Fórum "quente" termina com marcha em apoio à Palestina

Para Messaoud Romdhani, ativista da Liga Tunisina de Direitos Humanos e considerado um dos agentes-chave na organização do Fórum Social Mundial 2013, a mensagem transmitida na marcha final “foi clara”. “Não há hipótese de melhorias para a nossa região do Norte da África e do Oriente Médio em questões como a paz, a democracia e a justiça social sem que sejam buscadas soluções à questão palestina”, afirmou. Artigo de Maurício Hashizume, da Carta Maior.

07 de abril 2013 - 15:39
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Foto skasuga/Flickr

O Fórum Social Mundial (FSM) 2013 encerrou com uma larga e intensa manifestação de apoio à Palestina, que contou com maciça participação do público da própria Tunísia. 

“A mensagem transmitida na marcha final foi clara: não há hipótese de melhorias para a nossa região do Norte da África e do Oriente Médio em questões como a paz, a democracia e a justiça social sem que sejam buscadas soluções à questão palestina”, declara Messaoud Romdhani, ativista da Liga Tunisina de Direitos Humanos, considerado um dos agentes-chave na organização do FSM 2013 em território tunisiano. A população local, complementa Messaoud, mantém uma ligação histórica, cultural e política com o povo palestino. A situação em que vivem simboliza, em grande medida, o grau de intervenção externa experimentado pelo conjunto de países no que diz respeito à reivindicação da auto-determinação.

A militante do movimento das mulheres camponesas tunisinas, Chaibi Torkia, de 39 anos, levava no peito uma camiseta vermelha com uma mensagem de apoio à Palestina. Explica que a solidariedade demonstrada pelos participantes do FSM tem efeitos muito práticos. “A voz e a opinião são as nossas únicas armas. Não temos armas nem dinheiro. Estou convencida que se esta marcha não estivesse dentro do Fórum, mesmo neste ambiente em que vivemos após a queda da ditadura, a possibilidade de uma repressão policial violenta seria maior”.

Ao contrário da marcha de abertura do FSM, em que o policiamento tunisino se concentrou mais na organização do trânsito para a passagem dos participantes, foi mobilizado um contingente pesado de agentes para a marcha final. Durante o protesto, viram-se muitas faixas e ouviram-se gritos ritmados e palavras de ordem contra o atual governo do partido islâmico Ennahda, acusado de prejudicar o povo palestino em função dos estreitos vínculos mantidos com os Estados Unidos e Israel, especialmente por meio do emirado do Qatar. 

Segundo Chaibi, os governantes do Ennahda, sentados nas “cadeiras do poder”, não querem ver os povos livres, inclusive os palestinos, para que toda a região do Magrebe e do Maxereque possa viver processos democráticos “de verdade”. “Este partido islâmico não vai mudar a atual situação grave de crise política, económica e social, marcada pelos altos índices de desemprego. Há 30 anos, eles vêm usando a religião para os seus interesses. Querem dividir o país para impor as suas vontades”, critica a militante. “Mas esta marcha mostra uma grande unidade e apoio popular em torno de uma questão fundamental, que é a Palestina livre. Vai embora o Fórum, mas o grito fica”.

Ao longo de praticamente todo o Fórum, o tema da Palestina esteve muito presente, inclusive com atividades concorridas como a que contou com a participação de Tariq Ramadan, que se encontra disponível na internet. Uma tenda temática especial na Universidade El Manar concentrou a extensa programação e a Assembleia Palestina de Convergência reuniu muita gente no principal auditório do campus, numa espécie de “aquecimento” para a ampliada Assembleia dos Movimentos Sociais.

Movimentos sociais

Uma das principais atividades de todo o FSM, a Assembleia dos Movimentos Sociais em Tunes reforçou o clima “quente” que se notou na Tunísia. A liderança nacional do Partido dos Patriotas Democratas Unificados (PPDU), ao qual pertencia o oposicionista assassinado Chokri Belaid, Fathi Chamhki foi recebido com entusiasmo pelo público que encheu o auditório principal da Faculdade de Direito. “Há uma grande sintonia. O que ocorreu na Tunísia é uma prova de que 'outro mundo é possível'. Unidos, podemos fazer muito mais”.

Assim como ele, muitos outros representantes de movimentos e organizações sociais dedicadas a diferentes temáticas e das mais distintas regiões do mundo expressaram a importância do espaço de reciprocidade e de aprendizagem mútua proporcionado pelo Fórum para a continuidade das lutas. Ataques diretos ao sistema capitalista e evocações em prol da “revolução” contagiaram o público presente, principalmente nos atos de abertura da assembleia. Entretanto, após o terceiro dia seguido e repleto de atividades, muita gente preferiu deixar o auditório, na noite da última sexta (29), enquanto a declaração final, que prevê uma jornada mundial de mobilizações, era lida publicamente.

Foi aí que, na sequência da menção feita ao direito dos povos à sua autodeterminação e à sua soberania - não apenas da Palestina e do Curdistão, mas também de Sahara Ocidental –, se instalou um tumulto. Parte de militantes do Marrocos forçou a subida ao palco para expressar que eram contra o apoio ao povo sarauí. Diante de ameaças seguidas de empurrões, ativistas como o belga Eric Toussaint, do Comité de Anulação da Dívida do Terceiro Mundo (CADTM), tiveram de intervir para que a assembleia não terminasse em atos de violência generalizada. As vaias de reprovação daqueles que ainda permaneciam no auditório não impediram que o diminuto grupo marroquino descontente exibisse a sua bandeira, causando o pretendido tumulto e quebrando o ambiente de harmonia que vinha se dando até então.

Incidentes à parte, esta edição na Tunísia foi marcada, na opinião do brasileiro Chico Whitaker, um do co-fundadores do FSM, por uma “tensão”, indiscutivelmente advinda do contexto de agitação política em que vive o país, que injetou “energia e esperança” ao processo.


Artigo publicado no portal Carta Maior.

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