Os augúrios de Marcelo Rebelo de Sousa para o governo de 2009

porFrancisco Louçã

09 de agosto 2007 - 0:00
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O professor Marcelo Rebelo de Sousa é uma das únicas pessoas neste país que é ao mesmo tempo uma instituição. Acarinhamos os seus gestos, a sua intriga, a sua maledicência, as suas insinuações, como os seus raciocínios e informações. Habituámo-nos a ele, é tudo.

Por isso, os seus leitores e leitoras sabem bem que o desejo se confunde muitas vezes com a realidade, e que a manobra contamina a política. Um exemplo recente é a nota de Rebelo de Sousa acerca do acordo entre José Sá Fernandes e António Costa na Câmara de Lisboa. Escreve Rebelo de Sousa, no Sol, que ou Sá Fernandes vai infernizar a vida ao presidente da Câmara, ou tudo isto é um ensaio para um futuro governo Sócrates-Louçã em 2009.

Vamos por partes. Na campanha eleitoral, Sá Fernandes tinha claramente indicado o que considerava ser o programa de urgência para a cidade. Foi eleito por esse programa. Eleito, discutiu as condições da sua aplicação e definiu um acordo com o PS que consagrava total ou parcialmente cada uma dessas condições. Exigiu e assegurou inteira liberdade de voto. Por isso, Marcelo Rebelo de Sousa tem possivelmente razão na primeira parte do seu augúrio: Sá Fernandes, coerente com o seu programa, dirá sempre o que pensa e votará sempre de acordo com o seu compromisso com os eleitores e eleitoras. Não pode nem deve fazer de outro modo. A luta política para a a mudança na Câmara de Lisboa só agora começou.

A segunda parte do augúrio, no entanto, é mais perversa. Pergunta-se Marcelo, então, se vai haver um governo PS-BE com as eleições de 2009. Tem todo o direito de fazer essa pergunta. É uma pergunta que muitos fazem mas, para ser justo, também é preciso dizer que é a mesma pergunta que os mesmos já faziam em 2005, nas últimas eleições.

E a resposta é a mesma. Não. Não vai haver um governo PS-BE, pela simples razão de que o Bloco é coerente com a sua política. Como argumentava Ana Drago em declarações ao Diário de Notícias, a razão dessa impossibilidade chama-se coerência. E acontece que a coerência do PS é contrária à coerência do Bloco. E o Bloco não negoceia coerência.

Não há, num governo, acordos para políticas específicas, como na Câmara de Lisboa. Há tudo ou nada. Não há, num governo, liberdade de voto como na Câmara de Lisboa, há disciplina de governo. E, o que é o mais importante, num governo há uma só política, uma só liderança. A política do governo PS é e será a condução da ofensiva liberal. A política do Bloco é a defesa dos serviços públicos e o desenvolvimento da democracia e justiça social. O programa do PS é o favorecimento das elites nacionais. O do Bloco é o combate a essas elites em nome de um projecto socialista. O PS quer a vitória dos Berardos e dos Teixeira Pinto. O Bloco quer a sua derrota.

Nas eleições de 2009, em coerência com a sua política de sempre, o Bloco apresentará a sua lista e os seus deputados serão oposição a todas as políticas liberais e socialmente injustas.

Fui eleito deputado por três vezes pelo Bloco de Esquerda. Tenho muito orgulho nisso e no trabalho de oposição e proposta que o Bloco tem feito. Estou certo que o professor Marcelo Rebelo de Sousa  já se deu conta dessa coerência. Conte com ela.

Francisco Louçã
Sobre o/a autor(a)

Francisco Louçã

Professor universitário. Ativista do Bloco de Esquerda.
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