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Portugal, pioneiro na abolição da pena de morte

Relativamente à questão de fundo, o representante do Governo sintetizou o que parecia corresponder ao sentimento unânime da Câmara: "...porque felizmente entre nós a pena de morte para os crimes políticos está abolida nos corações de todos; e se, porventura, aparecesse hoje entre nós, um Nero, ou um Calígula, não teria força para a impor; e ainda bem que damos ao mundo um exemplo de tolerância que muito nos honra".
A proposta foi aprovada e a abolição da pena de morte por crime político passou a constar do artigo 16º do Acto Adicional à Carta Constitucional (5 de Julho de 1852).

Sabe-se que, desde 1834, não fora executada pena capital pela prática de crime político.

A partir daí, a questão da abolição da pena de morte para os restantes crimes foi levada, por diversas vezes, às câmaras.

Na sessão de 3 de Julho de 1863, Ayres de Gouveia, depois de propor a supressão, no orçamento do Estado, do ofício de carrasco, apresentou uma proposta que visava a abolição da pena de morte em todos os crimes, incluindo os militares. Proposta bem acolhida e logo secundada por outra, assinada por vários deputados, cujo texto é o seguinte: "1º - Fica abolida a pena de morte; 2º - É extinto o hediondo ofício de carrasco; 3º - É riscada do orçamento do Estado a verba de 49$200 réis para o executor".

Não foi possível reunir consenso à roda da proposta nem nesta altura nem no ano seguinte mas, em 1867, viria a ser aprovada uma lei que aboliu a pena de morte para todos os crimes, exceptuados os militares - Lei de 1 de Julho de 1867.

Relativamente a crimes do foro militar, a pena de morte manteve-se até ao Decreto com força de lei de 16 de Março de 1911 que a aboliu, vindo a Constituição de 1911 a prever que em nenhum caso poderia ser estabelecida tal pena.

Uns anos mais tarde, a participação de Portugal na guerra levaria, pela lei nº 635, de 28 de Setembro de 1916, a restabelecer a pena de morte para "caso de guerra com país estrangeiro, em tanto quanto a aplicação dessa pena seja indispensável, e apenas no teatro de guerra".

Com redacção ligeiramente diferente, este regime vigorou até à Constituição de 1976 que, no nº 2 do artigo 24º, estabeleceu que "em caso algum haverá pena de morte".

O movimento abolicionista foi estimulado por disposições introduzidas nas leis judiciárias (Reforma Judiciária, Nova Reforma Judiciária e Novíssima Reforma Judiciária) que impunham o recurso obrigatório à clemência régia em todos os casos de sentenças capitais proferidas por tribunais portugueses.

A última execução de pena de morte por motivo de delitos civis ocorreu em Lagos, em Abril de 1846.

Curiosamente, remonta a 1 de Julho de 1772 a data em que é executada pela última vez uma mulher. Chamava-se Luísa de Jesus, tinha 22 anos e assassinara 33 expostos que ia buscar à roda de Coimbra, uns em seu nome, outros em nome suposto, para se locupletar com o enxoval e os 600 réis que correspondiam a cada entrega.

No que se refere a crimes militares, a última execução terá ocorrido em França, na pessoa de um soldado do Corpo Expedicionário Português, condenado por espionagem.

Portugal foi pioneiro na abolição da pena de morte e na renúncia à sua execução mesmo antes de abolida.

No colóquio internacional comemorativo do centenário da abolição da pena de morte, realizado em Coimbra, em 1967, Miguel Torga e Vergílio Ferreira falaram assim:

Miguel Torga:

"A tragédia do homem, cadáver adiado, como lhe chamou Fernando Pessoa, não necessita dum remate extemporâneo no palco. É tensa bastante para dispensar um fim artificial, gizado por magarefes, megalómanos, potentados, racismos e ortodoxias. Por isso, humanos que somos, exijamos de forma inequívoca que seja dado a todos os povos um código de humanidade. Um código que garanta a cada cidadão o direito de morrer a sua própria morte".

Vergílio Ferreira:

"...E acaso o criminoso não poderá ascender à maioridade que não tem? Suprimi-lo é suprimir a possibilidade de que o absoluto conscientemente se instale nele. Suprimi-lo é suprimir o Universo que aí pode instaurar-se, porque se o nosso "eu" fecha um cerco a tudo o que existe, a nossa morte é efectivamente, depois de mortos, a morte do universo"."

(...)

