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A violência nas Prisões

“A violência, seja qual for a maneira como ela se manifesta, é sempre uma derrota” (Jean-Paul Sartre). A violência nas prisões – perpetrada pelos guardas ou pelos reclusos entre si – constitui abuso dos Direitos Humanos. Artigo de Pedro Krupenski.
“A violência, seja qual for a maneira como ela se manifesta, é sempre uma derrota” (Jean-Paul Sartre).

Apeteceria, a propósito deste tema, desenvolver algumas considerações sobre o facto de a violência nas prisões, perpetrada por, com o conluio de ou perante “vista grossa” dos Guardas prisionais, constituir uma agravação por via extrajudicial da pena de prisão. Com efeito, o juiz terá condenado o recluso a determinados anos de prisão, estando incluídas nessa medida, o cerceamento da liberdade individual que – a título excecional e por culpa tipificada – o recluso fez por merecer. Ouso optar, contudo, por escrever umas linhas sobre a medida em que tal violência – perpetrada pelos guardas ou pelos reclusos entre si – constitui abuso dos Direitos Humanos.

Prescreve o artigo 3.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos que “Todo o indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.” Aduz o artigo 5.º do mesmo diploma que “Ninguém será submetido a tortura nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes”. Prevê, por fim, o artigo 29.º desse articulado sexagenário composto por 30 artigos que: “No exercício destes direitos e no gozo destas liberdades [previstas na Declaração] ninguém está sujeito senão às limitações estabelecidas pela lei com vista exclusivamente a promover o reconhecimento e o respeito dos direitos e liberdades dos outros e a fim de satisfazer as justas exigências da moral, da ordem pública e do bem-estar numa sociedade democrática”.

Pela interpretação conjugada destes artigos concluiu-se que: todos temos direito à liberdade, só podendo ser limitados no gozo desta se (e nos seus limites) a lei ordinária o permitir. Quem comete crime, será limitado no seu direito à liberdade porque – em nome da ordem pública e do bem-estar social – a legislação penal assim o prevê e a Constituição da República Portuguesa e a Declaração Universal dos Direitos Humanos assim a permitem. Porém, “ninguém será submetido a tortura nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes”. Violência nas prisões – tratamentos cruéis – não é prevista pela legislação penal, não é permitida pela Constituição e é vedada pela Declaração Universal dos Direitos Humanos. Espancamentos nas prisões, abusos de autoridade, jogos de poder concretizados em violência física e moral, são tratamentos cruéis que não constituem parte da pena de prisão e, em abstrato, não constituem exceção ao direito à liberdade, na medida em que em nada garantem a ordem pública e o bem-estar social.

A pena de prisão não tem apenas um fim punitivo. Tem também um fim preventivo e deverá ter também como fim a reabilitação e a capacitação para reintegração no sistema de ordem e paz sociais. Reclusos – com propensão para a prática do crime – que lições tirarão de um contexto de violência, de coação moral e física?

As prisões portuguesas já não estão tão sobre lotadas quanto estavam há alguns anos atrás; Já não existe – há bem pouco tempo – o primitivo balde higiénico nos estabelecimentos prisionais nacionais; há menos consumo e tráfico de droga que outrora; as condições de higiene e segurança estão mais próximas dos padrões europeus. Há, contudo, uma chaga que persiste no sector: a violência.

O Conselho da Europa vai inspecionar, em 2012, as condições de vida nas prisões e outras instituições com pessoas detidas ou internadas (como é o caso dos lares de idosos) de Portugal e de outros países da Europa. Não é por acaso que o organismo do Conselho da Europa incumbido desta tarefa seja a Comissão da Prevenção da Tortura (CPT).

“A violência, seja qual for a maneira como ela se manifesta, é sempre uma derrota”. A justiça prisional portuguesa ainda está derrotada.

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Neste dossier:

Prisões e Direitos Humanos

A pena privativa de liberdade tem sido, muitas vezes, aplicada de forma desproporcional face aos crimes cometidos e o seu fim meramente punitivo tem sido privilegiado, em detrimento do seu pendor preventivo e do objectivo de reinserção do indivíduo na sociedade.  Dossier organizado por Mariana Carneiro.

Prisões portuguesas sobrelotadas e com condições "miseráveis"

No terceiro trimestre de 2011, os estabelecimentos regionais tinham cerca de 3235 reclusos para um limite de 2502 vagas. Prisões têm condições “miseráveis“ e média de mortes é o dobro dos países do Conselho da Europa. 

Longe da vista, longe da democracia?

Quando se fecham os portões de uma prisão, tudo o que lá se passa dentro não pode ser ignorado. Artigo de Helena Pinto.

O Noivo de Alcoentre

Há muitos, muitos anos, em 1979, para ser mais exacta, calhou-me fazer, para o Telejornal, uma peça sobre aquele que ficou conhecido como “o noivo de Alcoentre”, cujo nome já esqueci – e que, se recordasse, também não divulgaria, pois a pena que lhe foi aplicada não implicava, certamente, o ser apontado como criminoso pelo anos a vir. Artigo de Diana Andringa.

Vigilância: a prisão na nossa vida

É muito mais frequente ouvirmos o argumento da necessidade de segurança do que a problematização sobre a criação de uma sociedade em que somos vigiados directamente a todo o momento. Artigo de João Mineiro.

Para que servem as prisões?

A primeira ideia amplamente generalizada sobre “o porquê” da prisão é a de que a prisão serve para punir pessoas que cometeram um crime. Esta primeira ideia básica levanta desde logo interrogações imprescindíveis. Artigo de João Mineiro.

A violência nas Prisões

“A violência, seja qual for a maneira como ela se manifesta, é sempre uma derrota” (Jean-Paul Sartre). A violência nas prisões – perpetrada pelos guardas ou pelos reclusos entre si – constitui abuso dos Direitos Humanos. Artigo de Pedro Krupenski.

Recluso violentamente agredido por serviços prisionais

No início do ano, o Jornal Público divulgou um vídeo onde serviços prisionais agridem violentamente recluso. A denúncia deu origem à abertura de dois processos de inquérito por parte do Serviço de Auditoria e Inspecção da DGSP e da Inspecção Geral dos Serviços de Justiça.

Direitos Humanos e prisões

Falar de Direitos Humanos é, na melhor das hipóteses, falar de boas intenções. Falar de prisões é falar de más intenções. De tratamentos degradantes ou mesmo torturas infligidas para satisfação dos sentimentos de vingança. Artigo de António Pedro Dores.