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Revisão da literatura – a legalização da canábis aumenta o consumo entre os jovens?

Uruguai e Canadá legalizaram a canábis recretiva em 2013 e 2018, respetivamente. Dois estudos recentes sobre o consumo recreativo oferecem-nos uma visão sobre o que pode ser a realidade após a legalização. Por Bruno Maia, médico.

 

Na revista “Preventive Medicine Reports”, Alexandra Zuckermann et al. (Março 2021)[1], apresentam-nos resultados de uma coorte prospectiva, o estudo COMPASS, que avaliou a utilização de canábis recreativa entre alunos do ensino secundário dos estados de Alberta, Colúmbia Britânica, Ontário e Quebec. Os autores analisaram o consumo antes e depois da legalização da canábis, durante um período de 4 anos, não tendo encontrado diferenças significativas em todas as variáveis estudadas. Concluem que a legalização da canábis não produziu alterações na frequência do consumo, nomeadamente não aumentou o consumo de canábis entre adolescentes após a legalização.

Na revista “International Journal of Drug Policy”, Hannah Laqueur et al., (2020)[2], publicam os resultados de um estudo que analisou o consumo de canábis e a percepção do risco associada, entre alunos do ensino secundário de áreas urbanas e rurais, nos anos antes e após a implementação da lei que legaliza a canábis. Os autores não encontraram qualquer evidência nos padrões de consumo ou percepção de risco.

m ambos os estudos, os autores ressalvam que os dados ainda são insuficientes para demonstrarem efeitos de longo prazo, uma vez que os processos de legalização ocorreram recentemente, não deixando de referir, no entanto, que a legalização da canábis, em ambos os países, carrega a expectativa de diminuir o consumo problemático da canábis. Há, ainda assim, diferenças nos quadros regulamentares que podem justificar resultados diferentes no futuro: o modelo uruguaio assenta na distribuição não comercial da canábis, com forte incentivo ao auto-cultivo e a modelos de pequenos produtores-consumidores, ao passo que o modelo canadiano é puramente comercial, embora altamente regulado. Como referem os autores do segundo estudo: “há uma vasta gama de políticas possíveis de legalização, não devendo o tema ser reduzido a uma escolha binária entre proibição e modelos comerciais”.

Os modelos de legalização são ainda muito recentes, mas o que ambos os estudos parecem confirmar é a previsão de que não é a legalização da canábis que aumenta o consumo da mesma, sobretudo entre os adolescentes. O que aliás está em linha com os dados dos países onde a substância ainda é proibida e onde o consumo da mesma tem vindo a aumentar nos últimos anos.

Zuckermann AME, Battista KV, Bélanger RE, et al. Trends in youth cannabis use across cannabis legalization: Data from the COMPASS prospective cohort study. Prev Med Rep. 2021 Mar 11;22:101351.
Laqueur H, Rivera-Aguirre A, Shev A, et al. The impact of cannabis legalization in Uruguay on adolescent cannabis use. Int J Drug Policy. 2020 Jun;80:102748.

Sobre o/a autor(a)

Médico neurologista, ativista pela legalização da cannabis e da morte assistida
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Esquerda Saúde 2

Revista Esquerda Saúde nº2

31 de Maio 2022

A edição de junho de 2022 já está disponível online e traz em destaque um dossier sobre investigação em saúde. Leia aqui a revista em formato pdf.

Editorial: Já está na altura de dignificar o trabalho médico?

31 de Maio 2022

Horas extra, precariedade, perda de salário e uma pandemia. Numa profissão que defende a humanização dos cuidados de saúde, não é compreensível que quem presta cuidados o faça sob condições desumanas. Por Tânia Russo, médica no Hospital Amadora-Sintra, dirigente sindical e deputada municipal em Sintra

EUA: O triunfo do conservadorismo contra as decisões das mulheres

31 de Maio 2022

O país encontra-se dividido entre os estados que permitem livremente o acesso ao aborto nas condições da lei (até às 24 semanas de gestação) aceitando mesmo mulheres de outros estados, e os que reduzem drasticamente as condições da lei, com sistemáticas represálias em relação aos profissionais de saúde que colaboram na prática de aborto.  Por Ana Campos, médica obstetra

 

“Das pessoas trans que recorreram ao SNS, mais de metade sofreu discriminação”

31 de Maio 2022

Entrevista a Jo Rodrigues, presidente da Anémona, uma associação de profissionais de saúde e seus aliados criada para aproximar os serviços de saúde das pessoas transgénero e não-binárias e combater a transfobia.

