Não vale a pena alimentar ilusões sobre a situação da economia europeia antes do surto pandémico provocado pelo Covid19. No último trimestre de 2019, os 28 países da União Europeia cresceram, em média, 0,1% face ao trimestre anterior, e a Zona Euro não esteve melhor. Num relatório de novembro, a agência de rating Fitch alertou para os riscos da combinação prolongada de fraco crescimento e inflação baixa, dominante desde a crise anterior. Na Alemanha, há muito que a recessão espreita à distância de uma décima. A produção industrial alemã caiu 7% ao longo de 2019 e a OCDE já previa que o PIB não crescesse mais do que uns desapontantes 0,4% em 2020.
Passaram mais de 10 anos desde a crise anterior e a Europa, apesar da empenhada negação pelos seus principais líderes, continua a flirtar com a estagnação. É sobre este pano de fundo - dívida, fraco investimento e crescimento medíocre - que se abaterá a tempestade económica causada pelo vírus Corona. Não temos muito tempo. A “resposta forte” prometida pelo Eurogrupo continua por definir e de pouco valerá se repetir os erros do passado.
Antes do Covid19: a Europa entre a estagnação e o risco de deflação
A estratégia de resposta à crise de 2008, depois de uma primeira fase, em que as instituições europeias incentivaram a adoção de medidas de estímulo orçamental, teve duas vertentes: desvalorização interna e política monetária expansionista. Na prática, significa que os Estados foram convidados (em nalguns casos, chantageados) a cortar no investimento público, no apoio à economia e aos cidadãos, abrindo caminho ao desemprego e à desvalorização salarial, que abririam um novo ciclo de de produção e investimento. Como sabemos, o crasso erro desta lógica é que esquece que os salários, diretos e indiretos (através dos serviços públicos), não são só custo para as empresas. São também a fonte da procura que põe a economia a funcionar e que, quando devastada, leva consigo as empresas, o investimento, e o crescimento. Sem procura, os preços caem mas as dívidas mantêm-se, o que deixa devedores e credores (os bancos) em maus lençóis. Este é o cenário de deflação a que a União Europeia ainda não conseguiu dar resposta, por mais que o BCE tenha inundado os mercados financeiros com dinheiro fresco.
Fonte: Pordata
Esta evidência traz-nos à intervenção do banco central que, em vez de financiar diretamente os Estados (para não pôr em causa a tão desejada desvalorização interna), injetou triliões no sistema financeiro através da compra de ativos e reduziu as taxas de juro até não poder mais.
O objetivo, neste caso, era impedir a falência dos bancos, aliviar a tensão nos mercados financeiros e fomentar o crédito e o investimento. Acontece que, por mais dinheiro que houvesse para emprestar, os bancos continuaram a nadar num mar de imparidades provocadas pela falência das economias. Por outro lado, as reduzidas taxas de juro valem pouco se não existir investimento e se as economias ainda estiverem asfixiadas pelos níveis de dívida privada. Assim, embora tenha conseguido reduzir as taxas de juro das dívidas públicas, o principal resultado da tardia ação do BCE foi um novo sobreaquecimento especulativo alimentado pelo excesso de liquidez nos mercados financeiros. Nunca as Bolsas subiram tanto como nestes anos de quase estagnação económica.
Com taxas de juro negativas desde 2016 e com os mercados inundados de liquidez, o “mais do mesmo” do BCE até pode aliviar a pressão sobre os bancos, mas não salvará a Europa da crise. O problema não é só saber se o dinheiro está a ser criado, mas quem acede a ele, em que condições, e para quê.
Resposta ao Covid19: As hesitações no comando da União Europeia
Até este momento, da Comissão Europeia saiu muito pouco de concreto. No início de março, a intenção do Eurogrupo, era ainda de acordo com o seu presidente, Mário Centeno, conter as medidas nacionais de combate à crise do Covid19 no quadro da “flexibilidade” aplicável ao Pacto de Estabilidade e Crescimento. Duas semanas depois, o óbvio tornou-se iniludível, e a presidente da Comissão Europeia comunicou a inédita suspensão das regras orçamentais e uma ampla flexibilização das regras das “ajudas de Estado” (que têm inibido a intervenção pública direta nas empresas nacionais). No resto, as muitas promessas de proteção da economia e do emprego traduziram-se em nada, para além da referência a um plano de investimento de 37 mil milhões de euros destinado aos serviços de saúde, às empresas e à proteção dos postos de trabalho. Para termos noção da insignificância deste valor, basta mencionar que a Espanha, sozinha, lançou um plano de combate aos impactos do Covid19 de 200 mil milhões de euros. A Alemanha concedeu garantias para 500 mil milhões em empréstimos.
