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OE 2013 é um iceberg a afundar o país

Nem este debate está encerrado, nem este é o Orçamento do Estado para 2013. Este seria o momento para o PR atuar e vetar este OE, porque este orçamento é incompetente e inconstitucional. Mas não ficaremos à espera que o faça. A oposição pode pedir a fiscalização da constitucionalidade do Orçamento do Estado. Apelamos a essa convergência.

Está por encontrar um nome para o que hoje estamos a debater aqui. Uma coisa é certa: este não é o encerramento do debate do Orçamento do Estado para 2013. Porque nem este debate está encerrado, nem este é o Orçamento do Estado para 2013.

O debate não está encerrado porque não há ninguém que defenda este Orçamento. Nem mesmo a maioria, que tenta assobiar para o lado entre eventuais declarações de voto do PSD e anunciados amuos e desamuos do CDS. E porque um orçamento em que se multiplicam as vozes, das mais avisadas e informadas, sobre a sua impraticabilidade e inconstitucionalidade, não é um debate encerrado. Longe disso.

Não é também o Orçamento do Estado para 2013. Porque é o próprio governo que diz que o Orçamento que fez não vale. Ainda a proposta estava em debate na generalidade, e já o Governo lançava a necessidade da “refundação” e avisava assim que este seria, quando muito, um orçamento para dois meses. Nunca para um ano inteiro.

Pode bem o senhor Primeiro Ministro ir repetindo que não lhe interessa a popularidade do seu governo. Pois esta não é uma questão de popularidade. É uma questão de rumo. Se alguém tinha dúvidas sobre que aspeto terá uma crise política num governo maioritário: aqui está ela. Olhem para a bancada do governo e vejam a imagem de quem não faz a mínima ideia do que fazer. Esta é a imagem da crise. Crise económica, crise social, crise política.

Que Portugal beneficie de juros mais baixos não porque o Governo tudo fez para proteger os portugueses, mas porque já todos reconhecem que este programa de empobrecimento não só não diminuiu a dívida como a tem aumentado e muito, é esclarecedor sobre o falhanço rotundo deste governo.

Não são os mais ricos que lhe dizem que não aguentam mais austeridade. Esses estão bem. Não é, como o Sr quis fazer crer no Congresso do PSD Madeira, quem vive acima das possibilidades que o assobia. Embora sobre as possibilidades do PSD Madeira e sobre quem vivem, o primeiro-ministro saiba bem mais do que nós. Quem lhe diz que não aguenta mais é todo o país.

O país que percebe que depois de tudo o que sofreu em 2013 tudo ficou pior. Em corte de subsídios para funcionários públicos e pensionistas, assim como aumento de impostos e de todo o tipo de taxas e tarifas, o Governo aplicou 9000 milhões de euros em medidas de austeridade em 2012.

9000 milhões para reduzir o défice e equilibrar as contas públicas, dizia o Governo há um ano. O resultado? De acordo com os dados da execução orçamental, podemos estar 9000 milhões de euros mais pobres, mas o défice real vai ficar exatamente na mesma.

Salários e pensões cortados, taxas proibitivas na saúde, gás, luz e transportes a preços de luxo, desemprego como nunca se viu e o défice real nos mesmos 7,2% do ano passado. Não é um desvio, mesmo dos colossais. É o falhanço total da estratégia do Governo. E depois deste falhanço, espera-se que um governo, com o mínimo de seriedade, retire consequências sobre a sua capacidade e manutenção no poder.

Mas este Governo, tão distante dos mínimos da responsabilidade que a democracia exige, faz uma fuga para a frente e apresenta um Orçamento que em tudo repete e aprofunda os erros do anterior: da inconstitucionalidade à impraticabilidade, da estupidez desastrosa para as contas públicas à violência contra a população. Um orçamento que força um ajustamento de mais de 4 pontos percentuais para atingir o objetivo de ajustar as contas em pouco mais de um ponto. Último gesto desesperado de quem se agarra à fé na austeridade redentora, fanatismo ideológico que faz de todo o país cobaia de laboratório.

Olhamos para os deputados e deputadas da maioria e perguntamo-nos se daí virá alguma responsabilidade. Bem, mostraram-se incapazes. O debate que aqui tivemos nos últimos cinco dias, nos quais foram aprovados 248 artigos, só por caridade se pode chamar debate. Foi uma encenação. Um aumento de impostos de 3,5 pontos é um aumento de impostos. Não é nenhum alívio de 0,5 pontos. São mais 3,5 pontos percentuais. Pagar o salário a quem trabalha não é devolver nada a ninguém. É pagar o que é devido. Retirá-lo logo depois com impostos é um esbulho, para usar uma palavra cara ao CDS. Não são as palavras da oposição que são fortes. São a descrição exata do que estão a fazer. Se não gostam, estejam certos que são, nada mais, nada menos, as vossas decisões o que vos incomoda.

