Preconceito à solta na escola

porMiguel Reis

26 de maio 2010 - 11:57
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Num dia uma professora foi impedida de continuar a leccionar por ter posado nua para a revista Playboy. Noutro dia ficámos a saber que um professor chamou “preto” a um aluno, e por isso terá que pagar uma multa de mil euros.

 A primeira foi afastada das crianças sem ter cometido nenhum ilícito ou falha profissional, o segundo foi efectivamente condenado mas continua a exercer a sua influência junto dos alunos. Em ambos os casos há quem queira fazer da escola o contrário do que ela deve ser.

Bruna Real, a jovem professora precária de música nas Actividades de Enriquecimento Curricular – foi afastada da escola e transferida para outras funções. A vereadora da Educação da Câmara Municipal de Mirandela justificou a decisão como o "alarme social” supostamente gerado pela sua conduta.

Do ponto de vista daquela edilidade, a nudez da professora – exibida dentro da lei e no espaço próprio –é uma influência negativa junto das crianças. Mas o que de facto fica a nu é o obscurantismo que paira sobre a escola. Para esta visão retrógrada o que parece assustar não é tanto o corpo, o erótico, o prazer ou o sexo, mas sim o facto de esse universo fazer parte de uma professora, ainda que o seja nas horas vagas. A moral conservadora quer-se reproduzir e se os professores estão numa posição chave, até a sua vida privada é sagrada.

Talvez este seja o mesmo tipo de preconceito que leva à rejeição de uma disciplina de educação sexual, fundamental para combater o atraso num país com a segunda maior taxa de gravidez na adolescência da Europa. Como se a missão da escola e dos professores fosse a de conspirar num tabu em vez de fomentar a responsabilidade numa sociedade livre.

Outro caso é o do professor que se dirigiu a um aluno com a expressão “entra lá ó preto!”. Indesculpável. Não há relativização que resista quando o racismo é naturalizado pela autoridade de um/a professor/a. Foi condenado judicialmente a uma multa de mil euros, mas ninguém se parece importar com o facto de poder continuar a espalhar a sua anti-pedagogia junto dos alunos. Neste caso, não houve “alarme social”.

São duas histórias que incomodam porque insinuam uma escola ao contrário. A do silêncio e do preconceito – a escola que não nos ensina a pensar.

Só que a escola serve para aprender a pensar. Para criar conhecimento, cidadania, consciência, democracia e direitos humanos. Decifrar por detrás das aparências, combater a ignorância, desfazer o preconceito e questionar os dogmas. Até mesmo para aprofundar o espírito crítico e desconstruir as receitas fáceis da publicidade ou da tradição. Infelizmente, dentro e fora da escola, ainda há quem prefira o facilitismo.

Miguel Reis
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Miguel Reis

Professor.
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