Toda a existência da Comissão Europeia foi centrada na eliminação de instrumentos de intervenção estatal na economia. Não surpreende que Bruxelas tenha pouca vontade de criar medidas drásticas de política económica, ficando, uma vez mais, a olhar para o BCE, à procura de milagres.
A primeira reação de Christine Lagarde veio sob a forma de aviso: “A situação é diferente da da Grande Recessão. A nossa análise é a de que a resposta tem de ser primeira e principalmente orçamental. Ninguém pode esperar que seja o banco central a estar na linha da frente”. Apesar do recado, o BCE anunciou nesse mesmo dia algumas medidas de apoio à economia, ainda tímidas: compra em mercado de 120 mil milhões de ativos (sobretudo títulos de dívida privada), até ao final do ano; reforço das linhas de financiamento de longo-prazo aos bancos; o alívio dos rácios de capital exigidos aos bancos na Zona Euro (no valor de 120 mil milhões); reforço do mecanismo em que o BCE remunera os bancos por receberem empréstimos do próprio banco central para que financiem, por sua vez, a economia produtiva e as famílias.
A Presidente do BCE percebeu rapidamente que, embora tenha muito boas razões para exigir uma resposta forte no campo orçamental, há coisas que não podem ser ditas. Depois de críticas de governantes europeus, o banco central fez um novo anúncio, um Programa de Compras de Emergência Pandémica, com 750 mil milhões para compra de títulos de dívida privada e pública.
Christine Lagarde, presidente do Banco Central Europeu. Foto União Europeia ©
É certo que o poder de fogo do BCE é importante para manter o funcionamento dos mercados financeiros, mas o desenho da sua intervenção tem limitações na resposta à crise económica. Já sabemos que, por mais financiamento que exista, há um problema de solvência e sustentabilidade, que tem a ver com a existência de procura na economia. Essa só é garantida pelo investimento e pelo emprego. O mesmo raciocínio aplica-se à descida das taxas de juro, especialmente num contexto em que já estão em níveis negativos. Por outro lado, compra de títulos de dívida privada e reforço da liquidez dos bancos, por si só, não garantem as condições de financiamento das PME, que são a maioria das empresas e, já agora, aquelas que irão enfrentar maiores dificuldades.
Austeridade depois da crise Covid19?
É evidente que, como afirmou Lagarde, a resposta tem que ser principalmente orçamental (já o deveria ter sido na Grande Recessão). Os Estados serão chamados, desde logo, a combater a epidemia, com os sistemas de Saúde sob pressão nunca vista, mas também para proteger as populações dos efeitos da suspensão da economia e, mais tarde, para garantir a retoma. O reforço dos serviços públicos, a criação de amplas redes de apoio social, as medidas de proteção e fomento dos setores estratégicos e o investimento necessário no futuro representam um esforço financeiro gigantesco. As medidas que foram apresentadas até ao momento - e que chegam, como no caso da Alemanha, a 15% do PIB - serão insuficientes. Para as financiar não bastam as tímidas respostas que as instituições europeias foram capazes de dar.
Para começar, é preciso garantir que a suspensão das regras orçamentais não será, depois, cobrada com uma nova vaga de autoritarismo e austeridade. Lembramo-nos bem da última crise: depois de mandar gastar, a Comissão virou-se contra os países mais fracos e esmifrou-os até não poderem mais. No FMI já se afiam as facas. Veja-se o seguinte parágrafo no relatório sobre Itália: “Eles [os Diretores Executivos] enfatizam a necessidade de, depois da crise de saúde passar, implementar um pacote abrangente de medidas para aumentar o crescimento potencial e a resiliência. Isso deve incluir reformas estruturais para aumentar a produtividade e o investimento, uma consolidação fiscal de médio prazo credível para colocar a dívida pública em uma trajetória descendente e medidas para apoiar a saúde do setor financeiro”. Já ouvimos isto em qualquer lado, não foi? Não haverá recuperação económica em austeridade, e se a União Europeia tem alguma esperança de recuperar definitivamente a sua economia, criar emprego e proteger o salário, então só lhe resta revogar os tratados europeus que a trouxeram à vertigem da desintegração.