Neste dossier:

109 Países mantêm pena capital na lei

A execução de Saddam Hussein ressuscitou o debate internacional sobre a pena de morte. As imagens do assassínio do ex-ditador iraquiano chocaram a comunidade internacional. Quando estão previstas para breve mais duas execuções no Iraque, o esquerda.net decidiu elaborar um dossier sobre a pena de morte.

A pena de morte no mundo

2148 PESSOAS EXECUTADAS EM 2005

São 109 os países que prevêem nos seus regimes jurídicos a pena capital. Destes, apenas 11 restringem a aplicação a crimes militares. Dos 98 países que prevêem a condenação à morte para crimes civis 69 aplicam-na de forma regular. 88 é o número de países totalmente abolicionistas. (lista de todos os países disponível aqui) Segundo dados da Amnistia Internacional 2148 pessoas foram executadas em 2005 e 5186 foram condenadas à morte. Os EUA, a China, o Irão e a Arábia Saudita foram responsáveis por 94% das execuções.

A questão da pena de morte

Existem muitas razões contra a pena de morte. O Esquerda.net transcreve aqui um artigo , publicado em culturabrasil.org, de uma professora israelita, que esteve num campo de concentração Nazi, e que desmonta os argumentos a favor da pena capital, divulgando um conjunto de interessantes citações.

Bush e a pena de morte

Enquanto governador do Texas (1994 a 2000), George W. Bush destacou-se pela quantidade de execuções que assinou: mandou matar 152 condenados em 6 anos.
Só em 2000 (último ano do mandato de Bush) foram executadas 33 pessoas no Texas, o equivalente a metade do total de execuções nos EUA nesse ano. Quando questionado sobre este facto, Bush tropeçou nas palavras: "Tenho a consciência limpa em relação aos casos de pena de morte que já me passaram pelas mãos (no Texas). Não acredito que alguma vez tenhamos condenado um culpado...aliás...um inocente, à morte". E acrescentou que todos os processos que conduziram à pena de morte decorreram de forma séria, cautelosa e rigorosa.

Mumia Abu Jamal

Mumia Abu-Jamal foi condenado à morte em 1982, acusado da morte de um polícia, e vive desde então no corredor da morte do Estado da Pensilvânia. Por todo o Mundo, são centenas os grupos de activistas que têm manifestado a sua solidariedade com Mumia Abu Jamal contribuindo desta forma para evitar até hoje a sua execução.
Vários recursos interpostos desde então a nível estadual e federal já foram negados e a execução de Mumia já chegou a estar marcada, tendo sido impedida por um movimento internacional de protesto. O colectivo Mumia Abu Jamal (organização portuguesa) conta toda a história.

Vídeos contra a pena de morte

Publicamos seis vídeos contra a pena de morte. Dois vídeo da campanha a pena de morte em Itália e em Espanha (a fogueira), “uma história real” emitido na MTV, um rap sobre o corredor da morte, um vídeo inspirado na obra de Victor Hugo “O último dia de um condenado” e outro comemorando os anos da abolição da pena de morte em França.

A pena de morte não é alternativa para nada

Os professores universitários Hermenegildo Borges e Teresa Pizarro Beleza e o Presidente da Secção Portuguesa da Amnistia Internacional, António Simões Monteiro, respondem a perguntas sobre a pena de morte feitas por Fora de Linha, revista de jornalismo da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa.

Itália faz campanha contra a pena de morte

No segundo dia de 2007, o governo italiano anunciou que vai pressionar a ONU para declarar uma «moratória universal» à pena de morte. O anúncio foi feito poucos dias depois da execução de Saddam Hussein.

Portugal, pioneiro na abolição da pena de morte

Portugal foi um país pioneiro na abolição da pena de morte. Em 1867, a pena capital deixou de constar na lei portuguesa, exceptuando-se os crimes militares (cuja abolição viria apenas a ser decretada em definitivo no ano de 1976).
O seguinte texto da procuradoria-geral da república, publicado em 1997, resume todos os avanços e recuos.
"A abolição da pena de morte para os crimes políticos foi proposta na sessão de 10 de Março de 1852 da Câmara dos Deputados, em Aditamento ao Acto Adicional à Carta Constitucional. Iniciada a discussão em 29 de Março, as divergências incidiram apenas sobre o processo legislativo.

Links importantes sobre pena de morte

A questão da pena de morte desperta opiniões, acções e campanhas em todo o Mundo. Uma rápida pesquisa na net permite aceder a dezenas de sites dedicados ao assunto. Em português, existe um excelente site penademorte.enaoso.net, imprescindível para saber mais sobre a pena capital (estatísticas, artigos, últimas notícias, etc.).