Vitória de Trump: um perigo por detrás do muro iniciado por Clinton

porCarlos Vieira

12 de novembro 2016 - 23:19
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Em 1.100 km de fronteira entre os EUA e o México já existem muros e vedações. Este muro, mandado construir em 1994, no governo de Bill Clinton.

Cartoon do ilustrador, artista plástico e cartoonista Wilfred Hildonen, de origem finlandesa, norueguesa, sami e cigana, cedido para ilustrar este artigo.

Os eleitores dos EUA, condicionados por um sistema eleitoral pouco democrático, uma vez que restringe a participação de partidos e candidatos que não tenham o apoio das elites políticas e/ou económicas que perpetuam um regime que já alguém classificou como de “partido único com duas cabeças”, acabam de eleger Donald Trump como presidente do país mais poderoso do Mundo no campo militar e o que ocupa o 9º lugar da lista Top Ten dos países mais ricos do mundo, segundo a revista Global Finance, após o colapso bolsista de 2008, de que tem vindo a recuperar lentamente.

Durante a campanha eleitoral, Trump escandalizou todas as pessoas que nos EUA e no resto do Mundo respeitam os direitos humanos (não foi por acaso que a organização criminosa e racista Ku Klus Klan lhe manifestou o apoio) ao fazer declarações ofensivas para com as mulheres, os imigrantes mexicanos que acusou de “violadores e criminosos”, os muçulmanos e os cientistas e ambientalistas que alertam para os riscos para o Planeta e para a Humanidade das alterações climáticas, ao negar-se a cumprir os Acordos de Paris.

A promessa eleitoral de Trump que mais marcou a campanha foi a de construir um muro na fronteira com o México para impedir a entrada de imigrantes e uma força de perseguição e deportação dos cerca de 11 milhões de “alienígenas ilegais”, anulando o programa de legalização de 800 mil jovens que entraram nos EUA quando ainda eram crianças, com os seus pais, e ainda de suspender os apoios aos municípios que se recusem a expulsar imigrantes “ilegais”. Ameaçou ainda o México de o obrigar a pagar o custo do muro.

Ora, acontece que em 1/3 dos 3.000 km de fronteira entre os EUA e o México, ou seja em cerca de 1.100 km, já existem muros e vedações, para além de acidentes geográficos difíceis de atravessar e de vedar, pelo que a maioria dos latino americanos que entram sem documentos nos EUA não o fazem por via terrestre, e muitos dos que arriscam morrem no deserto de Arizona, ou são abatidos por atiradores furtivos ao pisarem território norte-americano. Mais de dois milhões foram detidos pelas autoridades fronteiriças, nos últimos cinco anos. Este muro, mandado construir em 1994, no governo de Bill Clinton, chega a cortar localidades, separando populações e famílias, além de impedir o acesso de alguns animais às fontes de alimentação. Barack Obama prolongou o muro e dobrou o número de vigilantes, num reforço de fiscalização da fronteira que o seu antecessor George W. Bush já tinha iniciado após o 11.09.2011. Ao mesmo tempo, empresas norte-americanas e multinacionais fixam-se junto à fronteira, em Tijuana, Juarez e outras cidades, aproveitando a mão-de-obra barata e sujeita ao mais duro trabalho precário. As autoridades dos EUA chegaram a multar uma empresa contratada para a construção do muro que estava a recorrer a trabalhadores mexicanos indocumentados.

Lembram-se de um estudo realizado há meses atrás nos EUA que apontava Bernie Sanders como o único candidato democrata que poderia bater Trump? Pois é, o partido simbolizado por um burro preferiu apostar em Hillary, fiel serventuária do sistema capitalista, em vez de confiar na alternativa levemente socialista de Sanders, a única que efetivamente tinha autoridade para desmascarar a hipocrisia de Trump, esse beneficiário do sistema decadente, injusto e corrupto de que fingiu ser alheio, enganando o eleitorado desorientado pelo desemprego e pela regressão do nível de vida. Nos EUA, tal como na Europa, os liberais e os irrelevantes centristas mais ou menos sociais-democratas abrem as portas à extrema-direita de Trump, de Le Pen (Marine foi das primeiras a felicitar Trump pela vitória) e quejandos. Até ganhar força maioritária a alternativa da esquerda insubmissa e socialista que em Portugal e em Espanha já começou a meter o pauzinho na engrenagem ferrugenta do bipartidarismo rotativista.

Carlos Vieira
Sobre o/a autor(a)

Carlos Vieira

Ativista associativo na defesa dos Direitos Humanos. Militante do Bloco de Esquerda. Escreve com a grafia anterior ao acordo ortográfico de 1990
Termos relacionados: , Eleições Presidenciais dos EUA 2016