Além de eliminar os constrangimentos artificiais à ação financeira dos Estados, é preciso garantir que estes estão protegidos da usura e da especulação. Ao contrário da Alemanha, que tem sempre as melhores condições de financiamento, países menores e economicamente mais frágeis, como Portugal, não têm como se proteger de uma escalada dos juros da dívida pública. Os mercados são autofágicos e não hesitarão em, mais uma vez, devorar o Estado que pode salvar a economia.
Essa pressão pode ser aliviada pela intervenção do BCE nos mercados secundários de dívida. Mas as regras do próprio BCE[1] impõem limites ao montante de dívida de cada país que o banco central pode comprar. Em segundo lugar, essa ação não impede o contínuo endividamento dos Estados junto dos mercados.
A solução existe e, embora nunca tenha sido tentada pelo BCE, é mesmo a razão dos bancos centrais terem sido criados no século XVII. Até há poucas dezenas de anos, cabia-lhes garantir condições de financiamento dos Estados, em particular em períodos de guerra, crise ou emergência, como o que hoje vivemos. Assim, para além da revogação das regras orçamentais absurdas, é essencial que o BCE assuma o papel de financiador da contenção da pandemia e da recuperação económica. Com uma pequena parcela daquilo que já canaliza para a banca, poderia, de forma muito mais eficaz, dar o apoio necessário ao esforço orçamental dos Estados. Isto pode ser feito com dois instrumentos: 1) uma linha de financiamento aos Estados com juros semelhantes aos oferecidos à banca; 2) um fundo destinado aos serviços públicos dos diferentes países. Não existe nenhuma razão, técnica ou económica, que impeça a criação destes mecanismos. O problema é mesmo, como sempre foi, contrariar o radicalismo ideológico das instituições europeias.
O problema é mesmo, como sempre foi, contrariar o radicalismo ideológico das instituições europeias e, em particular da Alemanha. Nas últimas horas o ministro da economia alemão já fez saber que o debate sobre formas de mutualização de dívida, como os eurobonds ou coronabonds, propostas por vários governos europeus, é um “debate fantasma”.
Os Estados de regresso ao mercado?
Assim que soaram os alarmes da pandemia, foi para o Estado que todos se viraram. Em Portugal, desde logo, para o Serviço Nacional de Saúde que, dentro das suas fragilidades, ofereceu uma resposta organizada, consistente e de qualidade, em contraste com o “salve-se quem puder” que vimos em países onde os cuidados ficaram a cargo dos privados. Mas foi apenas o início. Foi também para o Estado que todos olharam na hora de proteger a sociedade dos impactos económicos da contenção do vírus. Agora, dentro e fora da União Europeia, governos de diferentes orientações políticas tentam mitigar a devastação que resultará da suspensão da atividade económica provocada pela pandemia do Covid. Para o fazer, têm apenas variações do mesmo recurso: o Estado.
Em Portugal, o plano apresentado representa menos de 5% do PIB. No geral, o tipo de mecanismos anunciados só difere do que foi anunciado noutros países na sua dimensão. Na Alemanha, em Espanha e em França os planos de intervenção correspondem a 15%, 20% e 15% do PIB, respetivamente.
É hoje evidente que o “livre funcionamento dos mercados” não garante o bem-estar da população ou da economia em momentos de crise e que restringir o poder do Estado quando ele é mais necessário, como fez a UE desde 2008/2009, é a receita para o desastre.
