A direita açoriana (PSD, CDS e PPM) aprovou uma proposta do Chega que remete para o fim da lista de espera para entrar na creche as crianças filhas de pais desempregados.
Não é possível dissociar a aprovação desta medida com o apoio que o Chega tem garantido ao governo do PSD/CDS/PPM nos Açores. Para garantir o apoio do Chega, a direita que ainda mantém a designação de “Social Democrata” e a que se classifica como “Democrata Cristã” validou politicamente o mais abjeto preconceito de classe.
Nos Açores é conhecido que o inimigo número 1 do Chega são os beneficiários do RSI que são alvo de permanentes insultos por parte dos deputados e militantes desse partido. Agora o ódio dirige-se também aos desempregados e seus filhos.
Não há dúvidas que a medida tem um caráter segregador. O PSD e o CDS, que governam os Açores, com o seu aval político tornou aceitável, não só a culpabilização de desempregados pela sua condição, como vai mais longe: torna aceitável castigar as crianças pela condição social dos seus pais.
Na região mais pobre do país, que empobreceu ainda mais nos últimos anos, uma medida com estas características cava mais fundo o fosso das desigualdades e compromete o futuro das crianças. Viola os mais básicos princípios de humanismo, os direitos das crianças e a constituição.
Depois das “pessoas de bem”, o Chega quer decidir quais são as “crianças de bem”. E o PSD aplaude. E depois da creche, o que se segue?
A falta de vagas em creches, resulta do aumento da procura - devido a vários fatores conjugados - e da ausência de investimento na construção e ampliação de creches nos Açores. A necessidade de investimento na construção de novas creches de modo a criar-se uma verdadeira rede universal e gratuita de creches nos Açores é mais do que óbvia.
O líder parlamentar do PSD na Assembleia Legislativa dos Açores, em artigo publicado no jornal Observador afirma, em sua defesa, que o Governo Regional dos Açores de direita aumentou de 700 para 4000 o número de vagas em creche nos Açores desde o início da legislatura. Se dúvidas houvesse de que os números não são verdadeiros, o próprio contradiz-se quando dias mais tarde publica outro artigo no jornal Açoriano Oriental, em que fica claro que esse número diz respeito a vagas gratuitas, o que é muito diferente.
Mas ainda assim subsistem dúvidas quanto aos números reais, a Secretária Regional da Saúde e Segurança Social, Mónica Seidi, afirmou recentemente que o número de vagas em creche nos Açores passou de “3.019 lugares em 2019 para 3.660 em 2023”.
Sabemos, através de dados oficiais do governo regional dos Açores, que em novembro de 2022 havia 2897 crianças nas creches com protocolo com a segurança social nos Açores e 847 crianças em lista de espera. E sabemos, através do relatório da execução do plano de investimentos da região, que dos 9 projetos de investimento em creches, apenas um foi concretizado.
Ao invés da resposta necessária e urgente: o investimento no aumento de vagas, o PSD-Açores e a restante direita que governa os Açores, opta pela solução da extrema-direita com a agravante de procurar, com desinformação, querer fazer crer à opinião pública que fez o trabalho de casa.
A única resposta possível à falta de vagas nos Açores é a criação de uma rede de creches que garanta o acesso a todas as crianças.
Já é mais do que tempo de tornar universal o acesso à creche, mantendo o seu caráter facultativo, investindo o necessário para o concretizar a breve prazo. Esta é a solução inclusiva em oposição à segregação que a extrema-direita propõe com o aval do PSD-Açores e do governo regional. Porque todas as crianças dos Açores são de bem.
Artigo publicado em Observador a 28 de julho de 2024