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Da guerra ao apartheid

Israel obteve uma grande vitória militar na Guerra dos Seis Dias. Hoje, 40 anos depois, essa vitória aparece cada vez mais como uma vitória de Pirro. A opressão criada pela persistente ocupação; o sistema de colonatos dirigido a espoliar mais terras palestinianas e a encerrar o seu povo em verdadeiras prisões; os muros e os checkpoints criaram um sistema pior que o apartheid sul-africano. Um sistema totalmente injustificável aos olhos do Mundo.

Artigo de Luis Leiria, Esquerda.net

Na manhã do dia 5 de Junho de 1967, a quase totalidade da aviação israelita (cerca de 200 aparelhos) descolou para apanhar de surpresa e destruir a aviação egípcia no solo. Começava assim, com um ataque de surpresa, a guerra-relâmpago que passaria à história como a Guerra dos Seis Dias e que mudaria desde então a relação de forças no Médio Oriente. O ataque destruiria mais de 300 aviões egípcios e cem pilotos; a aviação israelita perdeu apenas 19 aparelhos e conseguiu a supremacia aérea para o resto da guerra. Depois, avançaram as divisões terrestres.

A guerra foi travada entre Israel, de um lado, o Egipto, a Síria e a Jordânia do outro. Durou 132 horas e 30 minutos, na verdade menos de seis dias, mas a duração foi menor em duas frentes: quatro dias na frente egípcia, e apenas três dias no lado jordano. Apenas com a Síria os combates duraram a totalidade do tempo da guerra.

Terminadas as hostilidades, Israel obtivera uma grande vitória no terreno e afirmara-se como a grande potência militar da região. As tropas israelitas tinham ocupado a península do Sinai e a Faixa de Gaza ao Egipto, as colinas do Golan à Síria, e a Cisjordânia à Jordânia. Jerusalém, antes dividida, passava a estar "unificada" sob o controlo israelita.

Desde esses dias, apenas o Sinai, uma região desértica, foi devolvido ao Egipto, depois dos acordos de Camp David em 17 de Setembro de 1978. Os outros territórios permanecem ocupados. Jerusalém oriental foi oficialmente anexado em 30 de Julho de 1980, e as colinas do Golan em Dezembro de 1981. Muito antes disso já começara o processo de expropriação de terras nas zonas ocupadas, com a criação de colonatos judaicos em Gaza e na Cisjordânia. Colonatos que, sob todos os pontos de vista, são ilegais. Mas que não param de crescer.

A teoria que justificaria o avanço dos colonatos começou a ser construída logo em Julho de 1967, quando o vice-primeiro-ministro trabalhista Igal Allon concebeu um plano que previa a criação de uma "fronteira securitária" que permitia a construção de colonatos em todas as zonas conquistadas e que estendia a legislação civil aos territórios ocupados. O motivo seria a defesa e segurança de Israel, a palavra-chave que iria, durante 40 anos, justificar as atrocidades da ocupação, seja a expansão dos colonatos ou o muro que agora encerra os palestinianos numa enorme prisão, numa situação que foi denunciada pelo Ministro da Segurança da África do Sul como pior que a do apartheid da África do Sul.

Balanço de 40 anos
De facto, denunciou recentemente o ministro palestiniano da Informação, Mustafa Barghouti, a ocupação transformou-se num sistema de aparheid que pode ser identificado quando dois povos que habitam na mesma área são segregados pela força, e onde um lado persegue e oprime o outro.

Hoje, diz Barghouti, nos colonatos judaicos vivem mais de 460 mil colonos, sustentados numa estrutura de 543 checkpoints permanentes e 600 postos de controlo móveis, e estradas que só podem ser usadas pelos colonos, sendo proibidas aos palestinianos. É a primeira vez na história que se criam estradas segregadas, denuncia Barghouti. Este sistema foi consolidado pelo Muro, que tem por objectivo anexar os colonatos e novas fatias do território palestiniano.

Ao mesmo tempo, está em curso um processo de limpeza étnica em Jerusalém oriental, isolando a sua população palestiniana da Cisjordânia e rodeando-a de colonatos, judaizando a população desta parte da cidade.

