Está aqui

Pablo, Paulo, Matteo

No ano passado, foram 3115 os migrantes que morreram naquele mar feito cemitério. É uma condenação à morte feita pela política de fronteiras fechadas a quem foge da miséria e da Guerra.

Pablo, o distribuidor de pizzas

Pablo Villavicencio foi para os Estados Unidos há oito anos e ali teve duas filhas, agora com dois e três anos. Apesar de ter acionado os procedimentos para ter uma autorização de residência, nunca conseguiu obtê-la. O seu emprego precário de distribuidor de pizzas e o facto de ter mulher e filhos nos EUA não foram, pelos vistos, critério suficiente para reconhecer o facto simples de que era naquele país que fazia a sua vida. Em Brooklyn há uma base militar onde os militares gostam de comer pizza. Até aqui, nada a assinalar. No início deste mês, Pablo Villaviciencio foi distribuir as pizzas aos militares dessa base no extremo sul de Brooklyn. Mostrou a sua carteira com o documento de identidade que a cidade de Nova Iorque atribui a todos os moradores, independentemente do seu estatuto migratório. Mas na base, onde já tinha entregado outras pizzas, resolveram retê-lo e vasculhar a sua história. Os mesmos a quem Villaviciencio serviu para lhes levar as pizzas, decidiram ali mesmo que ele devia ser deportado. Objeto já usado, as pizzas comidas, Pablo era lixo.

À porta da base concentraram-se no dia 6 alguns ativistas, o vereador daquela circunscrição, a esposa de Pablo, as filhas e algumas bonecas que as crianças levaram para engrossar o protesto. “Em que é que expulsarem Pablo vai tornar o país mais seguro?”, perguntavam.

Em nome de Paulo, o apóstolo

“Citaria o Apóstolo Paulo e a sua ordem clara e sábia, em Romanos:13, que diz que obedeçam às leis do Governo porque Deus as ordenou com o propósito da ordem”. Foi assim que Jeff Sessions, procurador-geral dos Estados Unidos, justificou a ordem para que centenas de crianças fossem separadas dos pais por serem imigrantes. Ainda acrescentou: “Os processos legais e ordeiros são bons por si próprios e protegem os fracos”. Desde outubro, mais de 700 crianças foram separadas dos pais na fronteira. Nos Estados Unidos, um imigrante sem documentos é tratado como um criminoso. Na cadeia para onde os enviam, não podem estar as crianças.

É imoral, disse DiNardo, um cardeal católico. “Obedecer às leis do Governo”, disse a porta-voz da Casa Branca, é “muito bíblico”.

Matteo, o fascista

“Acabou o recreio, façam as malas e partam”. Foram estas as palavras que o Ministro do Interior de Itália decidiu dirigir aos imigrantes do país. Uns dias depois, confirmou a sua natureza quando tomou a decisão de não autorizar o desembarque de um navio humanitário com 629 pessoas resgatadas no Mediterrâneo. No Aquarius, o navio onde seguiam estes refugiados – mais os 30 tripulantes – estão homens e mulheres, sete das quais grávidas, e mais de uma centena de crianças. Matteo está-se pura e simplesmente a borrifar se eles morrem ou não.

No ano passado, foram 3115 os migrantes que morreram naquele mar feito cemitério. É uma condenação à morte feita pela política de fronteiras fechadas a quem foge da miséria e da Guerra. Quem a alimentou? Quem lhe criou o terreno social, económico e político favorável?

Matteo, o fascista, está no Governo com o tecnocrata Conte, e porque o quis o partido 5 estrelas, celebrado por alguns como uma novidade que traria uma certa “frescura” à política italiana.

Aí a têm.

Artigo publicado em expresso.sapo.pt a 15 de junho de 2018

Sobre o/a autor(a)

Dirigente do Bloco de Esquerda, sociólogo.
(...)