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Eco-socialismo

No debate “Ambientalismo de mercado vs eco-socialismo”, Ricardo Coelho fez uma apresentação que aqui divulgamos e divulgou um texto que publicamos, com o título “O que é o eco-socialismo?”.

O que é o eco-socialismo?

A definição mais simples de eco-socialismo parte da clássica distinção entre “verdes” e “vermelhos”, da qual decorre a tentativa de unificar duas tradições paralelas de activismo social. Mas este ponto de partida conduz-nos a uma definição demasiado simples e até enganadora, dado que assume erradamente uma associação entre socialismo e produtivismo. Na realidade, o socialismo produtivista é uma contradição nos termos, como a trágica experiência da URSS o demonstrou.

Podemos encontrar as raízes do pensamento ecológico socialista nos escritos de Marx. No primeiro volume de “O Capital”, Marx alerta para a contradição entre os sistemas sociais e os sistemas naturais, com base na ecologia política agrária. O contemporâneo Justus Von Liebig, um químico pioneiro da adubagem artificial dos solos, já havia alertado para a irracionalidade presente na agricultura industrial, que retira nutrientes do solo sem os repor. A violação do princípio da reposição leva assim ao duplo problema da redução de fertilidade dos solos e da poluição das águas citadinas com dejectos humanos. Marx, articulando este dilema ecológico com o modo de produção capitalista, desenvolve o conceito de falha metabólica como a perturbação da relação metabólica entre a humanidade e a natureza.

Também nos escritos de Engels podemos encontrar uma rejeição do produtivismo capitalista. Na sua “Dialéctica da Natureza”, Engels advertia que as vitórias humanas sobre a natureza são apenas temporárias, recorrendo aos exemplos dos povos que destruíram as florestas para obter terras aráveis e que sofreram depois as consequências drásticas da perda de reservatórios de humidade e da erosão dos solos. A finalidade da humanidade não é, assim, a de perseguir o impossível projecto de dominação da natureza, da qual, aliás, é parte integrante, mas antes a de usar a sua capacidade única de conseguir aprender as leis naturais para as aplicar correctamente.

Os escritores do “Manifesto Comunista”, contudo, não foram sempre coerentes com estes princípios, tendo-se deixado maravilhar pela máquina produtiva capitalista e associado o socialismo ao desenvolvimento contínuo das forças produtivas. O eco-socialismo de hoje procura corrigir esta falha, articulando a planificação da economia com os limites ao crescimento. Esta corrente desenvolve-se em oposição ao eco-capitalismo (incluindo a sua versão keynesiana) mas também se distingue do comunismo ortodoxo, de forte pendor anti-ecológico (a este respeito, consultar o “Avante”).

O sociólogo John Bellamy Foster definiu o eco-socialismo como a regulação racional da produção, respeitando a relação metabólica entre os sistemas sociais e os sistemas naturais, de forma a garantir a satisfação das necessidades comuns das gerações presentes e futuras. Inerente a esta definição estão alguns princípios essenciais:

  1. O reconhecimento dos limites ao crescimento e a ruptura com a lógica produtivista que associa o aumento do bem-estar a um aumento da produção. Colocar o prefixo “eco” na palavra socialismo implica conciliar a igualdade intra-geracional com a igualdade inter-geracional.

  2. A reformulação do sistema produtivo de forma a torná-lo dependente unicamente do uso de recursos renováveis. Articulando com o princípio anterior, a sustentabilidade exige um uso dos recursos renováveis a um ritmo que garanta a sua renovação.

  3. O uso social da natureza, privilegiando a gestão comunitária de recursos comuns.

Construir o eco-socialismo implica ir muito além de um mero “rebranding” do socialismo. Não basta defender pequenas mudanças no sistema produtivo que apenas arranham a superfície da biocrise que atravessamos. Não basta também apontar o dedo ao capitalismo, como se a superação da exploração humana levasse automaticamente à superação da exploração da natureza pela humanidade. Do que se trata é de compreender a crise ecológica como uma manifestação extrema da desigualdade no acesso aos recursos e da incapacidade de planeamento para a sustentabilidade que caracterizam o sistema de produção capitalista.