Outro aspecto deste apartheid é a diferença de acesso aos recursos naturais. Os colonos da Cisjordânia dispõem de 2400 metros cúbicos de água por ano, comparada com apenas 50 metros cúbicos para os palestinianos.

Além disso, denuncia ainda Barghouti, em 1993 o Produto Nacional Bruto de Israel era 6 vezes superior ao da Palestina; subiu para 30 vezes superior em 2007. Os palestinianos são obrigados a comprar os produtos israelitas, ao mesmo tempo que Israel continua a reter os impostos palestinianos, que já chegam a 850 milhões de dólares.

(...)

Neste dossier:

Palestina, 40 anos depois da Guerra dos Seis Dias

O dossier do Esquerda.net desta semana é dedicado à Palestina, 40 anos depois da Guerra dos Seis Dias, que terminou com a ocupação dos territórios palestinianos de Gaza, Cisjordânia e Jerusalém Oriental.

Da guerra ao apartheid

Israel obteve uma grande vitória militar na Guerra dos Seis Dias. Hoje, 40 anos depois, essa vitória aparece cada vez mais como uma vitória de Pirro. A opressão criada pela persistente ocupação; o sistema de colonatos dirigido a espoliar mais terras palestinianas e a encerrar o seu povo em verdadeiras prisões; os muros e os checkpoints criaram um sistema pior que o apartheid sul-africano. Um sistema totalmente injustificável aos olhos do Mundo.

Israelitas e palestinianos, 40 anos depois da Guerra dos 6 dias

Tenho 83 anos. No decurso da minha vida vi o ascenso dos nazis, e a sua queda. Pude observar a União Soviética nos seus momentos culminantes, e segui o seu desmantelamento. Um dia antes da queda do muro de Berlim, nenhum alemão acreditava que chegaria a ver esse instante. Os peritos mais astutos não o previram, porque na história há correntes subterrâneas que ninguém percebe no seu fluir real.

"A nossa libertação também libertará Israel dos males da ocupação"

O dia 4 de Junho de 1967 é um dia sombrio na história do povo palestiniano. É uma data que permanece gravada na memória colectiva tal como a Nakba - a catástrofe, o episódio que há 59 anos converteu o povo palestiniano num povo de refugiados, num povo sem pátria.

Entrevista: “Um dos governos mais representativos do mundo”

Nesta entrevista concedida à Der Spiegel Online, o Ministro da Informação palestiniano Mustafa Barghouti defende o governo de unidade palestiniana, que considera o mais democrático e representativo do mundo, e adverte que não se pode separar o presidente do governo, não se pode separar um ministro de outro, pelo facto de serem de facções diferentes. "Creio que alguns países continuam a ser demasiado influenciados por Israel e pela abordagem irracional do governo israelita", diz. Para Barghouti, os palestinianos apoiarão a Iniciativa Árabe, que fala de reconhecimento mútuo, se Israel estiver preparado para a reciprocidade e para aceitar um Estado palestiniano. "Que querem para além disso? Mas se alguém espera que os palestinianos desistam dos seus direitos e que fiquem satisfeitos com isso, comete um erro."

Memorando secreto mostra que Israel sabia que colonatos são ilegais

Um importante conselheiro que advertiu secretamente o governo de Israel, depois da Guerra dos Seis Dias de 1967, que seria ilegal construir colónias judaicas nos territórios palestinianos ocupados disse, pela primeira vez, que continua a achar que tinha razão. A declaração de Theodor Meron, conselheiro jurídico do Ministro dos Negócios Estrangeiros israelita na época e um dos principais juristas internacionais do mundo, é um sério golpe no persistente argumento israelita de que os colonatos não violam a lei internacional, particularmente no momento em que Israel comemora o 40º aniversário da guerra de Junho de 1967.

Israel 2007: pior que o apartheid

Ronnie Kasrils, ministro de Segurança da África do Sul, esteve recentemente nos territórios ocupados e voltou com um veredicto claro: o que se vive hoje na Palestina é muito pior do que o pior pesadelo do apartheid sul-africano. De descendência lituana-judaica, Ronald Kasrils é membro do Comité Executivo Nacional do Congresso Nacional Africano (CNA) desde 1987, bem como do comité central do Partido Comunista da África do Sul desde Dezembro de 1986.