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É possível um acidente nuclear em Portugal?

Parece estranho, habituados que estamos a pensar que o nuclear não é connosco, ainda para mais quando Portugal não tem nenhuma central. E no entanto, corremos perigo

A cerca de 100 quilómetros da fronteira portuguesa, ou a 300 de Lisboa, há uma central nuclear que corre sérios riscos de segurança. Quem o diz? O Conselho de Segurança Nuclear (CSN) do Estado Espanhol, um organismo conhecido pela sua prudência extrema neste tipo de alertas. Ou seja, se o aviso vem daí, é porque o caso deve ser mesmo sério.

A central de Almaraz foi construída há 35 anos e já teve dezenas de incidentes. Tem atualmente os reatores nucleares mais velhos do Estado espanhol e o sistema de refrigeração já não dá garantias de segurança. Supostamente, devia ter sido fechada em 2010, que era o seu prazo máximo de vida, mas o governo decidiu prolongar o seu funcionamento até 2020. No passado mês de fevereiro, quando aconteceu a última avaria e um incêndio, o alarme soou no país vizinho, pela mão do insuspeito El Pais, que divulgou o relatório dos cinco inspetores que ali realizaram a vistoria. O mesmo alarme devia ter soado por cá. Não há fronteira que nos proteja de um acidente que aconteça a 100 quilómetros. Mas a coisa passou mais ou menos despercebida à maioria das pessoas.

Luísa Schmidt, uma das vozes mais respeitadas nas questões ambientais em Portugal, escreveu há poucos dias no Expresso um artigo em que explica o que se passa e conclui que a central de Alamaraz “está em fim de vida, não é fiável e, a cada ano que passa, aumenta o risco. Se algo mais grave acontecer, num instante, é a catástrofe”. É caso para perguntar como pode manter-se em funcionamento se a catástrofe é iminente. A resposta é previsível, mas nem por isso aceitável: porque há muito dinheiro envolvido. Os proprietários da central ganham fortunas a vender a energia produzida no mercado de eletricidade. Além disso, querem evitar os custos do processo de desativação.

Imagina-se o que seria um acidente nuclear em Almaraz? As suas consequências humanas e ambientais? Confesso a minha dificuldade em fazê-lo. Mas uma coisa é certa: se as populações não fizerem nada, o negócio garantirá que a imprudência vai falar mais alto que o bom senso.

É isso que pretende evitar a manifestação ibérica que vai lugar no próximo dia 11 de junho, em Cáceres. O mote é claro: “Fechar Almaraz, que descanse em paz”. Na realidade, encerrar Almaraz é a única verdadeira garantia de segurança que deve ser exigida em conjunto pela população de um país e de outro. E, já agora, pelo governo português ao espanhol. Perder tempo é correr mais riscos desnecessários.

Artigo publicado em expresso.sapo.pt a 3 de junho de 2016

Sobre o/a autor(a)

Dirigente do Bloco de Esquerda, sociólogo.
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