Há muito por fazer. Não podemos ser puristas nem pensar que podemos mudar o mundo de um dia para o outro. Devemos, portanto, defender reformas imediatas que reduzam o impacto ecológico do sistema produtivo (mesmo que impliquem uma redução dos lucros). Isto não implica, naturalmente, deixar de lado os princípios socialistas em nome da “defesa do planeta”, como fizeram muitos partidos verdes. Superando a dicotomia imobilismo/reformismo, devemos defender reformas não reformistas (usando o conceito do eco-socialista Patrick Bond), que mudem a relação de forças existente, abrindo o caminho a conquistas mais profundas.

De Copenhaga a Cochabamba, uma rede de movimentos pela justiça ambiental ganha raízes, confronta os grandes poluidores e constrói uma nova ordem mundial. O eco-socialismo é a única corrente política que pode dar uma resposta convincente às suas reivindicações. Saibamos estar à altura da tarefa.

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política: 
Socialismo 2010
(...)

Neste dossier:

Fórum Socialismo 2010

Neste dossier, agregamos todas as notícias e vídeos já publicados no esquerda.net sobre o Fórum Socialismo 2010. Divulgamos também os textos e apresentações de diferentes debates, elaborados pelos seus autores. Uma vasta fotogaleria está disponível no flickr. As fotos são de Paulete Matos.

A Grécia e Portugal: O que são CDS's

Neste debate, Mariana Mortágua fez uma apresentação com o título “A Grécia e os CDS”, que disponibilizamos, aqui em pdf.

Eco-socialismo

No debate “Ambientalismo de mercado vs eco-socialismo”, Ricardo Coelho fez uma apresentação que aqui divulgamos (aceda ao pdf) e divulgou um texto que publicamos, com o título “O que é o eco-socialismo?”.

Geopolítica do Petróleo

O debate sobre o tema Geopolítica do Petróleo foi apresentado pelo deputado do Bloco de Esquerda Pedro Filipe Soares, de quem publicamos aqui um texto com o mesmo título.

Impostos: Espíritos, letras e práticas

Publicamos aqui o texto “Espíritos, letras e práticas” (aceda ao texto em pdf) do deputado José Gusmão que coordenou o debate “Impostos: de onde vêm, para onde vão?” no Fórum Socialismo 2010.

Venezuelas

No debate sobre o tema "Venezuelas", Natasha Nunes apresentou uma comunicação. Aqui publicamos o seu texto “Venezuela: Ortodoxias e Heterodoxias da Política Económica e Social de Chávez”.

SNS: Nem rosa velho, nem laranja choque

No debate sobre o Serviço Nacional de Saúde participaram Sofia Crisóstomo e João Semedo. Publicamos aqui a apresentação feita pelo deputado João Semedo, SNS: Nem rosa velho, nem laranja choque. A resposta da esquerda (aceda aqui ao pdf).

Transporte ferroviário em Portugal

Publicamos neste dossier sobre o Fórum Socialismo 2010, a apresentação feita em Braga por Heitor de Sousa, economista e deputado do Bloco de Esquerda, sobre o tema questões do transporte ferroviário em Portugal (aceda aqui ao pdf).

“O ocaso da República”

Luís Farinha, Investigador no Instituto de História Contemporânea da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa falou ao esquerda.net sobre "O ocaso da República", tema que apresentou no Socialismo 2010 em Braga.

Luta dos trabalhadores na Europa

Florival Lança, antigo responsável pelo Departamento Internacional da CGTP, fala sobre as jornadas de luta dos trabalhadores europeus a 29 de Setembro.

Baixos salários e lutas do trabalho na China

Divulgamos a apresentação do tema “China: O império dos baixos salários e a onda grevista de 2010” (aceda ao pdf) feita por Carlos Santos.

Presidenciais: “Bloco é a única força que quer vitória para a esquerda”

Francisco Louçã resume neste vídeo as linhas essenciais da política do Bloco na rentrée, marcadas pelas lutas sociais, pelas eleições presidenciais e pelo Orçamento de Estado. 

Banco Público de Terras na Galiza (entrevista em vídeo)

Xosé Carballido Presas do Bloco Nacionalista Galego, que esteve presente no Socialismo 2010 fala da experiência do projecto do Banco Público de Terras na Galiza.

