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Memorando secreto mostra que Israel sabia que colonatos são ilegais

Um importante conselheiro que advertiu secretamente o governo de Israel, depois da Guerra dos Seis Dias de 1967, que seria ilegal construir colónias judaicas nos territórios palestinianos ocupados disse, pela primeira vez, que continua a achar que tinha razão. A declaração de Theodor Meron, conselheiro jurídico do Ministro dos Negócios Estrangeiros israelita na época e um dos principais juristas internacionais do mundo, é um sério golpe no persistente argumento israelita de que os colonatos não violam a lei internacional, particularmente no momento em que Israel comemora o 40º aniversário da guerra de Junho de 1967.

Artigo de Donald Macintyre, do The Independent, 26/5/07

A opinião jurídica, a cuja cópia o The Independent teve acesso, estava marcada com um carimbo "Top Secret" e "Extrema Urgência" e chegava à conclusão inequívoca, nas palavras do autor, "que colonatos civis nos territórios administrados transgridem as medidas explícitas da Quarta Convenção de Genebra."

O juiz Meron, presidente do Tribunal Internacional Criminal para a ex-Jugoslávia até 2005, disse que, depois de 40 anos de crescimento dos colonatos judaicos na Cisjordânia - um dos principais problemas a ser resolvido em qualquer acordo de paz: "Acredito que teria dado a mesma opinião hoje."

Sobrevivente do Holocausto, o juiz Meron também traz uma nova luz ao pós-guerra de 1967, ao revelar que o ministro dos Negócios Estrangeiros, Abba Eban, era "simpático" ao seu ponto de vista de que os colonatos civis entravam directamente em conflito com as convenções de Haia e de Genebra, que regem a conduta das potências ocupantes.

Apesar da opinião jurídica, que foi repassada ao primeiro-ministro Levi Eshkol, mas que não foi tornada pública na época, o governo trabalhista deu progressivamente os seu aval aos colonatos. Esta atitude abriu o caminho para o seu crescimento, até chegarem aos 240 mil colonos de hoje na Cisjordânia.

O juiz Meron, 76 anos, é hoje juiz de apelo do Tribunal. Falando acerca da sua opinião de 1967 pela primeira vez, ao The Independent, disse: "É óbvio que o facto de os colonatos terem sido criados e o seu alastramento tornaram a paz muito mais difícil."

Responsabilizando as restrições em relação aos palestinianos pela devastação da economia palestiniana, o Banco Mundial, no início deste mês, reconheceu as preocupações de Israel com a segurança, mas acrescentou que muitas das restrições tinham apenas como objectivo "aumentar a liberdade de movimentos dos colonos e a expansão física e económica dos colonatos à custa da população palestiniana." Os colonatos e a sua "jurisdição" controlam de facto cerca de 40 por cento da área da Cisjordânia.

O argumento de que os colonatos são ilegais, avançado em sucessivas resoluções da ONU, e pela opinião do Tribunal Internacional de Justiça que condenou a barreira de separação em 2004, é reforçado por tão importante fonte. Reforça também a argumentação política em negociações de "estatuto final" das fronteiras com os palestinianos, para trocas equitativas de terrenos entre o território de Israel e um futuro Estado Palestiniano, se Israel mantiver blocos de colonatos.

O memorando do juiz Meron foi obtido dos Arquivos do Estado de Israel. Foi escrito em Setembro de 1967, quando o governo Eshkol estava a encarar a possibilidade de construir colonatos judeus na Cisjordânia e nas Colinas do Golan, tomadas da Síria durante a Guerra dos Seis Dias. Diz que a comunidade internacional já tinha rejeitado o "argumento de que a Cisjordânia não é 'um território ocupado normal'."

Assinalava que o embaixador britânico na ONU, Lorde Caradon, já afirmara que a posição de Israel era a de potência ocupante. Acrescentava que um decreto do comando do Exército, dizendo que os tribunais militares iriam "cumprir as normas de Genebra", indicava que Israel pensava da mesma forma.

O memorando, de que foram publicados detalhes pelo escritor israelita Gershom Gorenberg no ano passado, também afirma que colonatos construídos em terras privadas transgridem explicitamente a Convenção de Haia de 1907.

