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Símbolo

Uma democracia que vive só de partidos é uma democracia pobre, tanto quanto aquela que os dispensa.

Sou militante e dirigente do Bloco de Esquerda, deputada no Parlamento Europeu. Acredito nos partidos políticos como actores fundamentais em democracia. É do conhecimento geral que o Bloco de Esquerda não se apresenta em listas próprias às próximas eleições autárquicas, apoiando a lista do Movimento Cidadãos por Coimbra. Sumariamente está feita a minha declaração de interesses.

Como se sabe, o Movimento é composto por um conjunto heterogéneo de pessoas, com trajectórias e modos de pensar diferentes, com e sem militâncias partidárias passadas, com e sem apreço pelos partidos políticos e, sim, com um objectivo comum expresso num programa concreto para a cidade.

Quero falar sobre o desfecho do braço-de-ferro levantado pelo PSD e pelo PS ao Movimento Cidadãos por Coimbra. Estes dois partidos têm partilhado a governação da cidade nas últimas décadas. São responsáveis maiores pela degradação e asfixiamento de uma cidade que se foi habituando a perder. Perder centralidade, perder qualidade de vida, perder postos de trabalho, perder cultura, perder urbanidade, perder mobilidade. Estas perdas sucessivas e o assumir de responsabilidades deveriam estar no centro da preocupação do PSD e do PS na disputa autárquica, mas não. Ambos decidiram que o mais importante seria retirar ao Movimento de Cidadãos o “slogan” e o símbolo, apresentando queixas em tribunal. A decisão foi contrária às intenções do PSD – “por Coimbra” não foi considerado desiderato exclusivo deste partido –, mas favorável à queixa do PS, impedindo o movimento de se apresentar a eleições com o seu símbolo, passando a ser representado na lista de voto com um outro símbolo, numérico e romano, o “IV”.

Uma democracia que vive só de partidos é uma democracia pobre, tanto quanto aquela que os dispensa. Uma democracia em que a política é deixada exclusivamente aos “políticos” é coxa, esquece que a política é muito mais vasta e é feita de todas e de cada uma das escolhas quotidianas. Uma democracia que ignora o descontentamento e o desespero de quem já não acredita tem vistas curtas. Não perceber o que leva cidadãos e cidadãs a constituírem-se em listas para disputar os destinos das suas vidas e fazer deles e delas um alvo a atacar é apenas mais um sinal das prioridades de quem tem governado a cidade nas últimas décadas. PSD e PS tinham a oportunidade de mostrar que o Movimento está enganado, que as suas propostas não são as melhores, que o seu programa não serve a cidade. Não o fizeram e optaram por tentar derrotar o Movimento pelo “slogan” e pelo símbolo. A razão é simples: não têm proposta nem programa, não têm ideias a disputar. Essa é mesmo a maior tristeza de tudo isto.

Sobre o/a autor(a)

Eurodeputada, dirigente do Bloco de Esquerda, socióloga.
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