“Expor as verdadeiras motivações dos estados que promovem a guerra”

José Manuel Pureza, líder parlamentar do Bloco de Esquerda, defendeu, no Fórum Socialismo 2010, que a cimeira da NATO de Lisboa, em Novembro, é uma oportunidade de “mobilização social em torno da paz, do humanismo e contra a guerra”. Leia também resumos de outras sessões.

“Qual o papel dos gestores milionários?”

No segundo dia do Socialismo 2010, uma das primeiras sessões de debate de ideias foi protagonizada por Jorge Costa, do secretariado do Bloco de Esquerda, com o tema “Qual o papel dos gestores milionários?”

“O direito ao emprego: trabalho ou preguiça?”

José Soeiro, deputado do Bloco de Esquerda, participou no segundo dia do Socialismo 2010 através de um debate de ideias baseado na questão: “O direito ao emprego: trabalho ou preguiça?”

“Máximo empenho na manifestação sindical europeia de 29/9”

Florival Lança, ex-responsável pela relações internacionais da CGTP, foi um dos convidados do segundo dia do Socialismo 2010 para um debate de ideias com o tema “A luta dos trabalhadores europeus”.

“Os direitos de autor têm futuro?”

Neil Leyton, artista-intérprete e autor, apresentou no Socialismo 2010 uma sessão de debate lançando a questão: “Os direito de autor têm futuro?” Aceda aqui à apresentação

Desafios da Europa: Prioridade tem de ser combate ao desemprego

Na sua intervenção no final do segundo dia do Fórum Socialismo 2010, que está a decorrer em Braga, a eurodeputada Marisa Matias falou sobre os desafios da Europa e defendeu a prioridade ao combate ao desemprego e a necessidade de articular a intervenção da esquerda com as lutas sociais.

“A recomposição da esquerda foi sempre o objectivo do Bloco”

Na abertura do Fórum Socialismo 2010, que decorre neste fim de semana em Braga, Luís Fazenda falou sobre a recomposição da esquerda, que “não se faz com receitas velhas”.

Banco Público de Terras no Socialismo 2010

Xosé Carballido Presas, do Conselho Nacional do Bloco Nacionalista Galego e da Comissão de Política Agrária do BNG, participou, com uma sessão sobre o Banco Público de Terras e a experiência ocorrida na Galiza. Leia aqui o texto da sua apresentação.

Os profetas do apocalipse económico

Os economistas João Rodrigues e Nuno Teles participaram com uma sessão intitulada "Entre os especuladores e a lumpenburguesia". Leia aqui o texto de apresentação sobre os profetas do apocalipse eonómico.

Socialismo 2010: Um apoio à jornada de luta de 29 de Setembro

Luís Fazenda, em entrevista ao esquerda.net, anunciou que o fórum seria “um ponto de encontro e de troca de ideias”, dele saindo também um forte apelo à participação na jornada europeia de luta de 29 de Setembro e um apoio vincado ao candidato presidencial Manuel Alegre.

Onda grevista na China

Diversos analistas internacionais consideram que estas greves marcam o fim da era dos baixos salários na China. Será assim? O tema estará em debate no Fórum Socialismo 2010, apresentado por Carlos Santos, sob o título: China, o império dos baixos salários e a onda grevista de 2010.

Cinema e Micro-Resistências

Numa das sessões da iniciativa Socialismo 2010, Laurent Chavanel e José Cardoso Marques trouxeram ao debate o cinema e a imagem, falando sobre "os circuitos que dão origem a órgãos que se agregam e formam bolsas de micro-resistências".

Há feminismo sem feministas?

Numa das sessões da iniciativa "Socialismo 2010 - Debates para a alternativa", Sofia Roque trouxe ao debate as ideias do movimento feminista, a auto-organização das mulheres e as relações entre marxismo e feminismo.

“Ocaso da Primeira República (1924-1933)”

Numa das sessões do Socialismo 2010, Luís Farinha fez uma comunicação sobre o “Ocaso da Primeira República (1924-1933)”. Uma década na qual “o país experimentou um clima de confronto institucional fora do comum”.

A recepção é a arma do povo?

Numa das sessões do Socialismo 2010, João Teixeira Lopes falou de arte e práticas culturais do ponto de vista da recepção, um tema "que ganha particular sentido num contexto de proliferação das práticas culturais doméstico-receptivas".