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As pessoas contam. Poderia ser de outra maneira?!

É bom verificar que na proposta de OE 2018 as pessoas passaram para a linha da frente.

Com o conhecimento público da proposta de OE 2018, quero registar algumas reflexões. Entre todas a mais importante, é bom verificar que na proposta de OE 2018 as pessoas passaram para a linha da frente. É positivo, revela um pensamento e atitude diferentes, alimenta a esperança. Comentadores há que elogiam as propostas de devolução de rendimentos mas... não há mesmo bela sem senão. Dizem eles que o investimento público é que fica em níveis muito muito modestos e torcem (literalmente) o nariz. E alongam-se em análises e comentários sobre o que devia ser feito em matéria de investimento. Mas nunca reconhecem a contradição da sua própria análise, nem equacionam o desastre que seria deixar mais uma vez penduradas as pessoas, intranquilas e angustiadas. Eles próprios, quiçá. Durante anos, os aposentados, os pensionistas e os funcionários públicos foram o alvo preferido dos seus ataques e ainda não interiorizaram que todos são pessoas com direitos, que trabalham ou trabalharam para merecer uma retribuição. Quando esses comentadores e políticos chegarem à idade da reforma, o que sentirão ao serem considerados a mais, um peso morto?! Vêm aí umas quantas medidas que devolvem rendimento aos aposentados e pensionistas. Uma palavra apenas sintetiza o novo quadro orçamental: dignidade. Todos têm direito a ser tratados com dignidade mas poderem os aposentados e pensionistas sentirem que não são descartáveis, constitui um enorme passo em frente. Reafirmar a cidadania, por inteiro.

Uma parte da presente devolução de rendimentos, no caso o IRS, foi calculada com base no valor mínimo de sobrevivência o que me leva à segunda reflexão. São vários os padrões que servem para estabelecer os modelos e cálculos relativos aos rendimentos. O IAS, o valor do SMN e também o valor mínimo de sobrevivência (se calhar outros que desconheço mas que não alteram o meu ponto de vista). Consoante o rendimento em análise, o padrão a que se recorre, muda. Será mesmo necessário que isto seja assim? Existe alguma razão lógica? Ou é assim porque sim? A manutenção deste sistema confunde sobretudo os beneficiários, torna-se numa fórmula cabalística dominada pelos técnicos, sofre intrinsecamente de pouca transparência. Para um perfeito entendimento entre quem distribui os rendimentos e quem os recebe, talvez pudesse ser de forma diferente. Sabemos hoje, mais do que nunca, como a transparência fortalece a democracia.

Finalmente, a questão das reformas com valor inferior ao SMN (e já agora ao valor mínimo de sobrevivência como ele é considerado para efeitos de cálculo do IRS). A sociedade portuguesa tem aqui um enorme problema. Não me parece que possamos ignorar a situação ou continuadamente dizer que ela é de difícil solução. Se é, então, mais atenção é requerida. Não estou a insinuar um RBI; a minha premissa é muito esquemática: dispor de uma rendimento mensal inferior ao SMN não é aceitável e devia incomodar-nos profundamente. Nada é insolúvel, o caso pode ser de resolução muito complexa mas os seniores que se encontram naquela situação merecem um esforço maior. Um projeto a concitar a nossa atenção e empenho para que viesse a ser concretizado antes do fim da presente legislatura. Técnicos, economistas, beneficiários convocados para a resolução de uma situação lamentável. Com um bom calendário para cumprir tamanha tarefa. Aí sim, estaremos todos e todas em condições de olhar uns para os outros com dignidade.

Sobre o/a autor(a)

Bibliotecária aposentada. Activista do Bloco de Esquerda. Escreve com a grafia anterior ao acordo ortográfico de 1990
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