Até agora, as medidas em prática, que resumo no anexo deste artigo, são de três tipos: moratórias (contributivas, fiscais e, nalguns casos, também bancárias); linhas de crédito à economia, com diferentes graus de abrangência; reforço dos serviços públicos[2]. Em alguns países, como a Alemanha ou, em menor medida, a Espanha, o financiamento da economia passa essencialmente pelos bancos públicos. Noutros, como os EUA e a Inglaterra, e mesmo, como vimos, na Zona Euro, os bancos centrais voltam a ganhar protagonismo, com o lançamento de programas de cedência de liquidez e de compra de dívida pública. Em quase todos, estão a ser ponderadas nacionalizações como forma de proteção de empresas estratégicas e o Reino Unido, por exemplo, já anunciou mesmo o controlo temporário das empresas de caminhos de ferro.
Em Portugal, o plano apresentado representa menos de 5% do PIB. No geral, o tipo de mecanismos anunciados só difere do que foi anunciado noutros países na sua dimensão. Na Alemanha, em Espanha e em França os planos de intervenção correspondem a 15%, 20% e 15% do PIB, respetivamente.
À medida que os dias passam, torna-se mais claro que estas medidas não serão suficientes para lidar com a destruição económica provocada pelo Covid19. Será necessário, em primeiro lugar, garantir o acesso de todos aos serviços básicos: água, luz, casa, telecomunicações, etc. Onde as empresas ainda são públicas, essa resposta foi rápida e abrangente. Onde foram privatizadas, que é a maior parte dos casos, o Estado terá impor o fornecimento de serviços essenciais. O que o país precisa da EDP não é apenas doações de algum equipamento médico, mas sim o fornecimento gratuito de eletricidade a quem foi mais afetado pela crise. O que o país deve exigir aos bancos é que, depois de terem sido salvos com dinheiro público, suspendam os pagamentos dos créditos à habitação das pessoas que perderam os seus rendimentos.
Mas o país precisa de uma outra coisa, da EDP e de todas as empresas, sobretudo as grandes: que mantenham o emprego, mesmo, se necessário, em regime de lay-off com salários suportados pelo Estado. Qualquer ajuda às empresas, seja sob a forma de crédito, subsídio ou isenção contributiva, deve ser condicionada à manutenção de todos os postos de trabalho, incluindo os temporários e à reversão da vaga de despedimentos das últimas semanas. Porquê? Porquê se isso não for feito, depois do pico da pandemia, o país será confrontado com um nível de desemprego que impedirá as contas públicas, mas também as próprias empresas, de recuperar.
Até lá, o Estado será chamado a utilizar todos os instrumentos ao seu alcance para garantir que a produção de bens e serviços essenciais não pare durante a crise e que setores económicos estratégicos sejam protegidos da falência ou da venda a saldo. Subsidiar empresas que, de outra forma, não conseguirão sobreviver e nacionalizar ativos estratégicos são as formas mais eficazes de o fazer.
De uma forma ou de outra, com a adoção de todos estes mecanismos ou de formas de os combinar, o facto é que a economia não sobreviverá se não for salva pelo Estado. Depois de anos de diabolização da intervenção pública, a única opção socialmente aceitável é utilizar todos os recursos e instrumentos que foram sendo banidos ou limitados pela União Europeia: ajudas de Estado, desenvolvimento de serviços públicos, regulação do trabalho e proteção dos seus rendimentos.
Notas:
[1] A chave de Portugal corresponde a 2,34%, o que significa que,por exemplo, no programa de compra de ativos do BCE no valor total de 750 mil milhões, só 17,55 mil milhões podem corresponder a obrigações de dívida pública portuguesa.
[2] Porque todos os dias são anunciadas medidas novas, esta análise não pretende, nem conseguiria, ser exaustiva. De lado ficaram, por exemplo, alterações às regras laborais.
Anexo - Medidas económicas por país
Portugal: 5% do PIB
Em Portugal, o governo começou por criar uma linha de crédito para apoio à tesouraria das MPME no valor de 200 milhões de euros, a agilização dos pagamentos no quadro do Portugal 2020, uma moratória de 12 meses na amortização de subsídios reembolsáveis do QREN e do PT2020, bem como a simplificação das regras do lay-off.
