Nuno Grande

porBruno Maia

09 de outubro 2012 - 14:39
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Desde o primeiro dia em que chegamos a Biomédicas até ao resto das nossas vidas, Nuno Grande era a garantia de que todas e todos procuraríamos nas nossas vidas a essência da máxima de Abel Salazar que o próprio ajudou a eternizar: “O médico que só sabe medicina nem medicina sabe”!

Para quem passou 6 dos mais importantes anos da sua curta vida no velho edifício das “Biomédicas”, Nuno Grande não é um ídolo, não é um ícone e não é mito! Nuno Grande é o nome que ecoa nas paredes e nos recantos do edifício e das almas que por ele passaram – quer dizer conhecimento, quer dizer dedicação, quer dizer democracia, quer dizer diversidade do saber, quer dizer partilha e solidariedade no trabalho, na ciência, nas instituições e na sociedade em geral.

Estive na última aula do Professor Nuno Grande antes da sua jubilação – foi-nos falar do nervo facial e de como, sentado no seu sofá, se auto-diagnosticou com um tumor que comprimia aquele nervo e sozinho, sem contar à família, foi ao Hospital de Santo António para ser operado de imediato. Era assim, um Homem que conta uma história simples, que olha a vida com senso, procurando ao máximo a verdade nas coisas, ou melhor, procurando a melhor das verdades pois ele sabia perfeitamente que não há só uma. E mesmo com todo o senso do mundo e o mais racional dos discursos, adivinhava-se facilmente que os olhos brilhavam de entusiasmo tanto quando falava de um nervo craniano como quando falava do perigo da ameaça nuclear.

Quando fizemos uma lista para a associação de estudantes e enchemos o átrio do edifício de vermelho, lá passou ele com um discreto sorriso nos lábios, do eterno sabedor que pensa: estão a descobrir a democracia… e as suas dificuldades…!

Em 2007 fui falar com ele em sua casa. Fui-lhe pedir para fazer parte do movimento “Médicos pela Escolha” que ajudou o “sim” a vencer o referendo pela despenalização do aborto. Claro que não pensou nem uma, nem duas, nem três vezes. Sabia perfeitamente que o que estava em causa não eram valores de moralidade pessoal ou religiosa mas sim valores de Estado, de Democracia, da universalidade das nossas instituições, de cidadania plena e de igualdade.

Desde o primeiro dia em que chegamos a Biomédicas até ao resto das nossas vidas, Nuno Grande era a garantia de que todas e todos procuraríamos nas nossas vidas a essência da máxima de Abel Salazar que o próprio ajudou a eternizar: “O médico que só sabe medicina nem medicina sabe”! E por isso teve a ousadia de criar um escola de medicina no Porto, onde se ensinava teoria da relatividade na sala ao lado onde se aprendia e discutiam teorias da personalidade. Onde às 9 horas da manhã aprendíamos com um cirurgião eminente e às 10h com um ecologista famoso. Onde a genética era dos médicos mas também dos matemáticos. Onde se faziam grandes seminários de medicina legal no mesmo dia em que se ouvia falar das esculturas em bronze de Abel Salazar.

E é por tudo isto que Nuno Grande não é um ídolo, não é um ícone e não é mito. Nuno Grande é uma parte importante da filosofia que está presente na vida de tantos de nós que lhe conhecemos a virtude e tivemos a bonança de nos cruzarmos com o seu caminho.

Há ocasiões felizes na vida de cada um de nós. Uma das minhas é o Professor!

Bruno Maia, antigo aluno de Biomédicas

Bruno Maia
Sobre o/a autor(a)

Bruno Maia

Médico neurologista, ativista pela legalização da cannabis e da morte assistida
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