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Carta sobre acordos de parceria económica
As Organizações não governamentais (ONGs) da União Europeia ligadas às questões do desenvolvimento mandaram à presidência portuguesa da UE uma carta sobre os Acordos de Parceria Económica (APE), que publicamos aqui em português.
Nesta carta as ONG's levantam diversas reivindicações entre, as quais, que a UE pare de "insistir na obtenção de um acordo recíproco quanto ao acesso a mercados para bens, bem como na inclusão de novas questões - tais como os investimentos, política de concorrência e aquisições públicas - ou de disposições "OMC-plus" para os serviços ou direitos de propriedade intelectual, em qualquer acordo comercial com os países ACP".
Nos últimos meses, a negociação dos Acordos de Parceria Económica (APE) entre a UE e os países ACP entrou numa fase crucial, tendo a Comissão Europeia (CE) produzido já propostas detalhadas para os textos dos APE em relação a todos os grupos regionais de países ACP. Existe uma pressão crescente, por parte da CE, para que seja alcançado um acordo antes da derrogação da OMC expirar, ou seja, no prazo de seis meses. Esta pressão é ampliada pelo facto da CE ameaçar aumentar as tarifas aduaneiras para as exportações dos ACP, caso um acordo não seja alcançado até ao final do ano. À medida que as negociações se aproximam do seu auge aumenta a nossa preocupação em assegurar que os meios de subsistências e o futuro de milhões de pessoas que vivem na pobreza sejam colocados no centro das negociações, e que tais prioridades não sejam sacrificadas apenas por ter de cumprir o prazo.
Apesar das conclusões adoptadas pelo Conselho da UE e pelo Conselho Conjunto ACP-UE, em Maio deste ano, reiterarem o compromisso para com o Desenvolvimento Sustentável e a Erradicação da Pobreza, todos os sinais provenientes das negociações sugerem que tais compromissos não estão a ser devidamente tidos em conta na mesa das negociações. A análise das propostas da CE demonstra que tais textos vão mais longe do que o exigido pela conformidade com as regras da OMC, e que para além disso são, em muitos aspectos, contraditórios com o Desenvolvimento. Estas preocupações aplicam-se por exemplo aos serviços e a outras questões relacionadas com o comércio, que os negociadores europeus continuam a impulsionar, mau grado o direito dos países ACP de escolher se querem ou não negociá-los. A título ilustrativo, o Financial Times publicou no dia passado dia 25 de Maio uma carta aberta dirigida à Comissão Europeia - redigida por peritos sobre direitos de propriedade intelectual de renome mundial - argumentando que as propostas da CE sobre os APE iria, no que toca à propriedade intelectual, "atrasar, mais do que promover o seu [dos países ACP] desenvolvimento económico e social".
Do mesmo modo, a Europa não está a dar a ênfase necessária à questão do Desenvolvimento nos seus pedidos de acesso a mercados. Embora os Estados-Membros estejam de acordo quanto à necessidade de apoiar a integração regional entre os países ACP, a posição negocial adoptada pela CE poderá conduzir a um resultado oposto. A Europa realizou a sua integração regional através da protecção e da promoção do seu mercado regional, bem como apoiando a sua agricultura e a sua indústria a fim de os tornar competitivos. Porém, são justamente este tipo de medidas que estão a ser recusadas às regiões ACP. Com efeito, a UE pede às regiões ACP que abram os seus mercados regionais sem que os seus produtores e mercados regionais tenham tido a oportunidade de amadurecer.
À medida que o final do prazo se aproxima, a pressão para concluir as negociações aumenta. As garantias dadas por ambos os lados de que os APE "serão concluídos a tempo" parece ignorar a quantidade de trabalho que ainda está por fazer. As questões que estão em cima da mesa são complexas. Para além disso, atendendo ao impacto que poderiam ter no desenvolvimento dos países mais pobres, tais questões devem ser cuidadosamente analisadas e amplamente debatidas. Até ao momento tal não sucedeu. Com efeito, os compromissos e propostas não foram devidamente examinados ou discutidos, nem por peritos independentes, nem ao nível dos governos nacionais, nem mesmo por interessados óbvios, tais como organizações de agricultores, sindicatos ou o sector empresarial.
Existem medidas concretas que podem e devem ser adoptadas pelos países da UE a fim de assegurar que as questões de Desenvolvimento recebem a atenção merecida:
- Em primeiro lugar, apelamos a que faça uso da Presidência Portuguesa no sentido de promover uma ampla avaliação e discussão democrática das diversas propostas que estão em cima da mesa.
- Em segundo lugar, reiteramos o nosso apelo no sentido da UE parar de insistir na obtenção de um acordo recíproco quanto ao acesso a mercados para bens, bem como na inclusão de novas questões - tais como os investimentos, política de concorrência e aquisições públicas - ou de disposições "OMC-plus" para os serviços ou direitos de propriedade intelectual, em qualquer acordo comercial com os países ACP. Relembramos os compromissos assumidos pelo Conselho da UE, de 15 de Maio de 2007, no sentido de "respeitar integralmente o direito de todos os países e regiões ACP em determinar as políticas mais adequadas para o seu desenvolvimento".
- Em terceiro lugar, na linha daquilo que foi avançado pelos Ministros ACP (suas conclusões de 24 de Maio de 2007), os Estados-Membros da UE deveriam cumprir as suas obrigações legais e assumir imediatamente o compromisso formal de não impor direitos mais elevados, nem dificultar as trocas comerciais, caso um APE não seja alcançado até ao final do ano. Para além disso, os Estados-Membros deveriam reconhecer que, tal como foi demonstrado por investigações recentes, existem soluções tecnicamente exequíveis que estão em conformidade com as regras da OMC. O que é necessário, simplesmente, é que os Estados-Membros demonstrem a sua vontade política e a capacidade de liderança para implementá-las.
- Por fim, instámo-lo a garantir que, independentemente dos resultados das negociações, os Estados-Membros assumam e respeitem os seus compromissos quanto à ajuda suplementar para fazer face às limitações dos países ACP ao nível da oferta, bem como para reforçar os seus mercados locais e regionais. A disponibilização desta ajuda deverá ser feita de acordo com os princípios da apropriação e da responsabilidade mútua, previstos pela Declaração de Paris
Saudamos, ainda, a especial atenção conferida ao Desenvolvimento pelo programa da Presidência Portuguesa e, particularmente, a prioridade que atribui às relações entre a UE e África. Tendo isso em consideração, apelamos à sua Presidência para que garanta a coerência entre, por um lado, os compromissos declarados pela UE em relação ao desenvolvimento de África e, por outro lado, a forma e o conteúdo das negociações dos APE.
Preocupa-nos profundamente o facto de a actual trajectória das negociações dos APE se apresentar como mais propícia a comprometer o Desenvolvimento, do que propriamente a reforçá-lo; minando, consequentemente, as aspirações de Desenvolvimento da estratégia UE-África em preparação.
Esperamos poder contar com uma Presidência Portuguesa activamente empenhada em relação ao Desenvolvimento Sustentável, bem como ter a oportunidade de poder trocar mais impressões sobre estas temáticas.
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