Mário Centeno, ministro das Finanças português. Foto União Europeia ©
No dia 18 de março, foi a vez do ministro das finanças anunciar um pacote de estímulos no valor de 9,2 mil milhões de euros, menos de 5% do PIB, repartidos da seguinte forma:
- 3 mil milhões em linhas de crédito garantidos pelo estado articuladas com o sistema bancário, prevendo-se um período de carência até ao final do ano e amortizações em 4 anos. Estas linhas repartem-se por vários setores:
- Para a restauração e similares, há uma linha de crédito de 600 milhões de euros, dos quais 270 milhões são destinados a micro e pequenas empresas;
- Para as empresas do setor do turismo nas áreas das agências de viagem, animação e organização de eventos e outras similares, há uma linha de crédito de 200 milhões de euros, dos quais 75 milhões são destinados a micro e pequenas empresas;
- Para as outras companhias no setor turístico, incluindo empreendimentos turísticos e alojamento turístico, há uma linha de crédito de 900 milhões de euros, dos quais 300 milhões destinam-se a micro e pequenas empresas;
- No setor da indústria, têxtil, vestuário, calçado, indústrias extrativas e madeira, há uma linha de crédito de 1.300 milhões de euros, dos quais 400 milhões são especificamente para micro e pequenas empresas;
- Suspensão dos processos tributários em curso e diferimento de impostos (no valor de 5 mil milhões de euros):
- IRC – diferido para 31 de julho
- Pagamento por conta – diferido para 31 de agosto
- Para empresas com rendimentos inferiores a 10M€ ou com quebra de receitas superior a 20%, ou para trabalhadores independentes é prevista a possibilidade de fracionamento do pagamento das suas obrigações fiscais
- 3 meses sem juros, ou
- 6 meses com pagamento de juros de nos últimos 3 meses.
- Diferimento e redução das contribuições sociais (1,2 mil milhões de euros):
- Contribuições relativas aos meses de março, abril e maio são reduzidas a 1/3.
- O remanescente é liquidado no 3º trimestre com a possibilidade de acesso ao mesmo fracionamento previsto para as obrigações fiscais sempre que a empresa tenha menos de 50 trabalhadores ou que tenha menos de 250 postos de trabalho e uma quebra de receitas superior a 20%.
No dia 20 de março foi revelado pelo Primeiro ministro que o acesso às linhas de crédito passaria a estar condicionado à manutenção dos postos de trabalho das empresas (mas só dos permanentes, não se aplicando aos trabalhadores temporários), e que estas seriam estendidas a atividades que antes não estavam contempladas, como o comércio.
Depois da medida de proibição dos despejos aprovada na Assembleia da República, a caducidade dos contratos de arrendamento foi também suspensa. Quanto aos crédito à habitação ou às empresas, não foi ainda estabelecida qualquer moratória de pagamento, embora o Governo tenha referido que a medida está a ser estudada em conjunto com o Banco de Portugal e a Associação Portuguesa de Bancos.
Alemanha: 15% do PIB só para começar
Na Alemanha, o Governo começou por apresentar uma linha de crédito de 1100 milhões de euros mas declarou que não existe qualquer limite para a ajuda financeira que poderá vir a ser dada às empresas. O KfW, banco estatal de desenvolvimento, está preparado para estender a linha até aos 500 mil milhões de euros. O Estado federado da Bavaria, onde se localizam algumas das mais importantes indústrias alemãs, anunciou um fundo de 10 mil milhões de euros, bem como a sua disponibilidade para nacionalizar empresas que devam ser protegidas de aquisições indesejáveis (fundos estrangeiros, capital “abutre”, etc).
Angela Merkel, líder do governo da Alemanha. Foto União Europeia ©
Outras medidas incluem o adiamento do pagamento de impostos por parte de empresas final de 2020, a expansão dos programas de créditos à exportação, 145 milhões para investigação científica no âmbito do coronavírus, e 50 milhões para repatriar turistas.
O aumento do investimento público continua, no entanto, limitado ao compromisso antes assumido para evitar a recessão: 3100 milhões adicionais por ano até 2024. O primeiro-ministro da Bavaria, aliado de Merkel, já exigiu a adoção de novas medidas, como a suspensão por três meses do imposto sobre a energia e um novo plano de “ajuda” entre 100 e 150 mil milhões de euros.
