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A queda dos impérios

Tal como no tempo do império romano, hoje a tática é empobrecer e isolar a vítima para melhor dominar e saquear. A troika sabe-o perfeitamente.

A crise capitalista abrange o imperialismo num contexto global, escudada numa democracia dissimulada à dimensão das elites que promovem a corrupção económica. Este modelo social é servido à la carte e dirigido pela classe política eleita que governa para preservar a “ordem” e garantir a oligarquia monopolista em defesa dos interesses da maniqueísta burguesia financeira. Dos imperialismos europeu-americano, nipónico e aos que aparentemente se encontram adormentados (Rússia e China), dominam os impérios económicos dos credores sobre os povos numa luta de David e Golias.

Da história antiga, aprendemos que o imperialismo foi escoltado de manobras económicas como aconteceu com o império romano. A saga continuou com Hitler e os americanos ao imitarem os romanos na produção desmesurada de moeda para garantir a sua força imperialista e sustentar exércitos pesados. Tal como no tempo do império romano, hoje a tática é empobrecer e isolar a vítima para melhor dominar e saquear. A troika sabe-o perfeitamente. Tal como os assassinatos de vários imperadores romanos, hoje assistimos ao abate de ditadores como Saddam e Kadhafi; as encenações da diplomacia imperialista têm como objetivo a hegemonia política em regiões estratégicas que permitam responder à crise socioeconómica. Neste contexto perante a inoperância do Concelho de Segurança, depois da Líbia e da obstinação da América do Sul, os EUA centram-se na Síria de Bashar al-Assad onde se contam várias dezenas de milhares de vítimas e mais de 200 mil refugiados. As tensões são conhecidas na região que podem envolver o parceiro Israel, cujo exército perpetua crimes contra a humanidade e as pretensões legítimas dos palestinianos; existe também o temor da constante ameaça iraniana e dos interesses económicos dos EUA, mas este é mais um dos sinais da primavera árabe contra a ditadura tal como os tunisinos e os egípcios.

A ONU abona e serve de escudo ao imperialismo que sustenta a expansão capitalista, assente na especulação da ditadura do capital financeiro que assegura a exploração, a ganância e a acumulação de riqueza. A mesma ONU que permitiu a intervenção nos Balcãs, na Somália e que se absteve no Iraque; a mesma ONU que branqueia as ações da Nato, o braço militar do imperialismo global a partir do Pentágono. Esta posição toma contornos obscuros quando estão em causa exércitos privados como a Blackwater EUA (Virgínia) e negócios de armamento militar envolvendo empresas como a norte-americana General Dynamics1 (Virgínia), com a participação de Paulo Portas & CIA e as ligações ao império Carlyle Group2 de Frank Carlucci3, condecorado por Paulo Portas em 11/03/2005, de onde resultaram as compras ruinosas dos Pandur e submarinos. Não deixa de ser curioso que em 2004 no governo de Durão Barroso / Paulo Portas, o Ministro dos Negócios Estrangeiros, Martins da Cruz, negociou a entrada de Carlucci na Galp, com Américo Amorim e Isabel dos Santos; não deixa de ser também preocupante, as ligações perigosas entre o governo português e a espionagem internacional privada como a que ficámos a conhecer através da Wikileaks sobre a empresa de espionagem Stratfor e as manigâncias para a alienação selvagem de setores estratégicos da economia.

A indústria da morte não é atingida pela crise, antes pelo contrário, é desde sempre o braço forte das ditaduras imperialistas que jogam com a vida dos povos para garantir os impérios. Um bom exemplo disso são as estranhas ligações trazidas à luz pelo escândalo BAE4, no qual além das muitas “comissões” na compra e venda de equipamento militar, com a estranha ligação das ditas comissões de vendas de armas entre a família real britânica e a família real saudita, envolvendo o financiamento direto de grupos extremistas islâmicos. A participação de bancos europeus e americanos como financiadores da indústria militar e armas nucleares é camuflada pelos governos como um dos eixos do capitalismo imperial, com escândalos bancários ao nível do terrorismo e do tráfico de droga como o recente caso do gigante britânico HSBC, com outras instituições também sob suspeita.

A Europa tem tido várias fases de restabelecimento e afirmação do capitalismo. Miguel Portas5 questionava, num artigo seu, se a Perestroika não seria uma câmara de passagem para a restauração do capitalismo; hoje vejo na Catastroika também uma forma de reconfiguração do capitalismo neoliberal, em capitalismo neoconservador. Tal como na Perestroika, vamos assistir a um novo ciclo com a previsível derrocada, numa conjetura em que quem não está no sistema está contra o sistema e é derrotado (Grécia-Syriza); manda o sistema, que no mundo dos negócios ou se é ladrão ou espoliado, corrupto ou enganado. É violento, mas são as regras insofismáveis da economia cruel onde se permitem os offshore para fugir aos impostos e ocultar a corrupção dos gangsters da finança; onde se dá soberania à musculada economia alemã em ampla promiscuidade com a economia americana e chinesa, à revelia da crise europeia e do recorde histórico do desemprego da zona euro. Até nas hostes imperialistas surgem protestos como o manifesto dos economistas alemães que acusam a U.E. de assumir coletivamente as dívidas dos bancos do sistema do euro, com a proposta de união bancária na última cimeira. Já todos perceberam que o euro tem pela frente um braço de ferro com o ensombrado dólar, nesta guerra monetária de cariz imperialista…

A Europa consente o crime económico e a especulação financeira através de taxas de juro extorsionárias, à custa da chantagem ameaçadora dos mercados financeiros. E neste desastre económico, o desastre social é uma realidade que abrange todos, mas em especial, os mais fragilizados da sociedade. Aqueles que, além de não terem proteção do poder, são ainda esmagados com aumentos de impostos, cortes de bens essenciais, de serviços públicos e redução dos apoios sociais. Todos estes ficam na situação de náufragos que ficam sem acesso ao bote salva-vidas, bote esse, ainda reservado à classe exploradora. Assistimos à luta desigual de classes, onde a burguesia exploradora sobrevive à custa da classe explorada impelida para o nacionalismo que conduz ao capitalismo de estado, criando um ciclo vicioso. Na Grécia e um pouco por todo o mundo (primavera árabe), assistimos a sinais de mudança mas a realidade das pressões e da chantagem ditam a continuidade, mas até quando?

Cabe agora aos que não se revêm no capitalismo marcar as suas posições e lutar como se de uma batalha final se tratasse, na qual todas as forças são poucas contra um capitalismo de estado e uma globalização pró-capitalista. Reconheço que estamos a assistir a reconfigurações inter-imperialistas (imperialismo global), em resposta aos movimentos populares, por isso é determinante e urgente a tomada de consciência de que está na mão dos povos, provocarem a queda dos impérios.


1 Empresa de fabrico de material militar como os F16, Pandur, submarinos Tridente e os Tomahawk cruise missile, tão apreciados por Barak Obama…

2 Grupo de onde a família Bin Laden retirou 2,02 milhões de dólares em 2001, um dos mais importantes fornecedores do Pentágono e com ligações muito fortes à família Bush.

3 Antigo embaixador em Portugal, diretor-adjunto da CIA e da Carlyle - suspeito de tráfico de armas.

4 BAE Systems na Grã-Bretanha.

5 Teu nome, Socialismo

Sobre o/a autor(a)

Analista. Membro do Bloco de Esquerda.
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