Está aqui

Nómadas digitais - os novos vistos gold

A vontade do Governo da República é a de chamar a todo o vapor estes trabalhadores remotos, algo que o PS, CDS e PSD também querem aqui na região dos Açores.

Já está em vigor o novo visto para “nómadas digitais” que ganham mais de 2800€/mês. A vontade do Governo da República é a de chamar a todo o vapor estes trabalhadores remotos, algo que o PS, CDS e PSD também querem aqui na região.

É curioso que o Governo da República queira atrair nómadas digitais numa altura em que está a estudar o fim dos Vistos Gold. Segundo o primeiro-ministro, o programa dos vistos gold “provavelmente, já cumpriu a função que tinha a cumprir”. Mas o que António Costa não diz é que só gerou 22 postos de trabalho, enquanto serviu para grandes investimentos no imobiliário (10.222 imóveis) e em capital (816), penalizando fortemente os portugueses.

Alguém que tenha responsabilidades políticas deve analisar os prós e contras de uma medida, mas ao que parece PS, PSD e CDS preferem penalizar os açorianos e açorianas ao invés de aprender com os erros dos outros.

Não existirá retorno económico no investimento em nómadas digitais, mas sim um avultado prejuízo que será pago por todos nós.

É curioso que ninguém fale do aumento brutal na despesa fiscal devido ao benefício para residentes não habituais, estatuto onde se inserem os nómadas digitais. Entre 2020 e 2023, a despesa fiscal em sede de IRS deverá aumentar 1.062M de euros e em sede de IRC 166M de euros.

Além disso, é criada uma injustiça em relação aos portugueses que auferem o mesmo rendimento. Imaginem que temos 2 trabalhadores, um trabalhador português e outro nómada digital, que auferem o mesmo rendimento anual bruto de 42.000€, ou seja, um valor superior aos 2800€/mensais. Na altura de fazer o IRS, teremos o trabalhador português a ver ser aplicada uma taxa de 43,50% sobre o seu rendimento coletável, enquanto ao nómada digital será aplicada uma taxa de 20%, ou seja, um benefício imediato de mais de 8.900€.

Quem ganhará neste cenário e quem pagará a fatura da despesa fiscal?

No Porto estão a chegar 3600 nómadas digitais por mês. Se já nos queixamos de turismo massificado, será que realmente queremos este “BOOM” cá? Onde vão morar todos estes nómadas digitais e que impacto terá no mercado de arrendamento e na aquisição de habitação própria e permanente?

Através de uma rápida pesquisa ficamos a perceber que o valor da renda mensal de uma moradia T0/T1 nos Açores neste momento ronda os 500€. Como pode uma pessoa solteira, que queira a sua independência, sair de casa dos pais quando são estes os valores praticados no mercado de arrendamento? Se esta pessoa receber o salário mínimo regional, então isto significa que terá um encargo com a habitação que representa 75,89% do seu rendimento líquido mensal. Assim sendo, ou permanece em casa dos pais, ou arranja alguém com quem possa partilhar casa, ou então terá de viver com pouco mais de 150€ o resto do mês.

É preciso, também, não esquecer o impacto nacional no alojamento estudantil privado, nomeadamente na redução em 80% dos quartos disponíveis para estudantes, devido à conversão da oferta para o turismo e nómadas digitais.

É importante não esquecer que não podemos ter o melhor de dois mundos, neste caso ao criar um paraíso para os nómadas, estaremos a criar um inferno para os locais.

Sobre o/a autor(a)

Enfermeira e presidente da VegAçores-Associação Vegana dos Açores.
Termos relacionados Habitação
(...)