Espanha: um pacote 200 mil milhões
Foi já publicado o decreto que estabelece as medidas do plano de 200 mil milhões euros anunciado pelo governo espanhol , o equivalente a 20% do PIB do país. Prevê-se que, deste montante, 117 mil milhões venham dos cofres do Estado, sendo complementados por empréstimos de bancos privados ao abrigo de garantias públicas.
Pedro Sánchez, primeiro-ministro espanhol. Foto União Europeia ©
As principais medidas do Plano incluem:
- 600 milhões de euros para ações de apoio às populações mais vulneráveis;
- 300 milhões para reforçar os serviços públicos destinados ao apoio social;
- 100.000 milhões de garantias públicas para créditos bancários a empresas;
- 200 milhões para créditos estatais concedidos pelo Instituto de Crédito Oficial;
- 30 milhões para reforço da investigação científica no âmbito do Covid;
- Alargamento do acesso ao subsídio de desemprego para trabalhadores independentes com mais de 75% de quebra de rendimentos e também para trabalhadores dependentes em regime de layoff.
- Suspensão das contribuições para a Segurança Social mediante compromisso de manutenção do emprego:
- 100% para PME até 50 trabalhadores;
- 75% para as restantes empresas;
Para além destas medidas, o Governo espanhol determinou ainda, como parte do Plano:
- Uma moratória ao pagamento dos créditos à habitação para trabalhadores dependentes e independentes severamente afetados pelas consequências económicas e sanitárias do Covid;
- Proibição dos cortes de luz, água e gás a grupos vulneráveis;
- A blindagem de empresas estratégicas - como a Telefónica, o Santander ou o BBVA - para impedir que sejam alvo de tentativas de compra a saldo por empresas de fora da União Europeia.
Este pacote extenso vem somar-se a outro, apresentando anteriormente, no valor de 18 mil milhões de euros, destinado sobretudo a reforçar as respostas sanitárias, proteger as empresas do turismo e transportes (linha de crédito pública de 400 milhões de euros), e a combater os casos mais urgentes de carência social. Foi nesse primeiro pacote que foi decretado o adiamento dos impostos das PME e trabalhadores independentes por 6 meses, medida que permitiria uma injeção de liquidez de 14.000 milhões de euros na economia, números do governo.
Cura Itália não chega a 2% do PIB
O país mais afetado pelo Covid anunciou um pacote de 25 mil milhões de euros (menos de 2% do PIB), a que acrescem 3,5 mil milhões para o sistema de Saúde e para a Proteção Civil.
Giuseppe Conte, primeiro-ministro de Itália. Foto União Europeia ©
Entre as principais medidas incluem-se:
- Intervenção em empresas estratégicas, com possibilidade de nacionalização, nomeadamente da Alitalia;
- A suspensão da retenção de impostos e do pagamento de contribuições para a Segurança Social:
- Sem limite temporal para os setores mais afetados ou pequenas empresas;
- Para as restantes, opção de pagamento único no mês de maio ou fracionado em cinco meses;
- Suspensão de todas as contribuições sociais de trabalhadores domésticos até final de maio;
- Atribuição de um crédito tributário de 60% do valor da renda de março para proprietários de estabelecimentos comerciais;
- Garantia estatal para empréstimos até 5 milhões de euros destinados ao investimento e à reestruturação de dívida das empresas.
- Garantia estatal até 80% do valor dos empréstimos para liquidez das empresas que tenham sofrido redução de rendimento.
- Fundos para a promoção e apoio à internacionalização.
- Moratórias nas prestações de crédito devidas por PME até final de setembro.
- Extensão do regime de lay-off a todas as empresas;
- Proibição, nos meses de março e abril, de todos os despedimentos sem motivos justificados;
- Bónus de 100 euros, no mês de março, para os trabalhadores que tenham de continuar a trabalhar fora de casa e que recebam menos de 40 mil euros anuais;
- Subsídio de 600 euros para trabalhadores independentes e sazonais – para o mês de março;
- Suspensão das prestações de crédito para habitação própria e permanente por nove meses no caso de trabalhadores com perdas de rendimento superiores a 33%. Durante o período de suspensão, o pagamento dos juros aos bancos é assegurado por um fundo público.
