Segurança Social e recibos verdes

porMariana Mortágua

22 de dezembro 2017 - 22:34
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O novo regime não resolverá o problema da precariedade ou dos falsos recibos verdes (para isso foi aprovada a Lei Contra a Precariedade), mas faz justiça com todos aqueles que há anos se debatem com um sistema injusto e ineficaz.

Pagar muito para muito pouca proteção, e de acordo com os rendimentos de há um ano, que podem estar desfasados dos atuais. É esta a atual relação dos recibos verdes com a Segurança Social. O resultado é o inferno que tantos conhecem: descontos pelos mínimos possíveis, um constante abre e fecha de atividade e, ainda assim, dívidas e penhoras que não parecem ter fim. A longo prazo, o que estamos a construir é um exército de pessoas com carreiras contributivas miseráveis, e uma correspondente descapitalização do sistema de Segurança Social.

Há anos que se fala em alterar este regime que, a beneficiar alguém, não é de certeza quem trabalha. Mas o assunto é complexo e delicado. Repartir o esforço de proteção implica desenhar um sistema de contribuições mais justo, chamando a contribuir quem até agora estava isento - o contratante, por exemplo - ou que o fazia abaixo do que devia.

O acordo entre o Governo e o Bloco de Esquerda significa uma alteração estrutural deste regime, respondendo finalmente às preocupações e exigências dos trabalhadores a recibos verdes. O que muda, então?

A taxa contributiva passa de 29,6% para 21,4%. Deixará de ser calculada com base em escalões fixos, e passará a contar com o rendimento relevante do último trimestre. Para os meses em que não houve rendimento, ou em que foi pequeno, é criada uma contribuição de 20 euros mensais. As entidades contratantes responsáveis por uma parcela entre 50% e 80% do rendimento do trabalhador passarão a pagar uma taxa de 7% e, acima de 80%, uma taxa de 10%. Os trabalhadores dependentes que também passam recibos verdes deixam de estar isentos de Segurança Social na parte dos recibos verdes, se esse rendimento for superior a 2449euro mensais. A taxa, de 10%, aplica-se apenas ao rendimento que exceder esse valor.

Para além da garantia de uma melhor reforma no futuro, a proteção presente aumenta. Passa a bastar um ano (em vez de dois) de descontos para aceder ao subsídio de desemprego e que o rendimento venha em 50% da mesma entidade (antes era 80%). O subsídio de doença passa a ser devido a partir do 10.º dia, e abre-se o acesso ao subsídio para acompanhamento a filhos. Finalmente, as dívidas à Segurança Social deixam de ser motivo de perda de proteção, desde que exista um plano de pagamento a prestações.

Este regime não resolverá o problema da precariedade ou dos falsos recibos verdes (para isso foi aprovada a Lei Contra a Precariedade), mas faz justiça com todos aqueles que há anos se debatem com um sistema injusto e ineficaz. Era por isso muito aguardado e, em 2018, será finalmente realidade.

Artigo publicado no “Jornal de Notícias” a 19 de dezembro de 2017

Mariana Mortágua
Sobre o/a autor(a)

Mariana Mortágua

Deputada. Dirigente do Bloco de Esquerda. Economista.
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