António Félix Rodrigues, professor de física, ciências atmosféricas, geometria, música, arqueologia e de tudo o mais que se lembrar de estudar entre o dia em que escrevo este artigo e o dia em que o mesmo será publicado, decidiu, tecer um conjunto de acusações infundadas, mal substanciadas, e pejorativas, perante um anterior artigo, da minha autoria, onde se procurava apelar ao coração de todas e de todos os açorianos para salvar o património que é de todos nós.
Esse assunto, para quem não se decidiu a ler as insinuações do senhor professor, prende-se com uma descoberta de um naufrágio de elevado valor patrimonial, assim classificado por especialistas em arqueologia subaquática, durante a empreitada do Porto de Pipas, em Angra do Heroísmo. Procurei pedir, como aproveito para o fazer novamente, junto de todas e de todos os açorianos, para que continuem a lutar pelo que é seu, como lutaram no passado, face aos interesses dos grandes grupos económicos, que só sabem ganhar dinheiro à custa do betão e da demolição da nossa herança comum.
É curioso, em primeiro lugar, porque já no passado assistimos a artigos com teor semelhante, por parte do senhor professor. Momentos inflamados em que se apelava à mudança nas políticas governamentais para defender o património da Terceira e dos Açores. Quando o património é “dele”, importa ficarmos angustiados e defendermos a sua preservação, contra uma qualquer conspiração tenebrosa da qual ele tem provas, mas nunca as apresenta. Quando são especialistas em arqueologia, com adequada e necessária formação e validação institucional, a afirmar a sua importância, aí já é preciso olhar para as coisas como deve de ser. Assinala-se, portanto, uma imparcialidade gritante.
Quanto a questões relacionadas com especialistas, importa, em primeiro lugar, referir duas inverdades mencionadas pelo professor. Apresenta uma listagem de alguns dos diferentes achados que os arqueólogos responsáveis pelo acompanhamento da empreitada no Porto de Pipas detetaram, mas esqueceu-se de referir que esses mesmos arqueólogos também assinam o relatório dos especialistas onde se refere a grande importância do naufrágio agora descoberto. A equipa de arqueologia é a mesma, apenas auxiliada por investigadores externos, numa matéria concreta de arqueologia subaquática. Algo que talvez devessem os professores universitários ensinar mais frequentemente aos seus alunos. A ter mais dúvidas e consultar mais os seus pares, sabendo ouvi-los, sem inflamar ódios ou frustrações pessoais.
Esses especialistas levantaram então várias dúvidas, incluindo sobre passíveis datações, e António Félix Rodrigues regressa às inverdades, quando refere uma definição de período cronológico que ele designa entre 1415 e 1543, numa eventual citação das primeiras linhas da página da Wikipédia sobre o assunto. O período das descobertas que envolve o nosso arquipélago vai muito para além das datações entre a chegada a Ceuta e o desembarque no Japão, tanto quanto parece ser do senso comum, pois pelos Açores passaram mais do que navios portugueses, apenas, e muito mais havia a “descobrir” no Novo Mundo. Aliás, os verdadeiros especialistas apresentam, ainda hoje, frequentes dúvidas no consenso de datações para as épocas moderna e contemporânea da história, mas o professor parece já saber todas as datas, e raramente se enganar.
Ainda sobre o verdadeiro valor da embarcação descoberta, ele recusa acreditar nos especialistas e nos seus relatórios, talvez porque já saiba tudo sobre tudo. Mas talvez deva então ouvir a subdiretora da Cultura do XIII Governo Regional, que falou à Antena 1, exaltando a grande importância dos tais tesouros descobertos.
Sabemos bem que José Manuel Bolieiro vem demonstrando que para ele, e para a sua ala social-democrata, a Cultura não é mais que Propaganda. Para Artur Lima, querido líder do partido de António Félix Rodrigues, já todas e todos sabem que os arqueólogos e o património são um empecilho. Talvez por isso, coloque o professor palavras na boca do Bloco de Esquerda, quando diz que se quer parar a empreitada no Porto de Pipas.
Não, caro professor. O Bloco de Esquerda NUNCA pediu que se parasse a obra! Convinha, antes de ter redigido o seu artigo, consultado o processo e perceber o que se pretendeu. Queremos é uma resposta e uma estratégia concreta, que demonstre qual o verdadeiro interesse e objetivo deste XIII Governo para a valorização do Património.
Pela parte que me toca, a nível pessoal, e que toca ao Bloco de Esquerda Açores, enquanto unidade representativa de quem o elegeu, continuaremos a questionar o Governo e a procurar soluções para a salvaguarda e a promoção do nosso património insular, tendo por base ciência, método e investigação adequadamente validada pelas nossas autoridades máximas, regionais e nacionais.
Finalizando, pela forma como desconsidera o valor do parque subaquático de Angra do Heroísmo, leva a crer que o caríssimo professor seja da ala que defende que o progresso se faz através do betão, arrasando tudo o que à volta está e que o estatuto da UNESCO é um empecilho às coisas grandes e modernas.