Quis o destino que nós, habitantes do concelho de Loures, assumíssemos durante os últimos meses o papel de cobaias de uma tendência internacional que tem rendido frutos a quem dela tem feito uso além-fronteiras.
A receita era simples: pegar num desses comentadores da bola da TV – desses mesmo que nunca deixam ninguém falar, repetem clichés até à exaustão e pensam que fazer-se ouvir é subir o tom de voz uma dúzia de decibéis -, acrescentar umas frases feitas e escolher um grupo na sociedade em que fosse fácil “bater”. A sorte calhou aos ciganos, mas bem podia ter calhado aos romenos, aos ucranianos ou aos naturais das ilhas Fidji, caso houvesse uma mão cheia deles em Loures. Depois, era só polvilhar a comunicação social com meia dúzia de atoardas, atear o rastilho em zonas mais sensíveis do concelho e deixar a marinar até às eleições.
Pouco habituada a lidar com o fenómeno, a habitual propaganda do porco no espeto lá ia guinando, ora para um lado, ora para outro, dando tiros nos pés e abrindo uma autoestrada aos pioneiros do populismo que, a páginas tantas e a fazer fé nas sondagens que brotavam nos jornais, ao sabor de quem as encomendava, já apontavam à vitória final.
O Ratatouille da concelhia laranja esfregava as mãos de contente e ia avançando os peões no tabuleiro de jogo, uma freguesia atrás da outra. Com o que o aprendiz de César não contava era com uma oposição feroz e de primeira linha - não de uma valente aldeia gaulesa, ao estilo de Uderzo -, mas de um grupo acérrimo de pessoas com valores e ideais bem vincados e uma enorme vontade de não deixar florescer em Loures a semente do ódio, do racismo, da xenofobia e da demagogia barata.
O populismo não venceu em Loures, mas deixou no concelho – e no país – a ideia (suportada por resultados concretos) que esta estratégia, se feita com pés e cabeça e com outros intervenientes, pode ser uma ameaça real. Por entre portas travessas, já se sabe que o venturismo quer assentar arraiais em Loures e fazer do concelho uma incubadora de potenciais intérpretes desta nova “escola”. E, daqui, partir para objetivos mais ambiciosos no âmbito e no resultado final.
Cabe-nos a nós, que estivemos na primeira linha da oposição ao populismo, ganhar forças, reagrupar e mostrar-nos mais coesos do que nunca. Enquanto o establishment se entretém a dividir lugares para reinar, certo, na sua arrogância habitual, do que é seu por direito, a semente do venturismo ameaça crescer e germinar – devidamente regada nas redes sociais – para florescer em força daqui por quatro anos, se não for mais cedo, dada a crise de ideias, valores e resultados que impera no reino laranja.
Para nós, que de saloios só temos a alcunha, a luta começa agora! Antes que seja tarde demais!