem sido seguida por parte da imprensa, ao chamar de “centro-direita” a coligação entre um Berlusconi minoritário e dois partidos de extrema-direita.

Vice-ministro da suástica diz que foi uma "brincadeira"

Galeazzo Bignami, deputado dos Fd’I, foi nomeado na segunda-feira vice-ministro das Infraestruturas e Transportes. Será portanto braço direito de Salvini. Este advogado surge numa foto de 2005 com uma braçadeira nazi. Marco Furfaro, do Partido Democrático, diz que esta nomeação é “ofensa, uma indecência contra a Constituição, a memória, a História e para as vítimas da suástica”. Depois disso, em 2019, divulgou os nomes de residentes estrangeiros de um apartamento de habitação pública em Bolonha, dizendo que se estava “a cagar” para a sua privacidade.

Sobre o caso da braçadeira, o governante neofascista respondeu em comunicado a dizer que já se desculpou “mais do que uma vez” pelo sucedido, a dizer que a foto foi tirada “num contexto privado”, sendo “uma brincadeira entre amigos” e a tentar convencer que considera o nazismo como um “mal absoluto” e que é contra “todas as formas de totalitarismo, de expressões liberticidas e antidemocráticas”.

E não é a única nomeação sob escrutínio. Claudio Durigon tornou-se sub-secretário de Estado do ministro do Trabalho. O correligionário de Berlusconi é conhecido por ter proposto a alteração de um parque em Latina, Lazio, que tem o nome dos juízes anti-máfia assassinados, Giovanni Falcone e Paolo Borsellino, para regressar o de Arnaldo Mussolini, o irmão do chefe do Estado fascista. No governo anterior, no qual era sub-secretário do ministro da Economia, isto valeu-lhe a demissão. Agora regressa ao executivo.

Entretanto, Meloni continua a esforçar-se por passar a ideia de que o seu partido já nada tem a ver com o fascismo. No parlamento, declarou que condena as leis “ignominiosas” anti-judaicas de Mussolini como “o ponto mais baixo” da história da Itália. E diz que está mais ligada aos Republicanos norte-americanos e aos conservadores britânicos.

De um lado e do outro do espetro político, há quem desconfie das declarações e lembre, por exemplo, que o seu partido continua a ostentar a fascista chama tricolor. É o que pensa Mirco Santarelli, presidente do grupo de Ravenna unit dos Arditi d’Italia, que organizou a marcha fascista do passado fim-de-semana. Ao jornal La Stampa disse: “se Meloni deixasse o símbolo da chama, deixaríamos de votar nela. Já assumiu distâncias do nazi-fascismo porque compreendeu que era obrigada a isso. Seria como se um juiz me perguntasse se sou fascista. Eu responderia que não porque de outra forma iria ter problemas”.

Prioridade de Meloni: fim da vacinação obrigatória do pessoal de saúde

Na primeira conferência de imprensa do novo governo depois da sua tomada de posse uma das prioridades escolhidas por anunciar o fim da vacinação obrigatória do pessoal de saúde contra a Covid-19.

Numa altura em que a Organização Mundial de Saúde alerta que o número de infeções e hospitalizações está a voltar a subir, Orazio Schillaci, o novo ministro da Saúde, justificou a decisão porque pensa que “o panorama epidemiológico mudou, em particular a partir dos dados, podemos ver que o impacto nos hospitais é limitado e há uma diminuição das infeções e estabilização dos hospitais”. E porque “há falta de pessoal médico”. Com esta medida regressam ao trabalho os perto de 4.000 profissionais de saúde do país que não se quiseram vacinar, tendo ficado suspensos sem vencimento. Tratar-se-ia, alega o ministro, de “combater a escassez e garantir o direito à saúde”. Enrico Letta, secretário-geral do Partido Democrata contrapõe: “o primeiro ato do Governo é premiar os antivacinas”.