No início de dezembro, uma autarquia do Partido Socialista ameaçou despejar 100 pessoas sem alternativa. Entre o Natal e a passagem de ano, a Lei dos Solos foi alterada para por em prática um simplex urbanístico que promove a especulação imobiliária. Já em 2025, o Movimento Referendo pela Habitação viu a sua iniciativa chumbada pelo Tribunal Constitucional.
Estas frases, que podem ser lidas como cabeçalhos, enquadram as dificuldades da luta pelo direito à habitação digna na entrada do novo ano. “Estamos à deriva”, diziam os moradores do bairro auto-construído na Rua das Marinhas do Tejo. É o desespero de quem não sabe se tem casa amanhã, mas também – infelizmente – um mote que pode descrever a direção da política para habitação em Portugal.
No plano nacional, mas também no autárquico, assistimos à perversão de uma política para a habitação com dignidade e baseada na solidariedade. O mercado de habitação direciona a ação do governo, que quer “construir Portugal” à imagem dos fundos imobiliários, dos lucros para as construtoras e da especulação.
O exemplo da Rua das Marinhas do Tejo ilustra a mesma posição que os partidos do centro sempre tiveram em relação aos despejos, mas a ela soma-se uma tendência de desumanização das pessoas encabeçada por autarcas do Partido Socialista. Afinal, quando a indignação juntou os partidos e movimentos sociais para travar o despejo, a vice-presidente da Câmara de Loures ameaçou retirar as crianças às famílias em risco de despejo – e este não é um caso isolado.
A nova lei dos Lei dos Solos, que vai contra as indicações dos especialistas, não procura sequer resolver a crise de habitação, como alega o governo. Favorece quem quer lucrar com o mercado da habitação à custa de quem mal consegue viver em Portugal. É a continuação da política do governo a favor da especulação imobiliária, que permite ao mercado tomar as decisões sobre os preços das rendas e das casas sem qualquer intervenção estatal.
O chumbo do referendo pela habitação, em Lisboa, é símbolo de uma luta mais alargada e cultural contra a supremacia do direito à propriedade sobre todos os outros. Foi esse combate que o Movimento Referendo pela Habitação traçou nos últimos dois anos: a luta por uma cidade que seja para viver e não para lucrar. Agora, o movimento vê-se confrontado com um ponto final. Esperemos que consiga escrever a próxima frase.
Não são bons sinais para a luta pelo direito à habitação. No plano local, no plano nacional e na disputa cultural, há fortes avanços à direita e nenhum final à vista para a crise de habitação. Há mais pessoas a viver na rua e mais pessoas em risco de despejo, mas as manifestações fazem menos mossa. Cabe aos militantes do movimento social pensarem novas formas de unidade que consigam combater nestes três planos as ameaças que se avizinham em 2025.