Podem repetir mil vezes que descongelam pensões mínimas. Mas a realidade aí está: com o vosso voto congelam pensões de 275 e 300 euros. Negam pensões de alimentos a crianças de famílias que vivem com 400 e poucos euros. Aumentam 40% o IRS de quem ganha 850 euros. Decidem o maior despedimento de que há memória em Portugal, com os milhares de contratados da Função Pública que vão para a rua. Não há pantomina de minimização que esconda a vossa violência.

 

A alternativa existe. Apresentámos e defendemos, ao longo destes dias, mais de 190 propostas de alteração. Propostas que apresentam uma nova visão para a consolidação orçamental, que defendem a tributação do capital e a renegociação dos juros, protegendo as pensões e os salários que têm sido - até agora - os únicos sacrificados pela austeridade.

Fizemos as contas e tornámo-las públicas. São medidas fiscalmente neutras, que equilibram as contas públicas sem o impacto recessivo originado pelo “saque fiscal” aos rendimentos do trabalho de milhões de portugueses.

Com estas propostas, o Bloco pretende garantir espaço orçamental para o investimento e a criação de emprego, diminuindo os encargos aonde não existe o risco de recessão: nos juros da dívida.

Na vossa cegueira rejeitam todas as alternativas e insistem na mesma receita. O Governo faz o que sempre tem feito: chuta para a frente. A famosa discussão da refundação do Estado não nasce de nenhum propósito de modernização das funções do Estado, mas sim para tapar o buraco orçamental deixado pelo fanatismo ideológico de uma estratégia suicidária.

Cortar 4000 milhões de euros na educação, saúde e pensões dos cidadãos, apenas num “primeiro momento” como ameaça o ministro Vítor Gaspar, equivale a diminuir, de um dia para o outro, metade do SNS ou dois terços da rede pública de educação.

Isto não é refundar nada, é destruir os pilares do estado social que retirou o país do analfabetismo, ou dos níveis de mortalidade infantil ou esperança de vida do terceiro mundo, que eram os que o país tinha no 25 de Abril.

Atacar as funções sociais do Estado é deixar grande parte da população sem acesso à saúde e à educação. E é reduzir os salários de todos os outros, que passarão a pagar duplamente. Nos impostos e na escola, nos impostos no hospital, nos impostos e no seguro privado. A este governo não chega passar para capitais estrangeiros todos os setores estratégicos da economia – REN, águas, CTT, ANA -não. Quer também entregar ao capital as rendas garantidas das funções sociais.

E vai criar ainda mais desemprego. Este Orçamento do Estado é um iceberg a afundar o país; boa parte está ainda oculto. Quantos despedimentos na Função Pública quer este governo fazer em 2013? 50 mil, 100 mil, mais? Quantos funcionárias e funcionários públicos serão despedidos em 2013? Este é o número que passou por todo o debate e que o Governo se negou a revelar. O maior despedimento de sempre em Portugal.

 

À hora em que estamos a votar este Orçamento ainda falta conhecer muito sobre as novas condições para o pagamento da dívida grega, que o presidente do Eurogrupo, já garantiu serem extensíveis a Portugal. Mas o que se sabe contraria dois pontos centrais do que tem sido o discurso do Governo. Em primeiro lugar, o Eurogrupo acaba por associar Portugal à Grécia, o que diz bem do sucesso da estratégia do bom aluno e do crescimento galopante do endividamento público desde que PSD e CDS chegaram ao Governo. Em segundo lugar, e estando longe de ser a solução ideal, parece que afinal sempre é possível renegociar os juros em condições mais favoráveis.

Comecei por dizer que este debate não é encerramento do debate do Orçamento do Estado. Repito-o. Este seria o momento para o Presidente da República atuar e vetar este OE. Porque este orçamento é incompetente e inconstitucional. Mas não ficaremos à espera que o faça. A oposição pode pedir a fiscalização da constitucionalidade do Orçamento do Estado. Apelamos a essa convergência. O Bloco de Esquerda não desiste do combate a este orçamento e ao ataque às funções sociais. Não estamos sozinhos. Lá fora há um país que vos condena. Será a força desse país que nos livrará da pobreza deste governo e desta maioria. Não, senhor primeiro-ministro, o país não aguenta mais.

Intervenção de encerramento do debate do Orçamento de Estado 2013, 27 de novembro de 2012

Sobre o/a autor(a)

Dirigente do Bloco de Esquerda. Atriz.
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