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Condições prévias de participação dos movimentos sociais na arena legal

Vários países europeus têm vindo a promover um debate sobre as condições efectivas do acesso ao direito e à justiça nas sociedades actuais. Nessa discussão permanece negligenciado um eixo discursivo fundamental: a emergência de novos actores que reivindicam uma participação através do direito e da justiça – os movimentos sociais. Neste texto procedemos a uma análise das condições mínimas para essa participação, abordando os obstáculos que subsistem no acesso ao direito e à justiça. Longe de esgotar a discussão relativa a este tema, a presente reflexão pretende ser um contributo para uma maior visibilidade dos movimentos sociais enquanto sujeitos de direitos e da possibilidade, nem sempre concretizada, da sua acção na arena legal.

Texto de Madalena Duarte , disponível em versão integral no site do Centro de Estudos Sociais.

A acção colectiva por parte dos novos movimentos sociais privilegia, sobretudo, a esfera não institucional. Contudo, ao procurarem e exigirem espaços de diálogo, participação e negociação e ao reivindicarem uma protecção efectiva e progressiva dos seus direitos, os novos movimentos sociais têm vindo a reconhecer no recurso ao direito e aos tribunais vectores emancipatórios.

A emancipação através do direito só é, no entanto, possível quando a titularidade dos direitos extravasa a esfera individual e consegue abranger a titularidade colectiva, pelo que é insuficiente criar e proteger os direitos que os movimentos sociais reivindicam. É necessário igualmente que estes se constituam como sujeitos colectivos
de direitos, com legitimidade para recorrerem aos tribunais e fazerem uso dos mecanismos legais existentes. É deste modo que os novos movimentos sociais impõem uma discussão mais abrangente sobre o acesso ao direito e à justiça.

A emergência destes novos sujeitos de direitos tem vindo a desafiar a rigidez que caracteriza o sistema jurídico e judiciário, bem como a formação dos operadores desses mesmos sistemas, nomeadamente juízes, advogados e legisladores. A sua lógica de actuação, o modo como combinam formas de acção institucionais e não institucionais, e a politização de reivindicações supostamente técnicas e restritas ao domínio privado do
quotidiano, obrigam a que o sistema legal se reinvente e surja no que Boaventura Sousa Santos chama de espaços plurais de participação. Se me parece urgente que no debate sobre o acesso ao direito e à justiça se introduza a questão do acesso dos movimentos sociais, parece-me preocupante se tal for feito nos moldes em que se equaciona o acesso dos cidadãos individualmente considerados. Somente considerando os movimentos
sociais nas suas especificidades constitutivas e de actuação é que se pode consagrar a participação dos cidadãos, individual ou colectivamente organizados, na defesa e preservação de interesses difusos ou colectivos, criando-se um novo espaço de cidadania, que torne, de facto acessível o direito e a justiça.  

É este o grande desafio estratégico que se coloca ao sistema jurídico e judiciário desde há algumas décadas: garantir a tutela dos interesses colectivos ou difusos, permitindo que os movimentos sociais que por eles lutam se possam assumir efectivamente como sujeitos de direito. No esforço de concretização deste desafio, cabe ao judiciário, ao criar novas categorias jurídicas, extrair energias emancipatórias que lhe permitam a sua própria transformação.

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Neste dossier:

Desigualdades Sociais em Portugal

Portugal é dos países com menos justiça social da UE-25. Segundo dados da Comissão Europeia, a taxa de risco de pobreza após transferências sociais (cerca de 20 por cento) e as desigualdades na distribuição dos rendimentos (rácio superior a 8) são das mais elevadas na União.

O conflito sexual no seu auge e o medo de ousar

"O assassinato e as sevícias sofridas pela transexual Gisberta às mãos de um bando de rapazes no Porto não são um anacronismo isolado num país em que os direitos sexuais têm (apesar de tudo) evoluído. São a prova dos nove de como evoluiu pouco o muito que evoluiu. São ainda hoje, infelizmente, uma consequência normal das condições actuais". Em texto disponível no site do jornal Combate, Sérgio Vitorino, activista das Panteras Rosa, aborda a problemática da discriminação sobre homossexuais.

É Menino ou Menina?

A Comissão para a Igualdade dos Direitos das Mulheres divulga no seu site um conjunto de trabalhos que abordam a problemática das práticas discriminatórias exercidas sobre as mulheres. Destacamos algumas conclusões do trabalho de Virgínia Ferreira, da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, sobre "Relações Sociais de Sexo e Segregação do Emprego". Esta e outras recensões estão disponíveis no site da CIDM.

Condições prévias de participação dos movimentos sociais na arena legal

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A escola é reprodutora de desigualdades sociais

Em entrevista à Página da Educação , Angelina Carvalho, Licenciada em Línguas e Literaturas Modernas pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto (UP),  aborda a dimensão socializadora da escola, alguns dos factores que, de acordo com uma investigação que realiza, conduzem ao abandono escolar precoce e critica o "discurso hipócrita" sobre a escola de alguns fazedores de opinião pública.

Elites e desigualdades sociais em Portugal

Como sabemos, com a institucionalização democrática (1974) e a entrada na Comunidade Europeia (1986) Portugal iniciou uma nova etapa na via da modernização do país, procurando ao mesmo tempo aproximar-se dos padrões europeus de desenvolvimento e reduzir as gritantes desigualdades e injustiças sociais para que as nossas elites nos remeteram ao longo dos séculos. Com o fim do Estado Novo e a integração no pelotão dos países desenvolvidos da Europa teremos nós conseguido reduzir substancialmente essas desigualdades? Haverá hoje mais igualdade de oportunidades? Quais os principais contornos do actual processo de mudança social no que diz respeito à estratificação social e à renovação das elites na sociedade portuguesa?

Distribuição do Rendimento e da Riqueza

Documento de trabalho discutido no último Congresso da CGTP, que inclui análises da distribuição do rendimento e da riqueza, das desigualdades no mercado de trabalho e no acesso à saúde ou à educação, concluindo com as injustiças do sistema fiscal nacional. A versão completa deste estudo está disponível no site da central sindical, apresentando-se aqui apenas alguns dos seus pontos.