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Rui Moreira revelou-se um populista movido pela vaidade infinita

Ungido há 4 anos como o anti-Menezes, Rui Moreira consolida agora o seu projeto cesarista, centralista e populista de poder.

Um guia para compreender Rui Moreira

Ungido há 4 anos como o anti-Menezes, Rui Moreira consolida agora o seu projeto cesarista, centralista e populista de poder. Faltando pouco mais de um mês para as eleições autárquicas, vale a pena perceber o que nos espera.

O poder é uma aventura

Engana-se quem vê em Rui Moreira um homem avesso ao poder. É certo que, até 2013, não há no percurso deste filho acarinhado da burguesia portuense qualquer exercício legitimado de mandato popular. O berço que lhe garantiu fortuna haveria de lhe assegurar uma vida livre de apertos ou deveres profissionais antes dos 40. Mas não há sossego que não se acabe. O cargo de Presidente da Associação Comercial do Porto e a incursão pelo comentário desportivo garantiriam a inscrição de Rui Moreira no cenário político. O reconhecimento popular clubístico e o poder social projetado por uma gongórica associação patronal: disto se fez a disponibilidade de Moreira, ofertada à direita portuense ao longo de anos.

Disponibilidade que se cumpriu mas não explica o sucedido. Até hoje, são muitos os que insistem em categorizar Rui Moreira como um puro independente no cenário autárquico, à margem de todos os restantes enjeitados pelas lutas internas dos partidos do centrão. Segundo engano. Rui Moreira é o produto da divisão à direita no Porto. A candidatura de Menezes foi a senha, enquanto Rio, Miguel Veiga e Paulo Portas os garantes de um aparelho alternativo. O “movimento Rui Moreira”, popular e multicolor, foi e nunca deixou de ser uma fábula repetida em horário nobre.

O populismo é uma força

Do ensaio apressado de uma primeira campanha ao furor de um mandato que se acaba, Rui Moreira deixou a sua marca, que constitui o exercício de um tipo particular de populismo. E digo populista no sentido da tentativa de construção de uma identidade popular desde cima, dotada de um princípio de oposição – a luta contra Lisboa e contra os partidos – e apoiada na exortação de uma determinada representação de comunidade – o Porto maravilha nos holofotes do mundo. Independente do conteúdo (já lá iremos), Rui Moreira e a sua pequena equipa jogaram tudo na ideia de construção do “Porto.”, a cidade marca, invencível, homogénea e sem problemas.

A aposta na omnipresença de Moreira nos jornais, gizada por um incansável assessor de imprensa herdado de Valentim Loureiro, fez-se das promessas infinitas, dos anúncios mil vezes repetidos (mesmo que nada avançasse para lá da cultura) e, acima de tudo, da criação artificial de conflitos (do ataque ao Turismo de Portugal à querela com o Jornal de Notícias, não faltam exemplos). Mas ao contrário de Rio, o presidente encerrado no castelo, Moreira aliou o conflito à imagem de presidente do Povo. Nos antípodas da sua imagem pública nos anos anteriores, habitante das revistas cor-de-rosa, dos jantares de gala e dos encontro monárquicos, Moreira passou a ser o passeante dos bairros e o conviva das Fontainhas, tudo cronometrado e registado para a posteridade de um selfie made man.

Acontece que a força deste populismo é também a sua fraqueza, uma vez que se apoia numa mobilização fugaz e extemporânea. Quando Moreira passa, é Moreira que resta. Mais, a cada rachadela na ideia de Porto maravilha pintado com esmero, vemos as contradições: o elogio cosmopolita engolido pelo autoritarismo parolo de quem lança o DIAP na caça a uns autocolantes; a crítica ao clientelismo partidário por quem é incapaz de explicar o benefício pessoal no caso Selminho ou o apoio a António Fonseca, o inenarrável candidato à Assembleia de Freguesia do Centro Histórico a quem Moreira retirou a confiança política em 2015; o fantasma de Menezes, cobrando a justiça de quem atacou a política das promessas para agora a usar sem medida. Vaidade e prepotência, uma má receita.

No mercado está a consagração

Da origem à forma, não esquecer o conteúdo. Não, Moreira não é um radical nem um falcão da direita neoliberal, mas nem por isso deixa de ser um fiel seguidor do mercado. Durante o governo da troika, a sua anuência passiva à lógica austeritária obedeceu sempre à tentativa de acumular poder e influência regional. Para Moreira, as privatizações da ANA ou dos transportes públicos (Metro do Porto) não seriam um problema se obedecessem a um modelo faseado e autónomo, espartilhando cada uma das empresas. O mesmo valendo para a sua própria gestão, com a entrega a privados dos serviços de recolha do lixo e da rede de estacionamento público. No desmonte dos serviço públicos, Rui Moreira não faz campanha mas acompanha.

Com o novo ciclo político no país, Moreira foi obrigado a mobilizar-se ainda mais. O projeto de cidade entregue à especulação que se alimenta da habitação de luxo e do turismo não se coaduna com as medidas de proteção adotadas pela nova maioria no Parlamento. O prolongamento do regime transitório das rendas antigas, que protege os mais pobres e idosos, foi assim prontamente atacado por Moreira como uma afronta ao mercado, o mesmo valendo para o adicional de IMI que garantiu o aumento extraordinário das pensões. Entre os pensionistas e os habitantes da Marechal Gomes da Costa, Moreira é fiel à sua classe, batalhando para que não ocorra no Porto a mudança política que se impôs no País.

Mais do que um arranjo de poder, foi nesta visão e neste modelo de cidade que Rui Moreira confluiu com o Partido Socialista no Porto. Subscritor destas mesmas críticas, Manuel Pizarro foi fiel ao compromisso, garantindo a Moreira a aplicação ilegal do aumento nas rendas sociais, a manutenção do recurso a trabalho precário na autarquia, o modelo de PPP na reabilitação urbana, o encobrimento do caso Selminho, o modelo de concessão a privados no caso do Pavilhão Rosa Mota e de mais de metade do Matadouro.

A zanga de lugares nunca foi programática, como programática será a disponibilidade para um novo entendimento logo que se contem os lugares. Mesmo que se tenha revelado um populista movido pela vaidade infinita, Rui Moreira sabe que conta com o PS à falta de uma maioria absoluta.

Até lá, o voto no Bloco de Esquerda e no João Teixeira Lopes é o que melhor garantias dá para uma efetiva oposição a este centrão reconfigurado, onde Moreira é Rei e Senhor.

Artigo de opinião de Adriano Campos, candidato do Bloco nas listas à Câmara Municipal do Porto, publicado em portoagoraaspessoas.wordpress.com a 24 de agosto de 2017

Sobre o/a autor(a)

Sociólogo, dirigente do Bloco de Esquerda e ativista contra a precariedade.
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