Uma escolha maior

porCarlos Carujo

16 de setembro 2010 - 23:00
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Em política muitas escolhas disfarçam-se de inevitabilidades para melhor impor a sua autoridade. Agora dizem que tem de ser assim porque querem construir uma fábrica de cimento às portas da cidade de Rio Maior...

É banal notar que em política muitas escolhas se disfarçam de inevitabilidades para melhor impor a sua autoridade: a força do que tem de ser é, por vezes, apenas a força dos que querem que assim seja. E é comum ver essas escolhas enfeitadas por um arraial de peritos: a força de quem pode instrumentaliza saberes para declarar como tem de ser. Ainda assim, as escolhas desmascaram-se enquanto tal mais não seja no sentimento que não tem de ser e nas paisagens mentais cheias de possíveis e de contrafactualidades que mostram que podia ser de outra forma.

Agora dizem que tem de ser assim porque querem construir uma fábrica de cimento às portas da cidade de Rio Maior, em plena área de Reserva Ecológica Nacional e de rede Natura, quase na zona do Parque Natural da Serra de Aire e Candeeiros. Tem de ser assim porque não há outra forma de contrariar a desertificação rural, porque o “progresso” e a livre iniciativa o ditam. Mas sabemos como é uma escolha e como muda a paisagem. Definitivamente porque destrói o potencial de desenvolvimento da Serra dos Candeeiros condenando-a a ser uma enorme plantação de pedreiras rodeada por uma nuvem poluidora. Aqui a escolha é entre um modelo de desenvolvimento poluente e predatório e a possibilidade de um desenvolvimento rural sustentado, uma escolha entre preservar um património natural e abandoná-lo à mercê da vontade de lucro fácil da Tecnovia. Sim, as inevitabilidades são anónimas mas as escolhas têm nomes e moradas.

Daí que, para esta região, estejamos perante uma escolha maior. E as organizações não governamentais Oikos, Geota e Quercus já se posicionaram ao salientar os elevados custos ambientais da decisão e ao denunciar o carácter parcial e insuficiente do estudo de impacte ambiental encomendado pelos promotores. Estamos do mesmo lado.

A decisão final tentará passar despercebida e não terá cerimónia televisiva. E, no entanto, há uma maravilha natural em causa. Curioso como não se vota para que as maravilhas naturais sejam destruídas… Mas não deixamos de ter escolha. A escolha é não nos resignarmos a ver a Serra dos Candeeiros engolida por uma cimenteira. E temos o dever de mostrar que o desenvolvimento rural pode ser diferente das sagradas inevitabilidades.

Carlos Carujo
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Carlos Carujo

Professor.
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