 

Hayek, Pinochet e os social-liberais entram num bar…

31 de Maio 2022

No Chile, a ‘reforma’ liberal é cara e ineficiente. Custa 7% do salário aos utentes, canaliza 50% dos recursos para 20% da população e os ganhos em saúde são alcançados pela resposta pública e não pela privada. Por Moisés Ferreira, dirigente do Bloco de Esquerda

O negócio vai bem (a Saúde nem por isso)

31 de Maio 2022

A faturação e os lucros dos grupos privados da saúde não pára de aumentar. Estes lucros crescentes não impedem que estas empresas sejam conhecidas por más práticas laborais. Por Maria Ribeiro, enfermeira emigrada na Bélgica

 

Inovação em Saúde: Importância da investigação clínica e de translação

31 de Maio 2022

A investigação clínica e de translação visa melhorar os cuidados de saúde e os prognósticos dos pacientes. É essencial para a melhoria do bem-estar das populações e deve estar ao alcance de todos. Por Maria João Carvalho, Investigadora do Instituto de Biomedicina, Departamento de Ciências Médicas da Universidade de Aveiro.

 

O papel do mercado no desenvolvimento de vacinas: Fonte de avanços ou força de bloqueios?

31 de Maio 2022

Parto para esta reflexão com base em dois exemplos muito concretos: o das vacinas de mRNA contra a COVID-19, que todos conhecemos, e o de uma vacina contra a malária, o principal foco de vários anos da minha investigação científica. Por Miguel Prudêncio, investigador principal do Instituto de Medicina molecular

Quem deve financiar a ciência?

31 de Maio 2022

Sem financiamento público, a investigação básica não fica assegurada. Sendo esta  investigação fundamental para o avanço do conhecimento, mesmo a investigação mais  aplicada fica em sérios riscos a longo-prazo sem um sério investimento a montante.  Por Ana Isabel Silva, investigadora em Ciências da Saúde no i3S.

Eutanásia: Uma lei contra a prepotência

31 de Maio 2022

As iniciativas dos partidos proponentes da despenalização, já entregues ou anunciadas, mostram que a Assembleia da República manterá o registo de responsabilidade e de tolerância que imprimiu a todo o processo anterior. Por José Manuel Pureza, dirigente do Bloco de Esquerda.

Cuidados paliativos: Direitos humanos em fim de vida

31 de Maio 2022

É prioritário investir na formação diferenciada em cuidados paliativos dos profissionais de saúde e criar novas unidades de apoio ao internamento paliativo na comunidade que permitam o controlo de sintomas e prevenção de complicações, aliviando o sofrimento, permitindo assim cuidados personalizados e de proximidade. Por Gisela Almeida, Enfermeira Especialista, Instituto Português de Oncologia, Coimbra

 

Acolher e cuidar dos refugiados

31 de Maio 2022

Embora a lei determine que o refugiado tem direito a cuidados de saúde no SNS, quem está nos serviços de saúde conhece bem que nem sempre são dadas as respostas céleres e adequadas aos refugiados que a eles recorrem. Por Sónia Pinto, enfermeira de família.

Açores: Para os profissionais de saúde, uma salva de… precariedade!

31 de Maio 2022

É verdade que o reforço de meios humanos foi necessário para o combate à pandemia, mas também o é para o normal funcionamento e recuperação de toda a atividade assistencial. Por Jéssica Pacheco, enfermeira, Açores.

Transformar o SNS, a agenda de um encontro à esquerda

31 de Maio 2022

Realizou-se a 21 de Maio o Encontro Nacional Sobre Saúde do Bloco de Esquerda, em Lisboa. Foram vários os contributos para o debate e destacamos aqui algumas breves passagens de cada um.

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