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PS: O coma ideológico
O PS tem um pudor muito selectivo... Sobre as inúmeras promessas não cumpridas e as mentiras eleitorais que lhe permitiram a eleição (criar 150 mil novos postos de trabalho; não subir os impostos) nunca houve, sequer, um vislumbre de arrependimento das boas consciências que agora referem a falta de «legitimidade social» para aprovar o casamento entre pessoas do mesmo sexo.
O cinismo chega ao ponto de Alberto Martins, uns dos maiores cristãos-novos do pragmatismo desenfreado da era Sócrates, afirmar que a permissão do partido em deixar Pedro Nuno, ex-líder da JS, votar favoravelmente os projectos apresentados, significava o empenho do PS no pluralismo. Pedro Nuno, sem reparar no ridículo da situação, não tardou em arvorar-se em símbolo de todos aqueles e aquelas que, no PS, quereriam votar a favor do casamento entre pessoas do mesmo sexo. Na verdade, quem tem coragem jamais delegaria noutro deputado a representação da sua vontade e da sua consciência. O mesmo se poderá dizer de Paulo Pedroso: entrada de Leão, mas, por detrás da retórica grandiloquente de proclamações sobre a declaração de princípios do PS e críticas à submissão do partido ao conservadorismo de raiz católica, nem um arroubo de insurgência. Votará ordeiramente com a boa ordem. É caso para dizer a Paulo Pedroso que impõe como condição para uma coligação do PS com a esquerda o reconhecimento por parte desta de uma organização bélica como a NATO, completamente manietada pelos EUA e que, como o próprio Mário Soares afirma, não faz sentido num mundo pós 1989, que o Bloco exige ao PS o mínimo de coerência na defesa da liberdade de opção e dos caminhos da modernidade! Não chega a Constituição da República e todos os princípios de não discriminação com base na orientação sexual já consagrados na legislação europeia?
O PS está em verdadeiro estado de coma ideológico. Não há uma única ideia nova para a refundação da esquerda, um único discurso que contribua para um debate vivo e produtivo. A própria revista Finisterra, desde sempre apoiada pelo Partido, vive momentos de asfixia, apenas porque se revelou crítica e desalinhada face ao poder absoluto do Querido líder. É caso para dizer que, se quiser partilhar poder e iniciativa com a Esquerda, o PS tem um longo caminho a percorrer. Desde logo, limando a sobranceria. Em seguida, ganhando os mínimos de coragem transformadora para além do pragmatismo que só vê o poder pelo poder. Finalmente, actualizando o seu discurso que remonta cada vez mais a um mundo do passado - o universo da arqueologia neoliberal.
João Teixeira Lopes
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