O único reconhecimento implícito do memorando Meron - que, segundo Gorenberg também foi parar às mãos de Moshe Dayan, o vitorioso ministro da Defesa durante a Guerra dos Seis Dias - foi que um dos primeiros colonatos da Cisjordânia, Kfar Etzion, foi inicialmente chamado de "posto militar", apesar de ser, de facto, um colonato civil. O memorando diz que não existe proibição legal em relação a postos militares nos territórios ocupados.

Ehud Olmert apresentou-se às eleições israelitas do ano passado com um programa de retirada unilateral de partes da Cisjordânia - interpretada como o desmantelamento dos colonatos a leste da barreira de separação, que penetra profundamente em lugares da Cisjordânia. Mas esta estratégia foi abandonada depois da Guerra do Líbano.

Mark Regev, porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros, disse: "Não aceitamos que a Cisjordânia esteja ocupada no sentido clássico". Regev acrescentou que não se tratava de um território jordano soberano antes de 1967 e que não tinha estatuto legal desde o mandato britânico, que tinha a atribuição, com o apoio da Liga das Nações, de estabelecer um lar nacional judeu.

 

http://news.independent.co.uk/world/middle_east/article2584164.ece

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Neste dossier:

Palestina, 40 anos depois da Guerra dos Seis Dias

O dossier do Esquerda.net desta semana é dedicado à Palestina, 40 anos depois da Guerra dos Seis Dias, que terminou com a ocupação dos territórios palestinianos de Gaza, Cisjordânia e Jerusalém Oriental.

Da guerra ao apartheid

Israel obteve uma grande vitória militar na Guerra dos Seis Dias. Hoje, 40 anos depois, essa vitória aparece cada vez mais como uma vitória de Pirro. A opressão criada pela persistente ocupação; o sistema de colonatos dirigido a espoliar mais terras palestinianas e a encerrar o seu povo em verdadeiras prisões; os muros e os checkpoints criaram um sistema pior que o apartheid sul-africano. Um sistema totalmente injustificável aos olhos do Mundo.

Israelitas e palestinianos, 40 anos depois da Guerra dos 6 dias

Tenho 83 anos. No decurso da minha vida vi o ascenso dos nazis, e a sua queda. Pude observar a União Soviética nos seus momentos culminantes, e segui o seu desmantelamento. Um dia antes da queda do muro de Berlim, nenhum alemão acreditava que chegaria a ver esse instante. Os peritos mais astutos não o previram, porque na história há correntes subterrâneas que ninguém percebe no seu fluir real.

"A nossa libertação também libertará Israel dos males da ocupação"

O dia 4 de Junho de 1967 é um dia sombrio na história do povo palestiniano. É uma data que permanece gravada na memória colectiva tal como a Nakba - a catástrofe, o episódio que há 59 anos converteu o povo palestiniano num povo de refugiados, num povo sem pátria.

Entrevista: “Um dos governos mais representativos do mundo”

Nesta entrevista concedida à Der Spiegel Online, o Ministro da Informação palestiniano Mustafa Barghouti defende o governo de unidade palestiniana, que considera o mais democrático e representativo do mundo, e adverte que não se pode separar o presidente do governo, não se pode separar um ministro de outro, pelo facto de serem de facções diferentes. "Creio que alguns países continuam a ser demasiado influenciados por Israel e pela abordagem irracional do governo israelita", diz. Para Barghouti, os palestinianos apoiarão a Iniciativa Árabe, que fala de reconhecimento mútuo, se Israel estiver preparado para a reciprocidade e para aceitar um Estado palestiniano. "Que querem para além disso? Mas se alguém espera que os palestinianos desistam dos seus direitos e que fiquem satisfeitos com isso, comete um erro."

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Israel 2007: pior que o apartheid

Ronnie Kasrils, ministro de Segurança da África do Sul, esteve recentemente nos territórios ocupados e voltou com um veredicto claro: o que se vive hoje na Palestina é muito pior do que o pior pesadelo do apartheid sul-africano. De descendência lituana-judaica, Ronald Kasrils é membro do Comité Executivo Nacional do Congresso Nacional Africano (CNA) desde 1987, bem como do comité central do Partido Comunista da África do Sul desde Dezembro de 1986.