França: 15% do PIB
As medidas adotadas em França não diferem muito das já mencionadas. As garantias públicas sobre créditos a empresas ascendem a 300 mil milhões de euros e o Governo já admitiu vir a nacionalizar empresas estratégicas em risco, como a Air France. Os impostos e contribuições sociais das empresas foram suspensos durante um mês (um custo de 10 mil milhões de euros por semana) e as autoridades ponderam atribuir um “desconto” fiscal às empresas em situação de risco de sobrevivência. No caso de trabalhadores independentes e pequenas empresas, a suspensão de pagamentos abrange ainda a fatura energética e as rendas. Como nos restantes países, o regime de lay-off foi alargado..
EUA: a FED entra em campo
Depois de desvalorizar a pandemia, Donald Trump anunciou que pretende disponibilizar 1 trilião de dólares (um milhão de milhões, cerca de 5% do PIB), distribuído da seguinte forma:
- 500 a 550 mil milhões de dólares em transferências diretas ou redução de impostos para pessoas e empresas;
- 200 a 300 mil milhões para apoio a pequenas empresas;
- 50 a 100 mil milhões no apoio às companhias aéreas e indústrias afetadas;
Este pacote terá agora de ser negociado com o Congresso, onde a maioria Democrata tem defendido que o apoio à indústria deve ser complementado por medidas de defesa dos trabalhadores e das suas famílias.
Donald Trump numa conferência de imprensa. Foto Shealah Craighead/Flickr
Também a Reserva Federal (FED) se pôs em campo. Logo no dia 3 março, o banco central cortou as taxas de juro em 0,5%. Dias mais tarde expandiu as medidas de cedência de liquidez aos bancos em 1,5 triliões de dólares. A 15 de março, as taxas de juro voltaram a descer e o banco central iniciou a compra de 500 mil milhões de dólares em títulos de dívida pública e 200 mil milhões de títulos de dívida privada. Um dia depois, os empréstimos de curto prazo foram aumentados em 500 mil milhões de dólares.
Nos últimos dias, foram ainda recuperados dois instrumentos utilizados durante a crise de 2008. Em primeiro lugar, um fundo, financiado pela FED e garantido até 10 mil milhões de dólares pelo Tesouro norte-americano, destinado a conceder crédito a empresas em dificuldades. Em segundo lugar, uma nova linha de financiamento de curto prazo ao sistema bancário, garantida por títulos de dívida de governos locais e de grandes empresas. Finalmente, foi criado outro mecanismo de financiamento da banca (também garantido pelo Tesouro até 10 mil milhões de euros), destinado à compra de ativos nos mercados financeiros.
Reino Unido: 15% do PIB em garantias
No dia 11 de março, o ministro das Finanças anunciou um pacote de estímulos orçamentais no valor de 30 mil milhões de libras destinado a apoiar as empresas e os serviços públicos e a financiar baixas médicas. Um sexto deste será destinado ao reforço do Serviço Nacional de Saúde (NHS). Outras medidas incluem:
- Uma redução fiscal para comércio;
- Garantias para pequenos negócios;
- Um subsídio para cobrir os custos das empresas com a baixa médica dos trabalhadores;
- Expansão dos subsídios estatais às pessoas em situação de desemprego e trabalhadores independentes.
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Boris Johnson, primeiro-ministro britânico. Foto Andrew Parsons/Flickr
Estas medidas foram estendidas dias depois, com a concessão de 330 milhões de libras, o equivalente a 15% do PIB, em garantias estatais a empréstimos a empresas, acrescidos de 20 biliões de libras para apoiar os setores mais afetados, como o turismo e a restauração.
Paralelamente, ter-se-á chegado a um acordo com os bancos com vista à concessão de uma moratória de três meses ao pagamento de créditos à habitação. Tal como nos EUA, também aqui o banco central teve um papel autónomo. O Banco de Inglaterra começou por baixar a taxa de juro em 0,5%, reduziu os requisitos de capital dos bancos e anunciou um programa de financiamento a baixas taxas de juro para que estes possam, por sua vez, emprestar a PME. Dias mais tarde, anunciou nova descida da taxa de juro e a compra de 200 milhões de libras em títulos, maioritariamente obrigações de dívida pública do Reino Unido.