Uma sugestão para Rui Moreira

porJosé Soeiro

11 de setembro 2023 - 18:42
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Moreira tem duas hipóteses: ficar na história como o presidente que destruiu um dos viveiros culturais mais dinâmicos e impressionantes do país ou construir uma solução para preservar o STOP.

Mais uma vez sem qualquer diálogo prévio com os músicos e lojistas do STOP, Rui Moreira anunciou que estes iriam ter dez dias para abandonar o edifício, porque era intenção da Câmara do Porto fechá-lo. A que se deve esta nova cambalhota na posição da autarquia? Alegadamente, a um relatório da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC) sobre as “patologias” do edifício. Sucede que o anúncio da Câmara não decorre do relatório, porque este não determina o encerramento do STOP, mas sim a reposição da legalidade, que pode ser garantida com obras de correção ou alteração.

As declarações de Moreira, que se baseiam num parecer pedido pelo próprio aos serviços jurídicos da Câmara, têm aliás esta extraordinária nuance: diz o autarca que, se os donos corrigirem as “patologias imediatas”, o centro pode “reabrir ou até, porventura, não fechar”. Afinal é possível corrigir, em dez dias!, os principais problemas de segurança que impediriam a manutenção dos músicos naquele espaço. Se é assim, por que razão não se empenha a Câmara em apoiar as alterações necessárias?

A informação do relatório da proteção civil não é nova. É novo é que esteja sistematizada. O que faria com ela uma Câmara sensata? Solicitaria à ANEPC a indicação clara das “medidas adequadas de tutela e restauração da legalidade urbanística” a executar “de imediato” (para utilizar as expressões do relatório). Avaliaria os recursos necessários para resolver os problemas mais urgentes. Reunir-se-ia com proprietários e músicos (cerca de 500) para discutir o relatório e encontrar soluções. Declararia o interesse público do imóvel. Procuraria o apoio do Ministério da Cultura para salvar este polo cultural único no país. Não faltam casos internacionais nos quais se inspirar.

Há muito tempo que o STOP deixou de ser uma mera questão da “iniciativa privada”, como agora sugere Moreira. É um imóvel com uma atividade de interesse público, construído ao longo de anos, que não pode ser artificialmente deslocalizado e que não devia ser aniquilado. A Câmara pode exigir coercivamente obras aos proprietários e pode, caso estes não assumam essa responsabilidade, fazer as obras e assumir a gestão do espaço até que os valores em dívida sejam ressarcidos. Poderia até dinamizar e rentabilizar os espaços que estão vazios, como a sala de cinema (que pertence à NOS mas está ao abandono) e a dancetaria, e com isso cobrir o investimento.

Moreira, que está à frente da autarquia há dez anos e que há dez anos conhece os problemas do STOP, sabe perfeitamente disto. Tem duas hipóteses: ficar na história como o presidente que destruiu um dos viveiros culturais mais dinâmicos e impressionantes do país, ou construir uma solução para preservar o STOP. Em ambos os casos, o que acontecer será exemplar. Moreira parece obcecado com a primeira hipótese, mas ainda vai a tempo da segunda. Não é assim tão difícil. Seria preciso, para começar, o mais importante recurso que tem faltado: vontade.

Artigo publicado em expresso.pt a 6 de setembro de 2023

José Soeiro
Sobre o/a autor(a)

José Soeiro

Dirigente do Bloco de Esquerda, sociólogo.
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