Precarização do trabalho imigrante, forma de controle do capital

porGuilherme Nogueira

04 de dezembro 2024 - 16:12
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O que falta são políticas reais que garantam direitos plenos aos imigrantes. A verdadeira integração não é apenas uma questão de cidadania formal, mas de uma cidadania económica e social que permita a todos viver com dignidade, sem medo de serem descartados pelo mercado.

O capitalismo, enquanto sistema económico e político, se sustenta principalmente pela exploração das forças de trabalho. E, ao longo das últimas décadas, um fenómeno que se consolidou de maneira avassaladora é a precarização do trabalho, que atinge, de forma mais violenta, as camadas mais vulneráveis da sociedade, com destaque para os imigrantes. A precarização do trabalho imigrante não é um mero acaso; é uma estratégia calculada do capital, um meio eficaz de controlar a classe trabalhadora, sem que ela perceba a profundidade da exploração a que está sendo submetida.

Em Portugal, a realidade dos imigrantes no mercado de trabalho é um reflexo das dinâmicas de um sistema que passou a utilizar a dificuldade de regularização do imigrante, como a extinção da Manifestação de Interesse, para a precarização. Sendo assim, os imigrantes se tornam as vítimas ideais para um jogo sujo do capital. Se, por um lado, esses trabalhadores são essencialmente necessários para o funcionamento da economia, por outro, são também o alvo de políticas que os mantêm à margem, desprovidos de direitos e com empregos cada vez mais precários.

É fundamental entender que a precarização do trabalho imigrante não é apenas uma consequência do mercado de trabalho desregulado; ela é uma prática intencional. As leis e regulamentos que regem a imigração em Portugal, por exemplo, hoje mantêm os imigrantes em uma posição de subordinação. Restrição de direitos laborais, contratos temporários, salários baixos, falta de acesso a serviços de saúde adequados e a negação da possibilidade de um vínculo estável com o emprego são alguns dos mecanismos que, ao longo do tempo, foram sendo naturalizados e invisibilizados pela sociedade.

A precarização do trabalho imigrante serve aos interesses do capital de uma forma multifacetada. Primeiramente, ela garante uma força de trabalho barata e facilmente substituível. As empresas, por falta de fiscalização, contratam trabalhadores imigrantes sob condições de extrema vulnerabilidade, sabendo que sua situação jurídica e social muitas vezes os impede de lutar por melhores condições de trabalho ou de exigir direitos básicos. A mobilidade laboral limitada, as dificuldades para a obtenção de uma autorização de residência ou de contratos fixos, a violência estrutural que separa famílias imigrantes e a constante ameaça de expulsão criam uma insegurança que é explorada ao máximo pelos empregadores. Essa é uma forma clara de controle: se o trabalhador imigrante não pode se organizar livremente, ele está preso a um ciclo de subordinação permanente.

Além disso, a precarização do trabalho imigrante permite uma constante pressão sobre o resto da classe trabalhadora. A competitividade forçada, em que a mão-de-obra imigrante é vista como mais barata, mas igualmente mais vulnerável, empurra os salários para baixo e desvaloriza os direitos dos trabalhadores como um todo. A tática é simples: fragmentar as lutas sociais, dividir as classes, enfraquecer a resistência. A precarização é, portanto, uma arma estratégica no controle do capital sobre a classe trabalhadora, onde todos perdem, mas a burguesia lucra.

A narrativa oficial que tenta vender a ideia de que os imigrantes "estão roubando empregos dos portugueses" é um dos maiores engodos do sistema. Ela desvia o olhar das reais causas da precarização, que são as políticas neoliberais que privilegiam o lucro a qualquer custo, sem se importar com as condições de vida de quem sustenta o sistema produtivo. A luta dos imigrantes por melhores condições de vida e trabalho não é uma luta isolada; ela é, na verdade, uma luta por toda a classe trabalhadora. Quando o capital precariza o trabalho imigrante, ele também precariza o trabalho, ao transformar a classe trabalhadora como um todo em mão de obra descartável.

O governo português, ao invés de enfrentar as causas estruturais dessa precarização, opta frequentemente por políticas de integração superficiais e discursos vazios sobre diversidade. O que falta são políticas reais que garantam direitos plenos aos imigrantes, que garantam que a mão de obra imigrante não seja tratada como um recurso descartável e substituível. A verdadeira integração não é apenas uma questão de cidadania formal, mas de uma cidadania económica e social que permita a todos viver com dignidade, sem medo de serem descartados pelo mercado.

Guilherme Nogueira
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Guilherme Nogueira

Advogado
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